O Papa em Nakasaki em novembro de 2019 | Vatican Media |
O
Japão e o mundo recordam esta sexta-feira o bombardeio nuclear estadunidense
que devastou Hiroshima em 6 de agosto de 1945 e Nagasaki três dias depois. O
aniversário cai dois dias antes do final dos Jogos Olímpicos "que, como
enfatiza dom Joseph Mitsuaki Takami, são para cada nação um convite à
verdadeira paz, que certamente não se constrói com a posse das armas
nucleares".
Andrea De Angelis - Vatican News
Passaram-se 76 anos daqueles dias horríveis, quando
o mundo descobriu o poder destrutivo devastador das armas mais perigosas jamais
antes construídas na Terra. Os dois ataques nucleares, realizados pelos EUA no
final da Segunda Guerra Mundial, ceifaram mais de 100 mil vidas em Hiroshima e
Nagasaki, bombardeadas em 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente. De acordo
com algumas estimativas, os mortos podem ter ficado perto de 200 mil. Este foi
o primeiro e único ataque nuclear em guerra na história, mas o desenvolvimento
dos armamentos e sua posse por parte de muitos Estados mostra como a paz está
em risco. Esta é outra razão pela qual é importante lembrar aqueles três dias
que marcaram a história de um país, o Japão, sobre o qual os holofotes do mundo
têm estado concentrados há duas semanas devido ao Jogos Olímpicos de Tóquio
2020, adiados por um ano devido à pandemia. As Olimpíadas terminarão no domingo
8 de agosto e, duas semanas depois, será a vez das Paraolímpicas.
O testemunho dos sobreviventes
Às 8h15, o sino tocou para marcar o início do
minuto de silêncio, a hora exata em que os EUA lançaram a bomba atômica sobre
Hiroshima, causando instantaneamente dezenas de milhares de mortes e
reescrevendo tragicamente a história dos conflitos mundiais e tornando o mundo
consciente - com o passar do tempo, na realidade - dos efeitos devastadores das
armas nucleares. Mesmo décadas depois. A cidade japonesa celebra o aniversário
no Parque Memorial da Paz. Devido à pandemia, o número de participantes foi
reduzido a algumas centenas, representando 86 nações unidas em nome da paz. O
prefeito de Hiroshima, Kazumi, instou o governo a assegurar que as negociações
sobre a revisão do Tratado de Não-Proliferação Nuclear pudessem ser retomadas,
apesar da pandemia. O Japão, apesar de ter sido o único país a sofrer um ataque
atômico, não ratificou o tratado. Também presentes na cerimônia desta
sexta-feira estavam os hibakusha, os sobreviventes do ataque nuclear. A idade
média deles está em torno de 84 anos.
A paz só pode ser desarmada
O Japão, portanto, olha para trás para celebrar as
vítimas, para gritar "nunca mais" ao mundo e para ouvir, novamente
este ano, a voz dos sobreviventes dos bombardeios nucleares. Cada vez menos,
com o passar do tempo. A mensagem deles atravessa fronteiras e gerações e pede
aos indivíduos, aos cidadãos e aos governantes que trabalhem pela paz, pela não-proliferação
nuclear, para diminua que o número de países no mundo que possuem armas cada
vez mais devastadoras e perigosas. Em novembro de 2019, durante sua viagem
apostólica ao Japão e à Tailândia, o Papa definiu o uso da energia atômica para
fins guerra "crime não só contra o homem e sua dignidade", mas
"contra qualquer possibilidade de futuro em nossa casa comum".
"A verdadeira paz só pode ser uma paz desarmada", acrescentou
Francisco, ressaltando como "do abismo de silêncio se continua a ouvir o
grito daqueles que já não mais estão entre nós". Os discursos feitos por
Francisco em Hiroshima e Nagasaki certamente devem ser considerados como
pronunciamentos de teologia moral, são palavras proféticas. Resultado de uma
análise cuidadosa e precisa do mundo contemporâneo, eles expressam, portanto,
um forte realismo político: o mundo corre o risco de autodestruição.
A chama olímpica nos diz:
"bombas, nunca mais"
Há dois anos, o Papa foi recebido em Nagasaki pelo
arcebispo da cidade, dom Joseph Mitsuaki Takami, cuja arquidiocese é a maior do
Japão. Na véspera do aniversário do bombardeio atômico e do fim dos Jogos
Olímpicos, em entrevista à Rádio Vaticano - Vatican News, dom Takami reiterou a
necessidade do desarmamento nuclear para que se possa construir uma paz real,
verdadeira e concreta. As Olimpíadas também nos ensinam, e a feliz coincidência
de datas pode ser uma advertência ulterior, a fim de que, em não esquecer,
possamos realmente trabalhar por um presente e um futuro de harmonia entre as
nações.
Dom Takami, graças aos Jogos Olímpicos, o mundo
olha para o Japão. Os holofotes estarão voltados para o país também no
aniversário dos bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki. Por um lado,
portanto, a história que não deve ser esquecida e, por outro, a história do
esporte que está sendo escrita. Quais são seus sentimentos a respeito desta
coincidência?
Os Jogos Olímpicos são uma festa esportiva, mas
também um incentivo para criar paz no mundo. Portanto, esta coincidência é
muito significativa, mesmo que, infelizmente, devido à pandemia, as pessoas não
possam presenciar as competições. Em todo caso, os Jogos são uma coisa boa,
trazem uma bela atmosfera e muito entusiasmo.
Passados 76 anos, o que o senhor gostaria de dizer
hoje à população de sua arquidiocese, particularmente aos jovens?
A cada ano as testemunhas diretas são cada vez
menos, mas elas deixam uma experiência importante. Valiosa. Essa experiência
deve ser transmitida às crianças, e esta passagem é muito importante, como
reitera também o Papa. É um testemunho que é realizado inclusive através de
outros canais como o cinema, a literatura e também a contribuição da mídia.
Devemos continuar neste esforço para manter a memória viva.
Este ano também se recorda o décimo aniversário do
acidente de Fukushima. Por que não devemos esquecer o que aconteceu no Japão em
março de 2011?
O problema é comum, devemos abolir a energia
atômica, que é muito perigosa. Não devemos fabricar armas, e mesmo a energia
nuclear, se necessária em um sentido, hoje em dia deve ser superada, devemos
produzir energia de outra forma, eliminando a energia nuclear, que é perigosa.
O Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares é
importante, foi ratificado por muitos países, porém muitos, demasiados Estados
continuam a ter armas nucleares. Então é a posse de armas que é o verdadeiro
problema, o impedimento a uma mudança real?
Este problema é enorme e, seguindo as palavras do
Papa, devemos absolutamente abolir as armas nucleares na Terra. Não podemos
manter a paz real enquanto tivermos essas armas ao mesmo tempo. Não é a paz
verdadeira, é falsa! O Tratado é eficaz, entrou em vigor no início deste ano,
mas agora devemos todos promover a adesão dos países, mesmo aqueles que hoje
possuem armas nucleares. No ano passado, em 7 de julho, o bispo de Hiroshima,
dom Alexis Mitsuru Shirahama, criou um fundo para promover a adesão a este
Tratado, dando também ajuda financeira para apoiar as atividades que dão
sustentação à ratificação. É uma iniciativa pequena, mas importante para
atingir o objetivo.
As Olimpíadas estão chegando ao fim, depois será a
vez das Paraolímpicas. O que estes Jogos, que são esperados há cinco anos, nos
ensinam?
Gostaria de começar com os Jogos Paraolímpicos, que
tiveram início em Tóquio, em 1964. Hoje há muitos atletas participando e eles
nos pedem respeito universal, sem preconceitos e discriminações. Eles têm uma
força especial na promoção dos direitos humanos. Além disso, nesta edição há um
grande equilíbrio numérico entre atletas masculinos e femininos, enquanto que
no início havia poucas mulheres. Isto também significa respeito pelas pessoas.
E isto também é muito importante. Uma representação simbólica, mas que nos faz
lembrar quantos conflitos existem no mundo hoje. As Olimpíadas testemunham o
desejo de criar um mundo onde haja paz entre as nações.
Quais são suas emoções quando pensa que 76 anos
atrás uma bomba atômica marcou para sempre a história do Japão, e hoje, três
quartos de século depois, a chama olímpica foi acesa no mesmo país?
Esta
é uma bela imagem! A chama olímpica é também um símbolo de uma oração de amor,
uma oração pela paz. A bomba atômica é absolutamente contrária a esta chama e
hoje nos é pedido para aboli-la, para nunca mais usá-la. O único fogo é o da
unidade, do amor e da paz.
Fonte: Vatican News
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