Foto: Canção Nova |
A piedade cristã, impulsionada pela ação do Espírito Santo, construiu ao longo dos séculos variadas formas de devoção à Santa Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. Com a Sua morte dolorosa na Cruz, Cristo expressou o Seu infinito amor por nós e indicou-nos o caminho para alcançar a vida plena e, por isso, quando contemplamos Cristo na Cruz, nós podemos afirmar: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos”. (Mc 10,45).
A Cruz de Jesus é um sinal poderoso de esperança e de vida plena. A Cruz, com seus dois madeiros, ensina-nos quem somos e qual é a nossa dignidade, o nosso valor. A Cruz é o símbolo da nossa reconciliação com Deus, conosco mesmos e com o nosso próximo, e evidencia as sombras do mal e do pecado da humanidade e extravasa as luzes do infinito amor de Jesus, pois “Ele foi trespassado por causa das nossas transgressões, esmagado em virtude de nossas iniquidades. O castigo que havia de trazer-nos a paz caiu sobre Ele, sim, por Suas feridas fomos curados”. (Is 53,5).
Na Idade Antiga, em pleno Império Romano, a cruz era um instrumento infame, humilhante e terrível de tortura e morte, que era utilizado com os réus que eram julgados culpados de crimes hediondos. No decorrer dos primeiros séculos, graças à Paixão, morte e ressurreição de Jesus, a Cruz deixou de ser vista como um símbolo de condenação e passou a ser contemplada como um símbolo do amor de Deus, um instrumento de vida e de salvação.
Nos primeiros anos do Cristianismo, Helena, mãe do imperador Constantino, fez o possível para conservar os locais onde Cristo viveu o Seu ministério, principalmente o Gólgota e o Santo Sepulcro. No local onde Jesus foi crucificado foi construída a igreja do Santo Sepulcro, em 13 de setembro de 335. A festa para o povo aconteceu no dia seguinte e entrou no calendário romano-cristão. Antes do século IV, a Cruz passou despercebida aos olhos de muitos cristãos, mas não aos olhos de Pedro, André, Tiago e de tantos outros discípulos que abraçaram a morte de Cruz por amor a Cristo. Após a sua conversão, o imperador Constantino aboliu o suplício da crucificação e, desde aquele ano, a devoção à Cruz passou a ser motivada e orientada pelos pastores da Igreja.
Na Idade Média e nos demais períodos da nossa História, os cristãos passaram a perceber sempre mais que é falso um cristianismo sem Cruz. Mas também é falsa a visão de que a Cruz é um instrumento de exploração, fatalismo e alienação. Deste modo, a Cruz passou a estar sempre presente na vida da Igreja, quer na celebração da Eucaristia, quer no Batismo ou nos demais sacramentos.
O sinal da Cruz passou a ser um sinal indicativo do Cristianismo. Com a Cruz, nós somos abençoados e abençoamos em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Com a Cruz, nós rendemos graças e louvores a Deus pela Sua presença salvadora em nosso meio e contemplamos a suave onipotência de Sua misericórdia. Com a Cruz, nós exaltamos a força renovadora do amor de Deus e proclamamos que o Cristo venceu a morte e está vivo no cotidiano de nossas vidas.
Muitos romanos que viveram na época da crucifixão de Jesus não perceberam que a Cruz não foi a derrota de Cristo, mas sim a Sua plena vitória sobre a morte, o pecado e o mal. Daquela Cruz de Jesus brotou para todos nós a suprema misericórdia de Deus, pois a vida foi renovada e a esperança restituída e, por isso, a Cruz de Cristo é a nossa única, fecunda e autêntica esperança.
Exaltamos a Santa Cruz, de um modo especial, na Sexta-Feira da Paixão, onde o centro da Liturgia é a Cruz e não o Altar. Exaltamos a Santa Cruz quando aprendemos a santificar as dificuldades e as perseguições que enfrentamos no dia a dia. Exaltamos a Santa Cruz quando rezamos pelos fiéis cristãos que continuam sendo perseguidos e mortos por causa da fidelidade a Cristo. Exaltamos a Santa Cruz quando adquirimos a consciência de que, na Cruz, Cristo “se humilhou a Si mesmo fazendo-se obediente até à morte e morte de cruz”. (Fl 2, 8).
Quando somos dóceis ao Espírito Santo, nós adquirimos a consciência de que a nossa dignidade de filhos de Deus foi restituída pelo sacrifício e pela morte de Cristo na Cruz. Mesmo que não seja entendida ou aceita pelos relativistas e os niilistas do nosso tempo, a Cruz é a símbolo da nossa salvação, “a árvore da vida”, pois, ao abraçá-la, o nosso Redentor tomou sobre Si o peso de todas as injustiças e as dores de todos os sofrimentos humanos. Desse modo, “a Cruz não é uma mobília da casa ou um ornamento a ser usado, mas um chamado ao amor com que Jesus se sacrificou para salvar a humanidade do mal e do pecado”. (Papa Francisco, Ângelus, em 12 de março de 2017).
Na Cruz, Cristo aceitou a situação mais dolorosa e humilhante que pudesse existir para nos resgatar, salvar e capacitar para o Amor. Por amor, a Virgem Maria, a Nossa Senhora das dores, permaneceu de pé, firme e constante aos pés da Cruz para, de alguma forma, compartilhar o amor salvífico de Cristo em prol de nossa libertação. Peçamos a Ela o dom da fidelidade a Deus e à Igreja e a visão sobrenatural da fé, para que possamos vislumbrar na Cruz o Sangue redentor de Cristo que continua gerando vida e salvação no terreno fértil da Igreja.
Aloísio Parreiras
(Escritor e membro do Movimento de Emaús)
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