Guadium Press |
Redação (11/09/2021 10:58, Gaudium Press) Para o renomado historiador Daniel-Rops, “a evolução das sociedades humanas não conhece cortes bruscos e, do passado para o futuro, as mudanças se fazem mais por transformação do que por mutação repentina”.[1] Isso, entretanto, não impede a existência de datas fatídicas, “em que parece que a própria corrente da História muda de sentido”. [2] Tanto para regiões pequenas ou grandes civilizações, essas datas existem e muitas delas são sublinhadas pela queda e ruína de edifícios, anunciando mudanças radicais nos acontecimentos.
Símbolo do regime com o qual queriam romper
Se um literato tivesse ousado imaginar o acontecido naquele dia em Paris, correria o sério risco de ser taxado de louco e conspirador. Mas não se tratava de ficção. A 14 de julho de 1789, a própria História se encarregava de pintar, com as tintas da mais pura realidade, uma trágica sucessão de horrores.
A multidão armada aflui junto à fortaleza da Bastilha. Disparando incessantemente e buscando incendiar uma das torres, consegue, por fim, quebrar as amarras da ponte levadiça, que tomba estrepitosamente. O pátio é invadido e os edifícios postos a saque. A multidão, ébria de sangue, corre aos Paços do Conselho. O presidente do município, Flesselles, pálido, vem ao seu encontro. Ainda não tinha dado três passos, quando, por sua vez, é morto e degolado.[3]
Aquela antiga fortaleza medieval fora transformada numa prisão do governo que contava à época com apenas sete prisioneiros: quatro falsificadores, um jovem preso a pedido da família, e dois loucos.
Ao tomarem a Bastilha os revolucionários estavam em busca do armamento e da munição lá depositados. A fortaleza de si não tinha maior transcendência; sua conquista, porém, foi exaltada pelos propagandistas, enaltecida pela Assembleia, aprovada pela corte e legitimada por Luís XVI. Tornou-se o sinal da pusilanimidade real e a “prova de que a monarquia renunciava aos seus próprios princípios”.[4]
A invasão da Bastilha se transformou num dos maiores emblemas da Revolução Francesa. Por quê? O povo se dirigiu para lá procurando armas, é verdade. Mas o gesto possuía uma dimensão mais profunda: o castelo era símbolo do regime com o qual queriam romper. Assim, sua ruína representou o desmoronamento da monarquia, que fora até então, nesta terra, “o supremo recurso contra a maldade dos homens e a hostilidade das coisas”.[5]
O mundo entra em novas e abomináveis paisagens
“Um dia de trevas na história da humanidade”, assim foi qualificado, pelo Sumo Pontífice, aquele 11 de setembro de 2001.[6] Às 8h45, horário de Nova York, uma aeronave sequestrada por terroristas colidia contra um dos maiores edifícios do mundo. Dezoito minutos mais tarde, o prédio contíguo ao anterior era golpeado por outro avião. Quando o relógio marcava 10h30, as torres gêmeas do World Trade Center – edifícios de cento e dez andares –, estavam no chão, reduzidas a escombros de ferro e concreto.
Passados cerca de quarenta minutos da primeira explosão, um terceiro avião atingiu o Pentágono, sede do Departamento de Defesa Americano; e às 11h29 um quarto caiu em Pittsburgh (Pensilvânia). Os atentados causaram milhares de vítimas.[7] Ataque impiedoso, condenado pela totalidade das autoridades internacionais, não deixou de conter, também, seu aspecto altamente simbólico. Para o então chanceler da Alemanha, Gehrard Schroeder, os atentados foram uma “declaração de guerra a todo o mundo civilizado”.[8] Um articulista destacaria: “[Inicia-se] uma nova página da História […] O veredicto é peremptório: o mundo entra em novas e abomináveis paisagens”.[9]
Como 14 de julho de 1789, o dia 11 de setembro de 2001, à sua maneira, constituiu um marco na história do ocidente e do mundo inteiro. Com a derrubada dos edifícios que simbolizavam poderes na aparência inatingíveis, o mundo abriu os olhos para mais uma virada nas páginas de sua história.
Há vinte anos daquele dia de terror, percebemos como a história de nosso século se distancia da dos precedentes, quer pela desmesurada instabilidade em vários campos que o caracteriza, quer pela insanidade de tantas figuras de destaque cujas atitudes insanas talvez não encontrassem lugar sequer no conturbado, não tão remoto, século XX.
É de se perguntar se alguns acontecimentos desta “nova era”, deste novo século que teve o maior atentado terrorista da história por pórtico de entrada, não são tão inusitados quanto seria a um francês do século XVIII o degolamento de seu rei.
Por João Paulo Bueno
[1] DANIEL-ROPS, Henri. História da Igreja de Cristo. A Igreja da Renascença e da Reforma. São Paulo: Quadrante, 1996, v.I, p.104.
[2] Idem, ibidem
[3] Cf. GAXOTTE, Pierre. A Revolução Francesa. Porto: Tavares Martins, 1945, p.92-93.
[4] Idem, p.94
[5] Idem, ibidem
[6] JOÃO PAULO II. Audiência geral, 12/9/2001.
[7] Cf. EDITORIAL. Um país em estado de choque. In: O Estado de São Paulo. Ano CXXII, N.39411 (12 set., 2001), p. A-1; A-4.
[8] Cf. MUNDO CONDENA E PEDE UNIÃO CONTRA O TERROR. In: O Estado de São Paulo, op. cit., p. A-14.
[9] LAPOUGE, Gilles. Violência, sem precedentes, abala a história. In: O Estado de São Paulo, op. cit., p.A-11.
Fonte: https://gaudiumpress.org/
Nenhum comentário:
Postar um comentário