Estátua de Cristovão Colombo vandalizada |
A morte de George
Floyd gerou justificadas comoções. Alguns protestos, porém, derivaram para a
sedição e para a crise de símbolos. Qual o papel da Igreja?
Luís
Fernando Ribeiro (13/06/2020 13:44, Gaudium Press) Após quase três semanas de sua ignominiosa morte, George
Floyd ainda rende manchetes. Depois de tentar comprar cigarros com uma nota
falsa de 20 dólares, foi interceptado e asfixiado pelo joelho de um policial.
Paradoxalmente, Floyd tinha perdido o emprego de guarda de segurança em razão
da pandemia.
Nos Estados Unidos logo se desfraldou a bandeira antirracista. O
movimento Black
Lives Matter (Vidas negras importam)
ressuscitou de repente, organizando protestos pela morte do afro-americano. À
maneira de um tsunami, manifestações de todos matizes pulularam por várias
cidades, sobretudo nos países conhecidos como civilizados.
Nada mais recorrente
do que empunhar cartazes em protesto. Lutero talvez tenha inaugurado o método,
ao fixar as 95 teses numa Igreja em Wittenberg. Nasceu então a revolução
“protestante”. Hoje a protestação “evoluiu” para a luta armada, levando a uma
escalada de violência sem precedentes.
Antes do racismo, existe a acepção de pessoas
Enfim, todos sabem
que o racismo é injustificável porque simplesmente ninguém pode ser julgado por
sua genética. Jesus ensinou a pregar a todos os povos sem distinção (Mc 16,15;
Mt 24,14) e a Bíblia exorta diversas vezes a não ter acepção de pessoas (cf.
2Cr 19,7). Afinal, somos todos filhos degredados dos mesmos pais.
A acepção de pessoas
é de si uma transgressão; um pecado contra a justiça e contra a caridade. Esse
pecado pode chegar, claro, a extremos genocidas, como o ocorrido Alemanha
Nazista, nos gulags comunistas ou em Ruanda em 1994. Se esses
absurdos ferem gravemente as leis divinas e humanas, não menos o silêncio ante
essas atrocidades. O que infelizmente nem sempre é o caso. Mas isso é outro
assunto.
Contradições dos efeitos do caso Floyd
O caso de Floyd foi
um caso individual e local colocado no megafone mundial. O que poderia ser uma
reivindicação legítima, foi conspurcada, entretanto, por inúmeras contradições.
Eis algumas delas de modo sucinto e objetivo:
1) De fato, vidas
negras importam. Contudo, todas as vidas negras importam,
inclusive as dos fetos abortados e dos policiais negros assassinados na esteira
dos mesmos protestos. Será que há uma ideologia sinistra por detrás dessa
acepção de pessoas? Todas as vidas em si mesmas possuem valor,
independentemente da genética.
2) Por que alguns
protestos, supostamente democráticos e pacíficos, se utilizam da barbárie para
alcançar seus objetivos? O fato é que os vândalos terminaram por quebrar o que
vírus não conseguiu. A vida dos trabalhadores (por vezes negros) também
importa. Muitos deles perderam tudo pelas mãos dos visigodos pós-modernos, os
paladinos da suposta “liberdade”.
3)
Ironicamente, o vírus deve ter tido uma mutação, pois agora a voz de comando já
não é mais “fique em casa”, mas “vá para as ruas”… Basta usar máscaras,
recomenda a OMS. As aglomerações para depredar e surripiar patrimônio público e
privado são agora abonadas como uma inocente “reação natural”.
4) A simples transposição do fato americano para outros países em
nada ajuda para combater a discriminação. Antes, lança-se ainda mais fogo no
caldeirão do ódio e do ressentimento.
5) Sem polícia não há polis (cidade). A
etimologia nos recorda que não há ordem civil sem os seus guardiães, ou seja,
não há civilidade nem civilização (do
latim civilis,
pertencente à cidade). Incriminar toda a polícia ou promover a violência contra
ela por um crime individual só pode contribuir para o colapso das instituições
da sociedade, ou seja, a mais pura anarquia.
6)
Demagogias são inúteis. Trudeau, primeiro-ministro do Canadá, se tornou o
penitente mais famoso do abstrato “racismo sistêmico” de seu país. De resto,
pedir perdão hoje de joelhos por injustiças de escravagistas de mais de dois
séculos não tira ninguém do báratro eterno.
7) Condenar estátuas de pretensos “racistas” ou “fascistas” (como
Cristóvão Colombo ou Padre Antônio Vieira) à guilhotina, além de vandalismo,
revela profunda ignorância histórica, além de anacronismo. Este último foi
grande defensor e evangelizador dos povos indígenas e negros. Enquanto isso, os
totens de Marx pelo mundo permanecem intactos. Sobre a neorrevolução
iconoclasta, o jornal Libération – nascido
do bafo rebelde de maio de 1968 – estampou na primeira página deste 11 de
junho: “A
queda dos símbolos”.
A crise dos símbolos: qual o papel da Igreja?
De fato, nesse momento de crise sanitária e financeira, agora
ainda temos de nos preparar para a crise dos símbolos. Por certo ângulo, esse
colapso civilizacional é ainda mais grave que os demais, pois sem símbolos não
se vence qualquer guerra. Em outras palavras, sem modelos, sem heróis, sem
mitos, sem a ajuda sobrenatural, estamos destinados à fragorosa derrota. Até os
pagãos assim entendiam: basta ler a Ilíada de Homero e a batalha entre gregos e
troianos, marco da civilização ocidental.
Do ponto de vista religioso, a Igreja Católica é convocada de modo
particular nesses momentos de tormenta da humanidade. Hoje, a ela é mais uma
vez oferecida a oportunidade de traçar os rumos da História, ao oferecer o que
ela tem de mais precioso, ou seja, os seus próprios símbolos: a liturgia, os
seus heróis (os santos), os sinos, os sacramentos, a arte e a música sacra, os
exemplos bíblicos etc., remetendo tudo para o que é essencial e absoluto: Deus.
Antes, vidas importam precisamente porque o homem é “símbolo” do que há de mais
alto – o Altíssimo –, pois foi criado à sua imagem e semelhança.
Diante das injustiças, a Igreja é chamada, portanto, a dobrar os
joelhos não por gestos demagógicos, mas ressaltando que a vida possui um valor
superior, imaterial, baseado na oração, o símbolo supremo da ligação entre o
homem e Deus. É dessa genuflexão que precisamos.
A Igreja
é precisamente imortal porque é uma instituição-símbolo. Só ela pode unir os
filhos da luz para vencer o diabo (diabolos significa
“aquele que separa”), com o símbolo (symbolos significa
aquele que reúne) da cruz, mesmo que seja escândalo ou loucura para os filhos
das trevas (cf. 1Co 1,23).
A sua missão é antes de tudo indicar o caminho da vida eterna, que
começa pelas ações virtuosas nesta vida terrena. Em suma, quando a vida eterna realmente
importar, a vida terrena terá finalmente o seu devido valor.
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