Veritatis Splendor |
- Autor: São Tomás de Aquino
- Fonte: Suma Teológica, Parte III, Questão 66
- Tradução: Dercio Antonio Paganini
Objeção 1: Parece que a Igreja mantém um rito não apropriado no Batismo, pois Crisóstomo (Cromácio em Mt 3,13-17: “Então veio Jesus da Galiléia ter com João, junto do Jordão, para ser batizado por ele. Mas João O impedia, dizendo: ‘Eu é que preciso ser batizado por Ti, e Tu vens a mim?’ Jesus, porém, lhe respondeu: ‘Consente agora; porque assim nos convém cumprir toda a justiça’. Então ele consentiu. Batizado que foi Jesus, saiu logo da água; e eis que se Lhe abriram os céus, e viu o Espírito Santo de Deus descendo como uma pomba e vindo sobre Ele; e eis que uma voz dos céus dizia: ‘Este é o Meu Filho amado, em quem Me comprazo'”) diz: “As águas do Batismo não servem para purgar os pecados daqueles que acreditam que nunca foram abençoados pelo contato com o Corpo de nosso Senhor.” Ora, isso apenas tem lugar no Batismo de Cristo, que é comemorado na festa da Epifania. Todavia, o Batismo solene pode ser celebrado tanto na Epifania, como na véspera da Páscoa e Pentecostes.
Réplica à Objeção 1: Cristo foi batizado na Epifania, com o Batismo de João, como ficou determinado acima; com esse batismo [de João], realmente, os fiéis não são batizados, mas sim com o Batismo de Cristo. Esta é a eficácia da Paixão de Cristo de acordo com Rm 6,3-4: (“Ou, porventura, ignorais que todos quantos fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados com ele pelo batismo na morte, para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim andemos nós também em novidade de vida.”) e no Espirito Santo, de acordo com João 3,5 (“Jesus respondeu: Em verdade, em verdade te digo que se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus.”): todavia, é esse Batismo Solene confirmado pela Igreja, na véspera da Páscoa, quando comemoramos o sepultamento e ressurreição de nosso Senhor; por esta razão, nosso Senhor deu a seus discípulos a ordem de conceder o Batismo, como é relatado por Mateus 28,19: (“E, aproximando-se Jesus, falou-lhes, dizendo: ‘Foi-me dada toda a autoridade no céu e na terra. Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo; ensinando-os a observar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”), e na véspera de Pentecostes quando começa a celebração da Festa do Espírito Santo. Por esta razão os apóstolos relataram ter batizado milhares de pessoas no próprio dia de Pentecostes quando todas receberam o Espírito Santo.
Objeção 2: Parece que muitos materiais não deveriam ser utilizados no Batismo, como o é a água. Mas não é apropriado que uma pessoa ao ser batizada necessite ser bastante untada com óleo santo, primeiro no peito, e depois entre os ombros (nas costas), e uma terceira vez no alto da cabeça.
Réplica à Objeção 2: O uso da água no Batismo é uma parte das substâncias do sacramento, mas o uso do óleo é parte da solenidade. Como o candidato é primeiramente untado com o Santo Óleo, no peito e nas costas, como “aquele que luta por Deus” (usando a expressão de Ambrósio em De Sacram I ), pois era costume entre os lutadores vencedores, untarem-se a si mesmos. Ou ainda como diz Inocêncio III, em um decreto sobre a Santa Unção: “O candidato é untado no peito com a finalidade de receber a dádiva do Espírito Santo para expulsar erros, a ignorância e para o reconhecimento da verdadeira fé, pois ‘o homem justo vive pela fé’; quando é untado nas costas o candidato será coberto com a graça do Espírito Santo, deixará de lado a indiferença e a preguiça, e virá ser ativo em bons trabalhos; então o sacramento da fé pode purificar os pensamentos de seu coração e fortalecer seus ombros para a carga do trabalho”. E depois, como diz Rabano (De Sacram III): “Ele é imediatamente untado na cabeça com o óleo santo, pelo padre que assim procede para fazer um pedido para que o neófito possa tomar parte no Reino de Cristo, e possa ser chamado de Cristão depois de Cristo”. Ou, como diz Ambrósio (De Sacram III), sua cabeça é untada porque “os sentidos de um homem racional estão em sua cabeça” (Ecl. 2,14: “Os olhos do sábio estão na sua cabeça, mas o louco anda em trevas; contudo percebi que a mesma coisa lhes sucede a ambos.”) Para ser astuto, pois, ele deve “estar pronto para satisfazer qualquer um que perguntar” a ele para dar “uma razão por sua fé” (cf. 1Pd 3,15: “antes santificai em vossos corações a Cristo como Senhor; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a todo aquele que vos pedir a razão da esperança que há em vós.”) e Inocêncio III, Decreto da Santa Unção).
Objeção 3: Enquanto, “em Jesus Cristo não existe macho ou fêmea” (Gal. 3,23: “Mas, antes que viesse a fé, estávamos guardados debaixo da lei, encerrados para aquela fé que se havia de revelar.”) nem Bárbaros nem Citas” (Col. 3,10-12: “e vos vestistes do novo, que se renova para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou; onde não há grego nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo ou livre, mas Cristo é tudo em todos. Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de coração compassivo, de benignidade, humildade, mansidão, longanimidade”), nem de qualquer forma alguém com distinções, muito menos pode uma diferença de roupas ter qualquer eficácia na Fé de Cristo. Então, é consequentemente um desajustamento o uso de uma roupa branca por aqueles que serão batizados.
Réplica à Objeção 3: Esta veste branca é utilizada não apenas porque seria ilegítimo, para o neófito, o uso de outras, mas como um sinal da gloriosa ressurreição, pela qual as pessoas renascem pelo Batismo, e para determinar a pureza da vida, para a qual a pessoa saltará depois de ser batizada de acordo com Rm 6,4: “Fomos, pois, sepultados com ele pelo batismo na morte, para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim andemos nós também em novidade de vida”.
Objeção 4: O Batismo pode ser celebrado sem todas aquelas cerimônias, e então parece que tudo o que foi acima mencionado é supérfluo, e consequentemente foi, de modo não salutar, inserido pela Igreja no rito batismal.
Réplica à Objeção 4: Apesar de todas essas coisas que pertencem à solenidade de um sacramento e que não são essenciais a ele, não são supérfluas pois elas pertencem ao benefício do sacramento, como estabelecido acima.
Pelo contrário: a Igreja é regulamentada pelo Espírito Santo, o qual nada faz desordenadamente.
Eu respondo que: no Sacramento do Batismo, algo é feito que é essencial ao Sacramento, e algo é feito que pertence a uma certa solenidade do Sacramento. Realmente essencial ao Sacramento é tanto a forma que designa a principal causa do Sacramento, como também o ministro, que é causa instrumental, e o uso da matéria, chamada lavagem com água, que designa o principal efeito do Sacramento; mas todas as outras coisas que são observadas pela Igreja no rito batismal, pertencem a uma certa solenidade do sacramento, e estas, realmente, são utilizadas em conjunção com o Sacramento por três razões:
Primeira: para estimular a devoção dos fiéis assim como sua reverência ao Sacramento. Se nada mais fosse feito que um simples banho com água sem nenhuma solenidade, muitos iriam facilmente pensar que o Batismo seria apenas um banho comum.
Segunda: para uma maior instrução de fé, porque o povo simples e iletrado precisa ser tocado por sinais sensíveis, por exemplo, imagens, figuras etc. E neste caminho, por meio da cerimônia sacramental, essas pessoas são instruídas ou impelidas a procurar o significado daqueles sinais sensíveis, e, consequentemente, além do efeito principal do Sacramento, outras coisas precisam ser conhecidas sobre o Batismo, e essas coisas são representadas por sinais externos.
Terceira: porque o poder do demônio é restringido pelas preces, bênçãos, e impedido pelo efeito sacramental.
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