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Voltar às fontes de seu chamado desde o batismo para
viver sua vocação sacerdotal de “viver e amar como Jesus viveu e amou” para ser
sinal da salvação.
Padre Guanair da Silva Santos
Caros amigos e leitores!
O Simpósio Internacional “para
uma teologia fundamental do sacerdócio” com certeza foi aguardado e esperado
por muitos ministros ordenados neste tempo de mudança de época com os desafios
do contexto atual. Neste período, vivemos grandes desafios e questionamentos
diversos de diversos setores da sociedade, a respeito do celibato, de abusos
sexuais e de poder. O Cardeal Marc Ouellet, Prefeito da Congregação para os
Bispos, nos convoca a refletir e aprofundar o tema. "O que se pode esperar
de uma 'teologia fundamental do sacerdócio' no contexto histórico atual,
dominado pelo drama dos abusos sexuais perpetrados pelos clérigos? Não
deveríamos nos abster de falar do sacerdócio quando os pecados e crimes de
ministros indignos estão nas primeiras páginas da imprensa internacional, seja
por trair seu compromisso ou por encobrir vergonhosamente os perpetradores de
tal depravação? Não deveríamos ficar em silêncio, arrepender-nos e procurar as
causas de tais delitos? ".
Creio que este Simpósio é um
sopro do Espírito que nos leva e escutar a realidade ou realidades dos
sacerdotes hoje na perspectiva de uma “Igreja sinodal” e assim, como discípulos
do Divino Mestre “nos coloquemos à escuta do Espírito Santo que, como o vento,
«sopra onde quer; ouves o seu ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde
vai» (Jo 3, 8), permanecendo abertos às surpresas para as quais
certamente nos predisporá ao longo do caminho. Creio também, que o Simpósio
tenha despertado em muitos sacerdotes, assim como eu, uma alegria, uma
expectativa, uma luz diante do cenário da vida e missão do sacerdote. Um voltar
às fontes de seu chamado desde o batismo para viver sua vocação sacerdotal de
“viver e amar como Jesus viveu e amou” para ser sinal da salvação, motivos
pelos quais não devemos nos abster de discutir e aprofundar o tema.
É nossa missão enquanto
ministros ordenados prestar atenção aos sinais dos tempos. Em seu discurso de
abertura do Simpósio o Papa Francisco nos leva a perceber que: “O tempo que
estamos vivendo requer, de nós, que não ignoremos a mudança, mas, ao contrário,
nos abramos a ela com a consciência de estarmos perante uma mudança epocal (já
o disse noutras ocasiões). E, se ainda tínhamos dúvidas, a covid tornou isto
mais do que evidente: de fato, a sua irrupção é muito mais que uma questão de
saúde, muito mais do que uma constipação. A mudança apresenta-nos sempre
diferentes modos de a enfrentar. O problema é que, se muitas ações e atitudes
podem ser úteis e boas, nem todas elas têm sabor de Evangelho. Aqui está o nó
que devemos discernir: a mudança e a ação têm sabor de Evangelho ou não?”.
Deste modo, as palavras do
Cardeal Ouellet e do Papa Francisco, são encorajadoras, desperta nossos ouvidos
como de um discípulo para seguir o caminho com Jesus na missão de evangelizar,
pois Ele mesmo disse: “eis que estarei convosco até o fim dos tempos” (Mt.
28,20). Assim sendo, nós sacerdotes, somos os pastores do povo de Deus.
Atendemos ao chamado de Deus, onde a Igreja é uma continuação no tempo da obra
de Cristo, que o evangelista Marcos indica com as seguintes palavras: «Jesus
subiu a um monte e chamou os que Ele quis. E foram ter com Ele. Elegeu doze
para andarem com Ele e para os enviar a pregar, com o poder de expulsar
demônios» (Mc 3, 13-15). Recordando-nos que o chamado é de Deus
para servir ao povo de Deus. São João Paulo II, na Pastore Dabo vobis
afirmou: “Dar-vos-ei pastores segundo o Meu coração” (Jer 3,
15). Certamente, há uma fisionomia essencial do sacerdote que não muda: o padre
de amanhã, não menos que o de hoje, deverá assemelhar-se a Cristo. Quando vivia
sobre a terra, Jesus ofereceu em Si mesmo o rosto definitivo do presbítero,
realizando um sacerdócio ministerial do qual os apóstolos foram os primeiros a
serem investidos; aquele é destinado a perdurar, a reproduzir-se
incessantemente em todos os períodos da história (João Paulo II, 1992).
Assemelhar-se a Cristo é nossa
identidade e, como toda e qualquer identidade cristã, encontra na Santíssima
Trindade a sua própria fonte, que se revela e autocomunica aos homens em
Cristo, constituindo nele e por meio do Espírito a Igreja como "gérmen e
início do Reino". Não ignoramos as dificuldades pelas quais passamos e
vivemos. Não são poucas nem pequenas. Mas, para vencê-las, está a nossa
esperança, a nossa fé no indefectível amor de Cristo, a nossa certeza da
insubstituibilidade do ministério sacerdotal na vida da Igreja e do mundo, já
nos dizia São João Paulo II (João Paulo II, 1992).
Neste simpósio o Papa
Francisco nos propôs a refletir a partir de quatro pilares. Com uma lucidez nos
propõe um caminho para revisão cotidiana de nossa identidade e missão. Mas, é
preciso levar em conta que as palavras do Papa Francisco se dirigem a todos os
“ministros ordenados” – padres e bispos – para uma profunda e séria reflexão
acerca de sua presença e testemunho na Igreja e no mundo. Neste contexto São
João Paulo II preocupado com as dificuldades e os desafios que já se
anunciavam, chamou todos os ministros ordenados a fortalecer sua relação com
Jesus Cristo e, “n'Ele, com a Sua Igreja que se situa intrinsicamente no
próprio ser do presbítero, em virtude da sua consagração/unção
sacramental, e no seu agir, isto é, na sua missão ou ministério”
(João Paulo II, 1992). Afirma ainda, “em particular, "o sacerdote Ministro
é servo de Cristo presente na Igreja mistério, comunhão e missão. Pelo fato de
participar da 'unção' e da 'missão' de Cristo, ele pode prolongar na Igreja a
sua oração, a sua palavra, o seu sacrifício e a sua ação salvífica. É,
portanto, servidor da Igreja mistério porque atua os sinais
eclesiais e sacramentais da presença de Cristo ressuscitado. É servidor
da Igreja comunhão porque - unido ao Bispo e em estreita relação com o
presbitério - constrói a unidade da comunidade eclesial na harmonia das
diferentes vocações, carismas e serviços. É finalmente servidor da
Igreja missão porque faz com que a comunidade se torne anunciadora e
testemunha do Evangelho" (João Paulo II, 1992).
Eu tenho em mente as palavras
de um padre idoso, moramos e residimos juntos por seis anos de ministério
sacerdotal, que acompanhava toda semana a informações da Santa Sé, leitor
assíduo do Observatório Romano. Quando a lia e, chegando na sessão das
nomeações episcopais ele repetia: “o bispo tem que ser amigo dos padres, tem
que amar os padres, um homem de oração e temente a Deus”, e fazia sempre a
pergunta: “será que os escolhidos exercerão sua missão à luz do mandato de
Jesus?” Com ele, tive uma melhor compreensão do significado de estar a “serviço
segundo o Evangelho”, que é dar de si, esvaziar-se, para escutar o sacerdote,
conhecer sua história, sua experiência fundamental que originou sua vocação
ministerial, para ser sinal de salvação.
O Bispo é um pai que vive para
os seus filhos e que se faz tudo com a Igreja e com os seus sacerdotes,
prodigalizando-se para formar as consciências e para os fazer crescer na fé
(João Paulo II, 1992). Hoje, encontramos muitos bispos que exercem a
paternidade episcopal. A vivência de seu ministério é para “confirmar os irmãos
na fé”. Com estes não há problemas no exercício da obediência compreendida como
testemunho evangélico. Entretanto, temos encontrado bispos que mais se parecem
um vigilante de escola, um vigiador, e não um pai, que deveria proporcionar a
proximidade. Para o Papa Francisco, o bispo deve exercer e favorecer a
proximidade para com os padres em geral e não somente aproximar os ambiciosos.
O bispo, seja ele quem for, permanece para cada presbítero e cada Igreja
particular uma ligação que ajuda a discernir a vontade de Deus. Mas não devemos
esquecer que o próprio bispo só pode ser instrumento deste discernimento se
também ele se colocar à escuta da realidade dos seus sacerdotes e do povo santo
de Deus que lhe está confiado.
Em uma “Igreja em saída”, a
sinodalidade nos convoca a seguir o caminho de Cristo a fim de comunicar aos
homens os frutos da salvação; é necessário termos a coragem, o entusiasmo.
Apesar das dificuldades que nos cercam – clericalismo, abuso de poder e sexuais
– é preciso seguir, como os pastores seguiram a Estrela de Belém, não
desaminar, continuar o caminho com Cristo e com Ele e impulsionados pelo Espírito
Santo, propor a conversão do coração aos errantes e pedir perdão aos ofendidos.
A realidade apresenta um quadro desafiador à vida e missão do sacerdote e, que
neste caminho sinodal o simpósio nos ajuda a ver:
- Sacerdotes vivendo em
situação de abandono;
- Sacerdotes sofrendo racismo
e preconceito por ser negro;
- Sacerdotes tratados
como “empregados” e não “servidores”;
- Sacerdotes vivendo a
solidão;
- Bispo sem paternidade
episcopal;
Meu desejo e esperança está na
confiança de que é o Espírito Santo conduz os caminhos da história e os
destinos da Igreja. As dores e sofrimentos que vivemos e passamos, colocamo-los
junto a cruz de Cristo que é nossa glória e libertação. Na cruz Cristo venceu a
morte, venceu o inimigo. A cruz nos ensina que o caminho a ser trilhado por
todos é a conversão. Tomar a cruz e seguir a Jesus é o que nos diz Marcos, o
evangelista Mc 8,27-9,1. A cruz é a consequência do compromisso livremente
assumido por Jesus de revelar a Boa Nova de que Deus é Pai e que, portanto,
todos devem livremente ser aceitos e tratados como irmãos. O meu sonho, o meu
pedido é cuidemos todos nós uns dos outros. Um clero doentio, hoje, vai
resultar em um episcopado doentio, amanhã. Rezemos por todos os sacerdotes com
carinho e amor. Prova de amor maior não há que doar a vida pelo irmão.
Pe. Guanair da Silva Santos
Pároco da Paróquia São Vicente
de Paulo/ Coronel Pacheco- Brasil
Secretário do Instituto
Mariama (IMA) – Associação de Bispos, presbíteros e diáconos negros do Brasil.
peguanair@hotmail.com
Bibliografia
- Francisco, P. (18 de 02 de
2022). Discurso do Papa Francisco no Simósio Internacional "para uma
teologia fundamental do sacerdócio". Fonte: vatican.va:
https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2022/february/documents/20220217-simposio-teologia-sacerdozio.html
- II, P. J. (25 de 03 de
1992). Exortação Apostólica pós-sinodal pastores-dabo-vobis. Fonte: vatican.va:
https://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/apost_exhortations/documents/hf_jp-ii_exh_25031992_pastores-dabo-vobis.html
- Ouellet, M. A. (18 de 02 de
2022). Oellet: redescobrir o horizonte sacerdotal obscurecido por abusos. .
Fonte: Vatican News:
https://press.vatican.va/content/salastampa/it/bollettino/pubblico/2021/09/07/0540/01156.html#PORTOGHESEOK
- Sé, S. (07 de 09 de 2021). Documento Preparatório da
XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos. Fonte:
Press.vatican.va:
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