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Flora Carmichael e Jack Goodman
·
BBC Reality Check
3
dezembro 2020
'DNA
alterado'
O medo de que uma
vacina seja capaz de mudar de alguma forma o DNA das pessoas é algo
regularmente compartilhado nas redes sociais.
A BBC perguntou a três
cientistas independentes sobre o assunto. Eles responderam que a vacina contra
o coronavírus não alteraria o DNA humano.
Algumas das vacinas
recém-criadas, incluindo a agora aprovada no Reino Unido e desenvolvida pela
Pfizer/BioNTech, usam um fragmento do material genético do vírus — ou RNA
mensageiro.
"Injetar RNA em
uma pessoa não mexe em nada no DNA de uma célula humana", explica o
professor Jeffrey Almond, da Universidade de Oxford, do Reino Unido.
A vacina funciona
dando instruções ao corpo para produzir uma proteína que está presente na
superfície do coronavírus.
O sistema imunológico
então aprende a reconhecer e produzir anticorpos contra o vírus.
Esta não é a primeira
vez que alegações de que uma vacina contra o coronavírus supostamente altera o
DNA ganham força. Investigamos um vídeo popular divulgando a teoria em maio.
Algumas postagens
apontavam que a tecnologia da vacina de RNA mensageiro (mRNA) "nunca foi
testada ou aprovada antes".
É verdade que nenhuma vacina de mRNA foi aprovada até então, mas vários estudos com medicamentos desse porte foram testados em humanos nos últimos anos. E, desde o início da pandemia, a vacina foi testada em dezenas de milhares de pessoas em todo o mundo e passou por processos de aprovação de segurança.
A vacina contra covid-19 não altera o DNA de quem recebê-la
Como todas as novas
vacinas, ela deve passar por verificações de segurança rigorosas antes de ser
recomendada para uso generalizado.
Nos ensaios clínicos
de fase 1 e fase 2, as vacinas são testadas em um pequeno número de voluntários
para verificar se são seguras e determinar a dose certa.
Nos testes de fase 3,
as imunizações são testadas em milhares de pessoas para verificar a eficácia. O
grupo que recebeu a vacina e um grupo de controle que tomou placebo são monitorados
de perto para quaisquer reações adversas, como efeitos colaterais. O
monitoramento de segurança continua após a vacina ser aprovada para uso.
Bill Gates e
microchip
A seguir, uma teoria
da conspiração que se espalhou pelo mundo.
Ele afirma que a pandemia
de coronavírus é uma cortina de fumaça para um plano de implante de microchips
rastreáveis nas pessoas. O cofundador da Microsoft, Bill Gates, estaria por
trás do plano.
Não existe um "microchip" de vacina e não há evidências que sustentem as alegações de que Bill Gates esteja planejando isso no futuro.
Não é verdade que vacinas contra o coronavírus tenham
microchips de Bill Gates
A Fundação Bill e
Melinda Gates disse à BBC que a teoria é "falsa".
Os rumores se
espalharam em março, quando Gates disse em uma entrevista que eventualmente
"teremos alguns certificados digitais" que seriam usados para
mostrar quem se recuperou, foi testado e, finalmente, quem recebeu a vacina.
Ele não fez menção aos microchips.
Isso levou a um artigo
amplamente compartilhado com o título: "Bill Gates usará implantes de
microchip para combater o coronavírus."
O artigo faz
referência a um estudo, financiado pela fundação do bilionário, sobre uma
tecnologia que poderia armazenar os registros da vacina de uma pessoa em uma
tinta especial administrada com uma injeção.
No entanto, a
tecnologia não é um microchip e é funciona mais como uma tatuagem invisível.
Ela ainda não foi implementada, não permitiria que pessoas fossem rastreadas e
informações pessoais não seriam inseridas em um banco de dados, diz Ana
Jaklenec, cientista envolvida no estudo.
O bilionário fundador
da Microsoft foi objeto de muitos falsos rumores durante a pandemia.
Ele foi visado por
causa de seu trabalho filantrópico em saúde pública e desenvolvimento de
vacinas.
Apesar da falta de
evidências, em maio, uma pesquisa do YouGov com 1.640 pessoas apontou que 28%
dos americanos acreditavam que Gates queria usar vacinas para implantar
microchips em pessoas. O percentual crescia para 44% entre os seguidores do
Partido Republicano, de Donald Trump.
Tecido de feto
As vacinas contra covid-19 não contêm células de fetos
abortados
Também há teorias de
que as vacinas contêm tecido pulmonar de fetos abortados. Essa teoria também é
falsa.
"Não há células
fetais usadas em qualquer processo de produção de vacina", explica Michael
Head, da Universidade de Southampton, no Reino Unido.
Um vídeo em particular
postado em uma das maiores páginas antivacinas do Facebook aponta que um estudo
sobre a vacina desenvolvida pela AstraZeneca e pela Universidade de Oxford
mostrava o uso desse tecido.
Mas a interpretação do
narrador do vídeo está errada: o estudo citado explorou como a vacina reagiu quando
introduzida em células humanas em um laboratório, e não que havia tecido de
fetos abortados no desenvolvimento do medicamento.
A mentira pode ter
surgido porque há uma etapa no processo de desenvolvimento de uma vacina que
usa células cultivadas em laboratório, que são descendentes de células
embrionárias que de outra forma teriam sido destruídas. A técnica foi
desenvolvida na década de 1960, e nenhum feto foi abortado para ser utilizado
nesta pesquisa.
Muitas vacinas são
feitas desta forma, explica David Matthews, da Universidade de Bristol,
acrescentando que quaisquer vestígios das células são completamente removidos
da vacina, "com padrões excepcionalmente elevados".
Os desenvolvedores da
vacina na Universidade de Oxford dizem que trabalharam com células clonadas,
mas essas células "não são células de bebês abortados".
As células funcionam
como uma espécie de fábrica. Ela cria uma forma muito enfraquecida do vírus que
foi adaptada para funcionar como uma vacina.
Mas, embora o vírus enfraquecido
seja criado a partir dessas células clonadas, esse material celular é removido
quando o vírus é purificado, e não é usado na vacina.
Taxa de
recuperação
Um dos questionamentos
bastante compartilhado nas redes sociais é sobre o qual o motivo da necessidade
de uma vacina se a chance de morte por covid-19 é tão pequena.
Um meme compartilhado
por pessoas que se opõem à vacinação colocou a taxa de recuperação da doença em
99,97% e sugeriu que ser infectado por covid-19 é uma opção mais segura do que
tomar uma vacina.
Para começar, o número
referido no meme como "taxa de recuperação" — o que implica que são
pessoas que contraíram o vírus e sobreviveram — não é correto.
Cerca de 99% das
pessoas que pegam covid sobrevivem, diz Jason Oke, estatístico da Universidade
de Oxford.
Portanto, cerca de 100
pessoas por grupo de 10 mil infectados vão morrer — muito mais do que três em
10 mil, conforme sugere o meme.
No entanto, Oke
acrescenta que "em todos os casos os riscos dependem muito da idade e não
levam em consideração a morbidade de curto e longo prazo da covid-19".
Não se trata apenas de
sobrevivência. Para cada pessoa que morre, há outras que sobrevivem, mas passam
por cuidados médicos intensivos. Também há aquelas que sofrem com sequelas
duradouras.
Isso pode contribuir
para um serviço de saúde sobrecarregado, cheio de pacientes com covid,
competindo com os recursos limitados de um hospital que trata pacientes com
outras doenças e lesões.
Concentrar-se na taxa
de mortalidade geral, ou dividir a aplicação de uma vacina em um ato
individual, perde o sentido da vacinação, diz o professor Liam Smeeth, da
Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres. "A vacinação deve ser
vista como um esforço da sociedade para proteger os outros, diz ele.
"No Reino Unido, a
pior parte da pandemia, o motivo do lockdown, ocorre porque o serviço de saúde
ficaria sobrecarregado. Grupos vulneráveis como idosos e doentes em lares de
idosos têm uma chance muito maior de adoecer gravemente se contraírem o
vírus,", explica.
Reportagem
adicional de Kris Bramwell, Olga Robinson e Marianna Spring
BBC News Brasil
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