Rainha Maria |
No encerramento do Ano Santo da Misericórdia (2015-2016), o Papa Francisco instituiu o Dia Mundial dos Pobres, a ser celebrado no 33º Domingo do Tempo Comum, no Domingo que antecede a Solenidade de Cristo Rei. O objetivo do Dia Mundial dos Pobres é reavivar na Igreja um elemento requintadamente evangélico, isto é, a predileção de Cristo pelos pobres, a fim de que as comunidades cristãs sejam sempre mais e melhor um sinal concreto da caridade de Jesus pelos pobres, os marginalizados e os excluídos.
O Dia Mundial dos Pobres pretende estimular, em todos nós, uma reação concreta à cultura do descarte e do desperdício, assumindo a cultura do encontro na defesa da nossa casa comum. Ao mesmo tempo, é um convite dirigido a todos para que se abram à partilha com os pobres em todas as formas de solidariedade, exercitando as obras de misericórdia. “Portanto, somos chamados a estender a mão aos pobres, a encontrá-los, fixá-los nos olhos, abraçá-los, para lhes fazer sentir o calor do amor que rompe o círculo da solidão. A sua mão estendida para nós é também um convite a sairmos das nossas certezas e comodidades e a reconhecermos o valor que a pobreza encerra em si mesma”. (Papa Francisco, Misericordia et Misera, nº 3).
O lema do IV Dia Mundial dos Pobres é “Estende a tua mão ao pobre”. (Eclo 7, 32). Em sua Mensagem para este Dia Mundial dos Pobres o Papa Francisco nos recorda um dos princípios do cristianismo: a oração a Deus e a solidariedade para com os pobres e os enfermos são inseparáveis, ou seja, de algum modo, a nossa oração, o nosso diálogo com Cristo é transformador quando se concretiza no acolhimento, na abertura e no esforço de abrandar as dificuldades dos pobres e, por isso, “o encontro com uma pessoa em condições de pobreza não cessa de nos provocar e questionar: como podemos contribuir para eliminar ou pelo menos aliviar a sua marginalização e o seu sofrimento? Como podemos ajudá-la na sua pobreza espiritual? A comunidade cristã é chamada a co-envolver-se nesta experiência de partilha, ciente de que não é lícito delegá-la a outros”. (Papa Francisco, Mensagem para o IV Dia Mundial dos Pobres).
Neste ano de 2020, nesta noite escura da pandemia da Covid-19, todos nós, de alguma forma, nos sentimos vulneráveis, fragilizados, pobres e carentes de ajuda. Dessa maneira, sentimos necessidade de sermos socorridos em nossas fragilidades, mas, ao mesmo tempo, percebemos que devemos estender a mão para socorrer o nosso próximo e defendê-lo, pois, infelizmente, o nosso país voltou ao mapa da fome devido aos elevados recordes das taxas de desemprego e pelas dificuldades de inúmeras pessoas em realizar serviços informais no contexto de isolamento social em decorrência da pandemia.
Inseridos neste difícil contexto, nós percebemos a urgência de estender a mão ao pobre, ou seja, a realizar um simples gesto que demanda proximidade e expressa acolhimento, ternura, caridade e misericórdia. Estender a mão ao pobre é um ato repleto de virtudes humanas e cristãs que não se limita apenas a dar dinheiro a um pedinte ou a um desempregado. Só conseguiremos estender a mão ao pobre quando primeiro abrirmos o nosso coração ao acolhimento de sua pessoa com a consciência de que a pobreza é fruto da indiferença e dos egoísmos humanos. Só conseguiremos estender a mão ao pobre quando percebermos que o próprio Cristo está escondido sob o rosto dos pobres. Sim, Deus está visível nos pobres, incentivando-nos a estender a mão aos necessitados, sussurrando em nossos ouvidos: Estende a tua mão ao pobre, “estende‑a muitas vezes, favorecendo o teu próximo; defende de qualquer injúria os que vejas sofrer sob o peso da calúnia, estende também a tua mão ao pobre que te pede; estende‑a ao Senhor, pedindo‑lhe o perdão dos teus pecados: é assim que se deve estender a mão, e é assim que ela fica curada”. (Santo Ambrósio).
Estender a mão ao pobre é um ato de misericórdia que significa que estamos dispostos a ajudar, pois sentimo-nos parte do mesmo itinerário, e, por isso, expressamos a nossa corresponsabilidade humana. “Estender a mão é um sinal: um sinal que apela imediatamente à proximidade, à solidariedade, ao amor. Nestes meses, em que o mundo inteiro foi dominado por um vírus que trouxe dor e morte, desconforto e perplexidade, pudemos ver tantas mãos estendidas! A mão estendida do médico que se preocupa com cada paciente, procurando encontrar o remédio certo. A mão estendida da enfermeira e do enfermeiro que permanecem, muito para além dos seus horários de trabalho, a cuidar dos doentes. A mão estendida de quem trabalha na administração e providencia os meios para salvar o maior número possível de vidas. A mão estendida do farmacêutico exposto a inúmeros pedidos num arriscado contato com as pessoas. A mão estendida do sacerdote que, com o coração partido, continua a abençoar. A mão estendida do voluntário que socorre quem mora na rua e a quantos, embora possuindo um teto, não têm nada para comer. A mão estendida de homens e mulheres que trabalham para prestar serviços essenciais e segurança” (Papa Francisco, Mensagem para o IV Dia Mundial dos Pobres).
Somente com as mãos estendidas, nós somos, de fato, discípulos missionários de Jesus, arautos da esperança que fazem sua a dor, a dificuldade ou a carência de quem é pobre, está doente, abandonado ou triste. Tudo o que realizamos em prol da dignidade e valorização do pobre é grandioso, até mesmo um simples sorriso, pois “um sorriso que partilhamos com o pobre é fonte de amor e permite viver na alegria. Possa então a mão estendida enriquecer-se sempre com o sorriso de quem não faz pesar a sua presença nem a ajuda que presta, mas alegra-se apenas em viver o estilo dos discípulos de Cristo”. (Papa Francisco, Mensagem para o IV Dia Mundial dos Pobres).
Que o forte clamor do Dia Mundial dos Pobres nos ajude a realizar sempre mais gestos significativos de misericórdia em relação aos pobres, dando concretude à tão falada opção preferencial da Igreja pelos pobres. Que o Cristo nos conceda a graça de percebermos que “os pobres não são um problema: são um recurso de que lançar mão para acolher e viver a essência do Evangelho”. (Papa Francisco, Misericordia et Misera, nº 9). De um modo especial, peçamos ao Cristo a consciência de que os pobres podem nos ensinar muitas coisas, em especial, a humildade e a confiança em Deus. Que o Cristo, que por amor a nós se fez Pobre, nos ensine a servir aos pobres e a perceber neles a dignidade da vida humana.
Que em nossa Arquidiocese, paróquias e comunidades haja sempre mais uma grande sensibilidade em relação aos pobres e que Senhor Jesus nos ajude a edificar diversas organizações para a prática da caridade e da misericórdia para com os pobres do nosso país, da nossa cidade e das diversas periferias do mundo. Que a Virgem Santa Maria, a Mãe dos pobres, nos ajude a testemunhar, por meio das obras de caridade e pelo serviço da misericórdia, que onde há um pobre, ali está Jesus Cristo suplicando pão, justiça, acolhimento e amor. Por conseguinte, quando socorremos aos pobres, eles, na verdade é que nos socorrem. Afinal, neles está o nosso Redentor, nosso Deus adorado e amado!
Aloísio Parreiras
(Escritor e membro do Movimento de Emaús)
Arquidiocese de Brasília
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