O Patriarca ortodoxo Kirill em celebração na Catedral de Cristo Salvador em Moscou, em 27 de fevereiro de 2022 |
Diante da campanha militar lançada pela Rússia em
território ucraniano e dos cenários trágicos e imprevisíveis da guerra, as
palavras e os apelos expressos pelos Patriarcas e representantes oficiais de
várias Igrejas Ortodoxas também tentam orientar as comunidades que se deparam
com uma inevitável e dolorosa desorientação espiritual.
“As guerras são uma derrota
para todas as partes envolvidas. O único a gozar é o diabo, que já dança sobre
as cabeças dos cadáveres e brinca com a dor das viúvas, dos órfãos e das mães
enlutadas”.
Com estas palavras, o bispo
copta ortodoxo à frente da diocese que inclui a parte central do Cairo, Anba
Raphael, captou a raiz da inquietação que abala os líderes e todas as
comunidades das Igrejas Orientais diante do conflito em curso na Ucrânia.
Nos últimos anos, o presidente
russo Vladimir Putin, pretendia creditar sua imagem como defensor das
comunidades cristãs locais também no Oriente Médio. Também por isso assume
importância a perplexidade unânime expressada pelos Patriarcas e expoentes das
Igrejas Orientais diante de uma campanha militar envolvendo povos irmãos,
intimamente marcados em sua identidade espiritual pelo cristianismo de tradição
bizantina oriental.
Nos últimos anos, as
lacerações mais graves no cristianismo ortodoxo tiveram a Ucrânia como
epicentro. O embate que levou à cisão entre o Patriarcado Ecumênico de
Constantinopla e o Patriarcado de Moscou caracterizou-se desde o início por sua
conexão com conflitos fomentados por sentimentos nacionalistas e desígnios de
ordem geopolítica.
O conflito entre a Igreja de
Constantinopla e a Igreja de Moscou assumiu formas e tons cada vez mais sérios
depois que o Patriarcado Ecumênico de Constantinopla concedeu o chamado "Tomos de
autocefalia" à Igreja Ortodoxa Ucraniana em 6 de janeiro de
2018, legitimando do ponto de vista canônico o nascimento de uma estrutura
eclesial ucraniana totalmente desvinculada de qualquer vínculo hierárquico de
sujeição ao Patriarcado de Moscou.
Agora, diante da campanha
militar lançada pela Rússia em território ucraniano e dos cenários trágicos e
imprevisíveis da guerra, as palavras e os apelos expressos pelos Patriarcas e
representantes oficiais de várias Igrejas Ortodoxas também tentam orientar as
comunidades que se deparam com uma inevitável e dolorosa desorientação
espiritual.
O Primaz da Igreja Ortodoxa
autocéfala da Geórgia, Patriarca Ilya II, reza pelo povo ucraniano.
"Sabemos, com base na amarga experiência da Geórgia, o quão importante é a
integridade territorial de cada país" acrescentou o Patriarca da nação
onde em 2008 as forças armadas russas intervieram com a justificativa de proteger
as prerrogativas de autonomia das regiões da Ossétia e da Abecásia.
Já o Patriarca Daniel, Primaz
da Igreja Ortodoxa da Romênia, em suas declarações relançadas pela mídia
declarou que havia "tomado conhecimento" da campanha militar
desencadeada pela Rússia contra "um Estado independente e soberano",
fazendo votos que as diplomacias encontrem em breve uma maneira de reativar
canais de diálogo para afastar o espectro da guerra da Ucrânia e de toda a
Europa.
O Patriarca Ecumênico de
Constantinopla Bartolomeu I, primus inter pares entre os
Primazes das Igrejas Ortodoxas, em mensagem divulgada na quinta-feira, 24 de
fevereiro, expressou seu "profundo pesar" pelo que definiu como um
ato de clara violação de qualquer noção de legitimidade. Bartolomeu também
expressou apoio ao povo ucraniano e sua intenção de defender a integridade de
sua pátria.
"Devemos rezar -
acrescentou o Patriarca de Constantinopla - para que nosso Deus, o Deus do amor
e da paz, ilumine a liderança da Federação Russa, para que possa reconhecer as
consequências trágicas de suas decisões e ações, como desencadear até uma
guerra mundial”.
Sentimentos análogos de
proximidade espiritual com o povo ucraniano foram expressos pelo arcebispo
Ieronymos de Atenas, líder da Igreja Ortodoxa Grega.
O próprio Metropolita Onofry,
à frente da Igreja Ortodoxa Ucraniana - que permaneceu ligado ao Patriarcado de
Moscou -, publicou uma mensagem inicial contra a campanha militar lançada pela
Rússia em território ucraniano, definida como "invasão", mensagem
agora retirada do site oficial desta Igreja.
Até agora, o Patriarca de
Moscou e de todas as Rússias, Kirill, divulgou uma mensagem em 24 de fevereiro,
na qual afirma compartilhar "com profunda e sentida dor" o sofrimento
causado pelos "eventos em andamento".
Na mensagem, o líder da Igreja
Ortodoxa Russa não entra no mérito das razões e responsabilidades do conflito.
Kirill fala como Primaz "de uma Igreja cujo rebanho está na Rússia,
Ucrânia e outros países", expressando proximidade com "todos os que
foram afetados por esta tragédia". O Patriarca convida as partes em
conflito a evitarem baixas civis" e recorda que os povos russo e ucraniano
têm uma história comum de séculos, que remonta ao Batismo da Rus' pelo príncipe
St. Vladimir.
"Acredito que esta
afinidade dada por Deus ajudará a superar as divisões e desacordos que levaram
ao conflito atual", acrescentou o Primaz da Igreja Ortodoxa Russa,
convidando todos a prestarem toda ajuda às populações que sofrerão o conflito
na carne das próprias vidas.”
*Com Agência Fides
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