Peregrinos chineses no Vaticano. Crédito: Daniel Ibáñez (ACI) |
HONG KONG, 14 out. 20 / 11:19 am (ACI).- O empresário de meios de comunicação e ativista católico, Jimmy Lai, assinalou que o Partido Comunista Chinês quer suplantar a religião com um maior controle do governo.
Lai, que mora em Hong Kong, disse que permanecerá na ilha apesar de enfrentar acusações criminais por seu apoio à democracia na ilha. O executivo foi preso em agosto, mas está em liberdade sob fiança.
“Quando você se eleva acima de seus próprios interesses, encontra o sentido da vida. Você percebe que está fazendo a coisa certa, o que é maravilhoso. Isso mudou minha vida para algo diferente”, disse Jimmy Lai em uma entrevista transmitida em 5 de outubro.
A entrevista foi feita por Fran Maier, pesquisador principal do Centro de Ética e Políticas Públicas e pesquisador associado principal da Universidade de Notre Dame. Foi produzido e lançado pelo Instituto de Napa, do qual Maier é membro do conselho.
Lai é católico e disse que durante os últimos 30 anos apoiou o movimento pró-democrático de Hong Kong, devido ao “ensinamento do Senhor de que sua vida não se trata de si mesmo”.
“A meu ver, se eu sofrer pela causa certa, isso só define a pessoa que estou me tornando. Só pode ser bom para mim ser uma pessoa melhor. Se você acredita no Senhor, se você acredita em que todo o sofrimento tem uma razão, e o Senhor está sofrendo comigo... Estou em paz com isso”.
Lai havia sido preso por um grupo de quase 200 policiais em 10 de agosto, junto com pelo menos nove pessoas relacionadas ao Apple Daily, o jornal que fundou em 1995. A prisão teria sido parte de uma aparente repressão às liberdades civis na ilha.
Apple Daily tem se destacado ao longo dos anos como uma publicação fortemente pró-democrática que critica o governo chinês em Pequim.
Lai está solto sob fiança, mas enfrenta acusações de acordo com a nova Lei de Segurança Nacional de Hong Kong, que entrou em vigor em 1º de julho, imposta pelo Partido Comunista Chinês sem passar pela legislatura da ex-colônia britânica.
De acordo com a nova lei, uma pessoa condenada por secessão, subversão, terrorismo ou conluio com forças estrangeiras receberá um mínimo de 10 anos de prisão, com possibilidade de prisão perpétua.
Lai chegou a Hong Kong aos 12 anos como clandestino, sem um centavo, da China continental. Sua mãe passou os primeiros anos de vida de Lai em um campo de trabalhos forçados. Em Hong Kong, Lai percebeu a necessidade de roupas acessíveis e de qualidade para a classe média e fundou uma rede de lojas de roupas chamada Giordano's, uma empresa que o enriqueceu e lhe permitiu lançar revistas e jornais pró-democracia em Hong Kong e Taiwan.
E embora seja um cidadão britânico, disse que não tem planos de deixar Hong Kong. Indicou que sua família apoia sua decisão de ficar, mas teme por sua segurança.
“Se eu for, não renuncio apenas ao meu destino, renuncio a Deus, renuncio à minha religião, renuncio àquilo em que acredito”, disse. "Eu sou o que sou. Sou o que acredito. Não posso mudar isso. E se não posso mudar, tenho que aceitar meu destino com elogios", acrescentou.
Lai disse que sua esposa sempre foi uma católica devota e, mesmo antes de sua conversão, ele sempre a acompanhava à igreja. No entanto, em 1997, percebeu que precisava da proteção e ajuda de um poder superior. Foi batizado e recebido na Igreja pelo Cardeal Joseph Zen, Bispo Emérito de Hong Kong.
Hong Kong tem desfrutado historicamente de liberdade religiosa, ao contrário da China continental, onde crentes religiosos de todos os tipos sofrem perseguição. A Igreja Católica na China está dividida desde 1951 entre a chamada Igreja clandestina, que é perseguida e leal a Roma, e a Igreja Patriótica Chinesa, controlada pelo Estado.
Lai disse que a China precisa da liderança moral do Vaticano, mas expressou decepção com as negociações da Santa Sé com o regime comunista, em particular o acordo de setembro de 2018 sobre a nomeação de bispos, que será renovado no final deste mês.
O Ccardeal Zen viajou recentemente ao Vaticano para pedir ao Papa Francisco que não renovasse o acordo entre o Vaticano e a China, mas o Pontífice não concedeu uma audiência ao Purpurado.
O poder do Vaticano é moral e virtuoso, e não temporário, disse Lai, e deve defender os valores morais quando mais precisam.
Quando o Papa e a Santa Sé silenciam sobre as ações do PCCh, “isso é muito decepcionante, muito prejudicial para um mundo que admira o Vaticano por sua liderança moral”.
Lai disse que, em sua opinião, o Ocidente pensa errado ao acreditar que quanto mais ricos ficarem na China, "mais se parecerão conosco".
Assinalou que os valores são importantes e que o comportamento do PCCh ameaça os valores cristãos, espalhando sua influência para esferas internacionais, como Hollywood e esportes profissionais.
A pandemia de Covid-19, disse Lai, é um "evento de Pearl Harbor" para o mundo, que deve tirar o mundo da complacência. "Devemos olhar para os fatos. Devemos olhar para o que eles fizeram ao mundo, como lidam com o mundo", assinalou.
“O problema que enfrentamos agora é: a China vai ser a mais poderosa, economicamente, do mundo. Agora é a hora de mudarmos a atitude da China... do contrário, eles nos transformarão na deles”, alertou.
Além disso, assinalou que os líderes do Partido Comunista Chinês não querem apenas eliminar Deus, mas querem "ser" Deus.
O presidente chinês, Xi Jinping, quer ser respeitado como todo-poderoso e é por isso que o Partido busca controlar a religião, indicou.
Além disso, afirmou que o fato de que o PCCh queira suplantar a religião é uma "perversão moral", com o objetivo de ver as pessoas "sofrerem pelos pecados [de Jinping]".
"Uma vez que você não tem uma religião, pode facilmente ser ditado por sua ordem", disse.
Os católicos estiveram fortemente envolvidos nos protestos pró-democracia em Hong Kong, que chegaram ao auge durante o verão de 2019.
"Nosso instinto nos instam a enfrentar a injustiça, o mal. Acho que isso é apenas um instinto. Sendo católico, tem o instinto de enfrentar o que está errado, porque é assim que andamos no caminho do Senhor”, observou Lai.
Assim, disse que em Hong Kong e na China continental, os cristãos estão olhando para o Vaticano em busca de liderança moral.
“O Vaticano só pode depender de sua virtude e poder moral para converter o povo chinês da ditadura do ateísmo. Os chineses buscam a fé, além de sua vida material. O que falta a eles não é material, porque a China certamente melhorou a riqueza e o sustento das pessoas nos últimos 40 anos. Quanto mais sucesso material têm, mais vazio sentem em seus corações ”, disse Lai.
Nesse sentido, acrescentou que o vazio moral na China deve ser preenchido pelo catolicismo para ensinar às pessoas que "a vida é mais do que pão".
O povo chinês, disse, "quer religião, o que eles mais querem é virtude e moral para viver uma vida significativa, que o Vaticano não está dando a eles", mas sim "está tirando deles quando se alinham com o PCCh, que os reprimiu em sua busca espiritual. Isso é realmente ridículo. Isso é muito decepcionante”.
Hong Kong é uma "região administrativa especial" da China, o que significa que tem seu próprio governo, mas permanece sob o controle chinês. Foi colônia britânica até 1997, quando foi devolvida à China sob o princípio de "um país, dois sistemas", o que lhe permitiu ter sua própria legislatura e sistema econômico.
A abertura de Hong Kong para o mundo exterior e a transparência na regulamentação comercial e bancária, em contraste com a China continental, tornaram-no um centro de negócios, bancos e finanças globais.
Os protestos pró-democracia em Hong Kong, dos quais participaram muitos católicos e cristãos de outras religiões, rejeitaram com sucesso os esforços da legislatura no ano passado para aprovar um polêmico projeto de lei que teria permitido à China continental extraditar supostos delinquentes de Hong Kong.
Com a aprovação de novas leis de segurança, o governo comunista chinês ganhou mais poder para reprimir os protestos em Hong Kong, que vê como um desafio direto ao seu poder.
Regras de segurança semelhantes foram propostas anteriormente.
Em 2003, o regime comunista tentou usar os próprios conselhos legislativo e executivo de Hong Kong para aprovar medidas contra a sedição, mas protestos em massa levaram os legisladores a abandonar a proposta.
Em 27 de maio, o Departamento de Estado dos EUA anunciou que, à luz das ações da China, não mais reconhece Hong Kong como politicamente autônomo da China, designação de que a região goza de acordo com a legislação americana desde 1992.
Publicado originalmente em CNA. Traduzido e adaptado por Natalia Zimbrão.
ACI Digital
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