Waorani da Amazônia | L'Osservatore Romano |
«Devo admitir que o resto do mundo se perdeu, se com isto nos referimos por exemplo à cultura, aos hábitos, problemas, relacionamentos e a tudo o que faz parte da realidade da qual provenho», explica Marina Tana, que em 2017 empreendeu uma viagem solitária pela Amazónia, do Equador ao Brasil, e até 30 de outubro expôs em Milão as fotografias daquela experiência, contidas num percurso organizado por Paola Riccardi, intitulado “Human Forest”.
Na remota zona intangível do Parque Nacional Yasuní (criada no Equador em 1999 para proteger o território de alguns grupos indígenas), Marina Tana quis viver visitando também a comunidade Waorani de Bameno, apresentada pela primeira vez ao mundo em 1956 pela «Life Magazine» como “O pior povo da Terra”: dos anos 50 aos anos 70, objeto de uma verdadeira colonização, determinada pela presença de petróleo nos seus territórios, os Waorani voltaram a viver na floresta, um mundo tão distante do nosso: «A cosmogonia amazónica baseia-se em paradigmas completamente diferentes da nossa cultura ocidental, dominada pelo dualismo ontológico entre matéria e espírito, acrescenta Marina Tana, pois para eles os seres vivos e a floresta, a natureza e os espíritos, o corpo e a alma, nunca são concebidos como pura dualidade; tudo é imanente. Trata-se de uma perspetiva que para nós é difícil de compreender».
O coronavírus colocou em maior perigo as populações amazónicas, já cronicamente afetadas pela fragilidade económica e sanitária. «No ano passado, durante a emergência de incêndios na Amazónia, muitos países mobilizaram-se para ajudar a combater as chamas. E agora? — questiona Tana — na Amazónia, as pessoas têm relevância secundária, ou até totalmente marginal, no que diz respeito à questão ambiental que, tendo um impacto sobre todos nós a nível global, exige uma série de ações internacionais concretas. Se houvesse ajuda médica, quem a deveria gerir? As comunidades indígenas, embora façam parte do mesmo Estado, não formam um corpo político coeso e isto favorece governos que não lhes querem dar voz nem sequer em assuntos que dizem respeito à segurança e à saúde». O fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado fez um apelo em defesa e tutela destas comunidades em risco: «Sem qualquer salvaguarda contra este vírus altamente contagioso», escreveu, «os povos indígenas enfrentam o risco concreto de genocídio devido à contaminação causada pela entrada descontrolada nas suas terras e pelo acesso praticamente inexistente a instalações hospitalares». Grandes guerreiros e caçadores, os Waorani vivem em harmonia com a floresta da qual obtêm o sustento através da pesca e da caça, em que participam também as mulheres e as crianças: «Durante quatro semanas passadas na aldeia de Bameno, dei testemunho da vida diária descobrindo, para além do folclore rebuscado de um certo tipo de turismo, as dificuldades desta comunidade comprometida na preservação da memória dos seus costumes e no combate à ameaça ambiental, à corrupção e à sedução do Ocidente».
Mais de seis meses de preparação, entre estudos e organização prática e logística, com o desejo de conhecer o mundo, a viagem à Amazónia coroa um sonho que Marina Tana tinha desde a infância. Todos os seus projetos são analisados nos pormenores, para evitar problemas inúteis, através de estudos e leituras capazes de ampliar o conhecimento antropológico e histórico dos países onde ela escolhe pôr o dedo no globo. Formada em engenharia e comprometida na área da tecnologia e inovação a nível internacional, Marina Tana começa a viajar sozinha em 2014, e continua até hoje: a escolha de viajar sozinha não é um fútil princípio de independência feminina, mas um modo para não ser influenciada por companheiros de viagem e para viver cada experiência de maneira exclusiva. O desejo de fotografar transforma-se em necessidade, não apenas para testemunhar o que vê, mas como instrumento que a relaciona com as paisagens e as pessoas que são a alma vibrante daqueles lugares: «A fotografia é o meio expressivo que escolhi para dar voz às reflexões decorrentes desta incrível experiência humana — diz Tana — sobre a restituição da justa dignidade e função às pessoas e sobre a promoção da ideia de uma ecologia integral para o nosso futuro». Os Waorani de Bameno, através do apelo de Penti Baihua, líder daquela comunidade, reivindicam o direito de ser livres de viver no seu ambiente, a floresta amazónica, cuja sobrevivência é uma garantia essencial para o mundo: «Quando se fala de sustentabilidade, ela não pode limitar-se apenas aos aspetos ecológicos e ambientais — conclui — mas deve incluir também os seres humanos. Eis no que consiste o conceito de ecologia integral, promovido pelo Papa Francisco na encíclica Laudato si’».
Susanna Paparatti
L'Osservatore Romano
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