Dom Vital Corbellini |Bispo de Marabá (PA) |Rádio Excelsior |
Santo Ireneu defendeu o mistério da encarnação diante dos gnósticos docetas que negavam o mistério da unidade de Deus com a humanidade, não consentindo que Ele tivesse redimido a realidade humana. No Livro Demonstração da Pregação Apostólica tem presente a encarnação do Verbo, como presença de Deus em meio à humanidade pecadora na qual a assumiu em sua integridade, menos o pecado, dando-lhe vida nova e redenção.
A importância da unidade do Verbo de Deus com a humanidade
Santo Ireneu foi bem categórico na afirmação da encarnação do Senhor. Ele diz que o Verbo uniu o homem a Deus, porque a parte humana jamais participaria da incorruptibilidade se o Verbo não tivesse vindo habitar entre os seres humanos. Se de fato a incorruptibilidade tivesse permanecido invisível e oculta, não haveria nenhuma utilidade para a nossa vida de pecadores e de pecadoras, no entanto o Verbo se fez visível a fim de que nós entrássemos em comunhão com Ele[1]. Tudo é envolvido nesta parte pela criação originária de Adão, porque a sua desobediência a Deus trouxe a morte, de modo que era conveniente e justo, que pela obediência de quem se fez ser humano por nós, fossem rompidas as cadeias da morte. Desta forma o Verbo se fez carne[2], para destruir por meio da carne, o pecado e a morte. Nosso Senhor tomou uma corporeidade idêntica à da primeira criatura, menos o pecado, para vencer em Adão aquele que em Adão nos feriu pelo pecado e pela morte[3].
Esta visão é muito importante em Ireneu sobre a entrada de Deus na história devido aos gnósticos docetas que afirmavam que o Senhor ficou alheio à realidade humana, permanecendo distante da mesma e sendo mais divino que humano. Se fosse assim não haveria nenhuma utilidade porque a realidade humana não teria ganhado a graça da salvação, o que ao contrário o Senhor concedeu na sua plenitude de vida com a assunção da realidade humana.
O primeiro ser humano e o segundo ser humano
Santo Ireneu tem presente a substância do primeiro homem na qual Deus tomou o barro e o plasmou para que se tornasse gente, soprando nele para viver. O que fez o Senhor Jesus Cristo, na sua entrada para o mundo na qual ele recapitulou em si o ser humano, nascendo de uma virgem por vontade e sabedoria de Deus. Ele reproduziu a identidade da sua corporeidade com aquela de Adão, de modo que refez como foi feito no início, o ser humano, à imagem e semelhança de Deus[4].
Nesta visão da recapitulação ponto importante na doutrina teológica de Ireneu, feita pelo Senhor Jesus Cristo, desde a origem, entrou também a visão de Eva e Maria. Uma vez que uma virgem foi desobediente, também por causa de uma virgem obediente à Palavra de Deus, o ser humano foi ressuscitado e recobriu a vida pela presença do Verbo encarnado. Na verdade o Senhor veio buscar a ovelha perdida, o ser humano que se perdeu[5]. Assim o Verbo de Deus formou um corpo que descendia de Adão, conservando a semelhança daquele corpo, de modo que se Adão foi recapitulado por Cristo, para que a parte mortal se revestisse na imortalidade, o mesmo fato vê-se de Eva em Maria, a virgem tornada advogada de uma virgem, dissolvesse e destruísse com a sua obediência de virgem a desobediência de uma virgem. O pecado que foi assumido pelo ser humano por causa da árvore foi anulado pela obediência cumprida sobre a árvore, na qual o Filho do Homem foi pregado na árvore, abolindo a ciência do mal e doando a toda a humanidade, a ciência do bem. Se é pecado desobedecer a Deus, o bem é ao invés, obedecer a Ele[6]. Desta forma foi pela obediência do Verbo encarnado que assim pode anular a antiga desobediência consumada sobre a árvore[7]. Sendo todas as coisas administradas pelo Verbo de Deus, foi crucificado o Filho de Deus em forma de cruz. Ele se fez visível, manifestando a universalidade de sua cruz, e chamando a todos ao conhecimento do Pai, os seres humanos dispersos pelo mundo[8].
Cristo Jesus cumpriu as profecias feitas por Deus em Abraão, na qual a sua descendência seria como as estrelas do céu[9], nascendo da Virgem. Cumpriram-se também as promessas divinas feitas a Davi que lhe havia prometido fazer surgir um Rei eterno, cujo reino não teria ocaso[10], sendo este, o Cristo, o Filho de Deus tornado filho do Homem, nascido também da Virgem. A promessa ganhou forma de fruto do ventre, que devia ser o Rei eterno na casa de Davi, e cujo reino não tem fim[11].
A salvação realizada
A salvação humana foi realizada por esse Rei que manteve as promessas feitas aos patriarcas e aboliu a antiga desobediência pelo fato de que o Filho de Deus se fez filho de Davi e filho de Abraão. Ele cumpriu as promessas e recapitulou-as em mesmo tendo como única finalidade a restituição da vida assim que o Verbo de Deus se fez carne[12], através da Virgem, para desatar a morte e vivificar o ser humano. Sendo enviado pelo Pai, o Verbo criador veio para nos salvar estando nos mesmos lugares, nos mesmos ambientes onde o ser humano perdeu a vida, rompeu desta forma as cadeias que nos mantinham prisioneiros. Com o aparecimento de sua luz, santificou o nosso nascimento, destruiu a morte e desligou os laços que nos tinham prendido[13]. Pela sua ressurreição, tornou-se ele mesmo o primogênito dos mortos[14] e levantou na sua pessoa o ser humano caído por terra, ao ser elevado às alturas do céu até a direita da glória do Pai[15].
A encarnação do Verbo é a entrada de Deus na humanidade para assumi-la e redimi-la. Santo Irineu colocou este mistério tão bonito e tão significante em vista da salvação de todo o ser humano. Somos chamados a viver o mistério da encarnação do Verbo, fazendo o bem, superando o ódio e espalhando o amor a Deus, ao próximo como a si mesmo.
[1] Cf. Demonstração da Pregação Apostólica. In: Irineu de Lyon. Paulus, SP, 2014, pg. 94.
[2] Cf. Jo 1,14, Idem, pg. 94.
[3] Cf. Ibidem.
[4] Cf. Gn 1,26; Cl 3,10; Idem, pg. 95.
[5] Cf. Mt 15,24; Lc 19,10, Ibidem, pg. 95.
[6] Cf. Ibidem, pg. 95.
[7] Cf. Fl 2,8. Idem, pg. 96.
[8] Cf. Ibidem, pg. 96.
[9] Cf. Gn 15,5. Ibidem, pg. 96.
[10] Cf. 2Sm 7,12-13, Idem, pg 97.
[11] Cf. Lc. 1,32-33, Ibidem, pg. 97.
[12] Cf. Jo 1,14, Ibidem. pg. 98.
[13] Cf. 2Tm 1,10, Idem, pg. 98.
[14] Cf. Ap 1,5; Cl 1,18, Ibidem, pg 98.
[15] Cf. Ibidem, pg. 98.
CNBB
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