Vatican News |
A Igreja está em processo de sinodalidade em vista do
sínodo que ocorrerá em Roma, no mês de outubro de 2023. O Papa Francisco está
convocando a todos para entrar neste processo de vida e de conversão para que a
Igreja siga o caminho da comunhão, da participação e da missão.
Estamos ainda no período de coleta de dados, de respostas
às perguntas enviadas para as comunidades, pastorais, movimentos, serviços,
paróquias, e também em nível diocesano, de estrutura para que todos vivam a
importância do processo como um dom do Senhor que é o sínodo. A sinodalidade dá
uma conotação de uma Igreja peregrina, imagem do povo de Deus em missão para
corresponder ao chamado do Senhor de ir para todas as nações, tornando-as
discípulas em nome de Deus Uno e Trino (Mt 28, 19). A encarnação de Jesus
prolonga o caminho sinodal da Igreja1.
A sinodalidade é vivida como carisma, dom de Deus porque
é sempre o Senhor a conceder às coisas para a nossa vida de cristãos, católicos
e católicas e é também responsabilidade humana no sentido de que nós
colaboremos com o Senhor, pela luz do Espírito de Deus que ilumina as pessoas
para pensar e agir conforme o seu plano de amor. Veremos a seguir alguns pontos
fundamentais para a nossa sinodalidade, sobretudo na Igreja dos primeiros
séculos.
Os sínodos na Igreja antiga.
A Igreja antiga realizou diversos sínodos, que eram
expressão da caminhada em conjunto, reuniões que se entrelaçava muitas vezes,
com os concílios. Neste período inicial não havia muita diferença entre Sínodo
e Concílio. Estas instituições foram assumidas pela Igreja pela necessidade
advertida, desde os primeiros tempos da Igreja, pelos responsáveis das
comunidades cristãs, de caminhar juntos sobre questões referentes à fé, a
caridade e à disciplina2.
A partir do século II os bispos da Ásia buscavam
consultas, em relação ao montanísmo, quando o Papa Victor governou a Igreja, de
modo que os responsáveis das Igrejas também se reuniram no Ponto, na Palestina,
na Síria para deliberarem sobre a data da Páscoa. Pela metade do século III, o
concílio já era uma instituição estável a nível regional3.
A paz assumida por Constantino.
A paz de Constantino com Licínio, em 313 em Milão,
possibilitou uma nova forma para a realização dos concílios e dos sínodos, pois
se fixaram as estruturas metropolitanas e patriarcais que darão força aos
concílios, sínodos provinciais e gerais. Em 324 o Imperador Constantino
convocou em Arles, na Província da Gália, hoje França, os bispos para debater a
questão do donatismo que estava reinando de uma forma muito forte no Norte
africano, dividindo as Igrejas ligadas a Roma e aquelas na África4.
O Concílio de Nicéia.
A questão ariana surgida no início do século IV a qual
negava a divindade do Verbo na sua preexistência, apressou um Concilio geral,
ecumênico para todo o mundo cristão, sobretudo do Oriente, mas também teve a
participação do Ocidente. O Imperador Constantino percebeu que a doutrina
ariana dividia as Igrejas, as suas lideranças, de modo que ele convocou em
Nicéia5, em 325 um grande concilio com expressiva participação de 300 bispos,
hoje é na Turquia. Neste Concilio foi condenada a doutrina ariana, e se
reafirmou que Jesus é Filho de Deus, desde sempre, que é Deus como o Pai é Deus
e o Espírito Santo. A sua geração é eterna, é consubstancial ao Pai, de modo
que se eliminou toda doutrina ariana e valorizou-se a unidade eterna do Filho
com o Pai.
A sinodalidade ocorreu como dom de Deus em vista da
defesa do Senhor Jesus como Filho de Deus desde toda a eternidade, na fé que
era presente desde o início do cristianismo, mas que o presbítero Ário
distorcia, colocando o Senhor ao lado das criaturas do Pai. A sinodalidade
também foi responsabilidade humana porque o Concilio de Nicéia teve presente
que Jesus é Deus, está no lado do Criador, e como o Pai é Deus e o Espírito
Santo é Deus. O Senhor Jesus está na esfera da Santíssima Trindade, Deus Uno e
Trino. A sinodalidade é a inspiração do Espírito Santo para que todos acreditem
em Cristo e vivam bem no cotidiano de suas existências.
Práticas fundamentais da Tradição.
Santo Agostinho, bispo de Hipona dos séculos IV e V,
afirmou em seu tempo práticas da tradição como formas de sinodalidade, pontos
aceitos por todos de modo que essas tornarem-se dons de Deus e de
responsabilidade humana. A fé em Cristo Jesus, morto e ressuscitado estabeleceu
vínculos da aliança com o novo povo de Deus, pela diversidade de sacramentos,
assim como o era pelo batismo realizado em nome da Santíssima Trindade, a
comunhão de seu corpo e sangue, portanto a realização da eucaristia e todos os
outros meios provenientes da Sagrada Escritura. Existiam também prescrições não
escritas, mas que eram observadas pela tradição em todo o mundo, pois essas
foram recomendadas pelos mesmos Apóstolos ou pelos Concílios gerais, na qual a
autoridade era percebida como instrumento da salvação da Igreja, como por
exemplo, a celebração da Paixão, Ressurreição e Ascensão do Senhor,
Pentecostes, a descida do Espírito Santo e outras festas que se viviam na
Igreja católica em toda parte onde ela se difundiu6.
O valor da sinodalidade pela tradição não escrita.
Tertuliano, padre dos séculos II e III, no Norte da
África, disse que o batismo tinha a sua conotação sinodal, por realizarem-se
ritos e orações na unidade, transmitidos desde o início pelas igrejas. Quando
os catecúmenos entravam na água, mas antes na Igreja, sob as mãos do bispo eles
declaravam em renunciar ao diabo, ao seu poder e aos seus anjos. Em seguida os
catecúmenos eram imersos por três vezes, dando respostas que o Senhor
prescreveu no Evangelho, a fé na Santíssima Trindade. Em relação ao sacramento
da eucaristia, que o Senhor colocou a todos eles, no tempo da ceia, os cristãos
eram acolhidos nas reuniões da comunidade na madrugada e a recebiam na mão de
quem presidia a assembléia, o bispo, em geral ou ao sacerdote7.
Tertuliano também disse que na comunidade eram lembrados
o nome dos mortos, o aniversário dos seus dias natalícios, a entrada na vida
imortal com Deus e também se dava uma recordação aos mártires dos quais os
fieis faziam memória. As pessoas eram muito atentas para que não caísse nada na
terra alguma coisa do cálice ou do pão consagrados. Em cada passo, em cada
movimento, quando entravam ou saiam da comunidade, quando acendiam as luzes ou
os fiéis se sentavam à mesa, ou na família, na cama, em qualquer atividade,
imprimiam, aplicavam sobre a fronte, o pequeno sinal da cruz8. Assim segundo
Tertuliano, o sinal da cruz veio da tradição não escrita, revelando-se um gesto
sinodal, onde as pessoas faziam de uma forma importante o sinal da cruz sobre
si mesmos, invocando o nome das Pessoas da Santíssima Trindade.
O valor da sinodalidade: a tradição não escrita.
O Padre africano também afirmou que a observância de uma
tradição não escrita justificava-se, pois era confirmada pelos costumes, pela
caminhada em conjunto da Igreja dos seus pastores e o povo de Deus, porque este
testemunho idôneo, fundado sobre a observância constante, do evangelho do
Senhor e pela vida da Igreja, era de uma tradição aprovada. As práticas que se
adequavam para Deus levavam à retidão e serviam à salvação 9.
A sinodalidade e missão.
Um dos itens do Sínodo de 2023 é a missão. São Gregório
Magno, Papa nos séculos VI e VII tinha presente o valor da missão para uma
caminhada de Igreja sinodal. Ele aconselhou ao Bispo Agostinho, que fora
enviado pelo Papa à terra dos Anglos para que não destruísse os templos dos
ídolos, mas que se eliminassem as imagens idolátricas encontradas naqueles
templos. As pessoas construíam altares e lá se colocavam as relíquias e os fiéis
eram conduzidos a adorar o Deus verdadeiro e assim todos acorriam com maior
confiança aos lugares onde o povo costumava freqüentar nas suas celebrações,
somente que agora tinham a conotação cristã10.
A caminhada em conjunto nas igrejas primitivas levavam as pessoas a valorizar a unidade em Deus, à missão de conduzir as pessoas a Cristo e pela luz do Espírito Santo vivia-se a dedicação da missão, feita por ministros, mas também por leigos e leigas a serviço da evangelização. A sinodalidade é dom de Deus porque ela leva à unidade, à comunhão, a participação do povo de Deus, os seus ministros e a missão onde o Senhor Deus é louvado e amado pelas pessoas, famílias, comunidades e sociedade. Ela é também responsabilidade humana, porque a Igreja, os fiéis caminham na unidade para testemunhar para as pessoas a importância do amor a Deus, ao próximo como a si mesmo.
Fonte: https://www.cnbb.org.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário