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Seu desejo de perfeição envenena sua vida e a daqueles ao seu redor? Aqui estão algumas dicas “quase perfeitas” para moderar-se em suas exigências.
O ano era 1945. Intimidada, Anne desce a grande escadaria da casa da família. Aos 5 anos, ela via seu pai pela primeira vez. Lá estava ele, consideravelmente mais magro. Acabara de voltar do cativeiro na Alemanha. Olhou para ela e disse: “Volte e coloque a bota corretamente, um dos botões não está encaixado”. Contado por sua neta, este exemplo extremo de perfeccionismo deve ser considerado em um contexto onde o hábito não era de grandes efusões de alegria.
No entanto, ele ilustra algumas facetas do perfeccionismo: ideal elevado, atenção aos detalhes, dificuldade em amar e permitir-se ser amado. Já muito jovens, “algumas crianças ansiosas não conseguem terminar uma tarefa, porque pensam que não está bom o suficiente”, nota Brigitte de Baudus, mãe e formadora do Ipef (Instituto para a Educação da Família). Essa tendência costuma ser explicada pela necessidade das pessoas em se perceberem amadas, por um desejo inconsciente de reconhecimento ou por um desejo de corresponder a um modelo social.
E querer fazer tudo bem, quem reclamaria? Mas o perfeccionista nunca está satisfeito enquanto seus objetivos não forem alcançados, se impondo um nível extenuante de trabalho. Como nos exemplos de uma mãe, que se irrita porque seus filhos não atingiram uma média 9 na escola, ou de um pai que se esgota arrumando a casa depois do trabalho. Para Yves Boulvin, psicólogo, formador em relações humanas e consultor: “Desejar melhorar, mudar, chegar ao melhor de si é bom, mas acreditar que se pode ser perfeito cria tensão, estresse. Só Deus é perfeito”. Aí reside a armadilha: escolher a perfeição como programa de vida.
Quando o perfeccionismo atrapalha nosso relacionamento com Deus
Em um programa televisivo sobre temperança, a filósofa Chantal Delsol explicou: “Tudo tem um limite, mesmo as melhores coisas. Imaginamos que a perfeição pertence a este mundo e que levando uma virtude ao seu limite, a possuiremos. Mas não funciona assim no mundo humano!”. Ao querer atingir a perfeição aqui embaixo, corre-se o risco de entrar na lógica contábil, de agir como crianças que se empenham em obter uma recompensa, de cair no orgulho de tudo dominar, do farisaísmo. Na vida espiritual, isso pode resultar em escrúpulos, observa Brigitte de Baudus: “Se o nosso exame de consciência parece um catálogo, se nos concentramos sobre aquilo que fizemos ou não, se não consideramos o amor que colocamos em cada ato, aí existe um problema”.
No entanto, quando Jesus nos manda ser perfeitos como nosso Pai Celestial é perfeito (Mt 5, 48), ele nos chama à santidade, não ao perfeccionismo. “É a contrição, a onda de amor que te faz ir para o céu, não o fato de ser totalmente perfeito”, comenta Yves Boulvin. O exemplo típico é o próprio São Paulo, como explica o Padre Alek Zwitter: “Judeu de fé profunda, estava convencido de que o cumprimento fiel de sua Lei o levaria à perfeição espiritual. Depois da conversão, tendo entregue a Deus a sua imperfeição, encontrou uma fonte inesgotável de paz interior, alegria e força vital”.
Não se surpreenda com suas imperfeições
De qualquer forma, o comportamento perfeccionista é como uma máquina que não pode ser parada até que o programa seja concluído. Beatriz, 55 anos, ciente sobre as peculiaridades herdadas de seu avô, ex-oficial, admite: “Não descanso até estar no nível de conforto que imaginei para mim. Com a idade, aceitei deixar-me levar um pouco, mas quebrar esse hábito é uma jornada para toda a vida”.
Igualmente, os perfeccionistas costumam ser vítimas do esgotamento. Só há uma resposta para isso, o realismo. Ele passa pelo autoconhecimento e pelo humilde reconhecimento dos próprios limites. “Muitas vezes vejo mulheres se censurando à noite por terem ficado com raiva de seus maridos e filhos. Eu pergunto a elas: “Você reservou um tempo para si durante o dia?”, Diz Yves Boulvin. Permitir-se momentos de paz, aprender a delegar e estar em oração são atitudes essenciais para relaxar.
Assim, estar ciente das expectativas dos outros também ajuda a suavizar certas exigências pessoais. “Eu entreguei um projeto ao meu chefe. Pelos meus critérios, estava tudo bem. Ele achou excelente. Eu não nem esperava essa reação da parte dele!”, Admite Beatriz. Outros raramente entendem a quantidade de esforço que é preciso para fazer um bom jantar, não se ofendem com um pouco de poeira em um móvel, mas se divertem com uma criança com meias que não combinam.
Aliás, o perfeccionista é particularmente duro consigo mesmo. Por não conseguir atingir objetivos inatingíveis, sua autoestima muitas vezes acaba caindo. Melhor então tentar aplicar o sábio conselho de São Francisco de Sales: “Um dos melhores usos que podemos fazer da gentileza é aplicá-la a nós mesmos, nunca nos espantando com nossas imperfeições”.
Uma oração para se libertar do perfeccionismo
Enquanto o perfeccionista tende a se exaurir por conta própria, ele também cansa os outros quando lhes impõe seus próprios padrões de perfeição. Como manter a mente tranquila quando ao seu redor existe algo em constante movimento? De que forma se sentir livre se seu marido exige que você esteja perfeitamente vestida, não importa o que aconteça, ou se ele faz as contas da casa continuamente?
Por conseguinte, como não desanimar quando um professor aponta o único detalhe errado na sua tarefa? “Certa vez, meus filhos inventaram um refrão começando com “Mamãe que se estressa, mamãe que enlouquece…”, repetido regularmente em tempos de hiperatividade, percebi que estava levando um estilo de vida impossível e comecei a deixar espaço para a vida e os inesperados!”, testemunha Felícia, de 47 anos.
Ademais, Patrícia observa: “O perfeccionismo torna você frio, hostil, inacessível. Não há lugar para os outros na perfeição”. “Quem gostaria de amar uma pessoa modelo?”, pergunta o padre Pierre-Marie. “Para se deixar ser amado, você tem que aceitar que é imperfeito”. Libertar-se do perfeccionismo é um longo caminho que passa pelo despojamento e pela oração:
“Senhor, ensina-me a aceitar-me como sou!”
Enfim, para Brigitte de Baudus, “nunca devemos deixar de repetir essas palavras, mas é exatamente quando somos frágeis que o Senhor vem”.
Bénédicte de Saint Germain
Aleteia
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