Audiência com o Papa Francisco | Vatican News |
‘Arrisca, meu irmão, se você não arriscar, já está
errando’. Essa foi uma das indicações do Papa ao desabafo de um dos 17 bispos
que foram recebidos nesta segunda-feira (20), no Vaticano. A delegação,
representando o Regional Norte 1 da CNBB (Estados do Amazonas e Roraima) e o
Noroeste (Acre, sul do Amazonas e Rondônia), deu de presente ao Papa um cocar e
um quadro-denúncia intitulado "SOS Yanomami", pintado ainda no ano de
1989 por um artista indígena local.
Silvonei José, Bianca
Fraccalvieri e Andressa Collet - Vatican News
Mitra ou cocar? Não poderia
haver um presente mais característico para o Papa Francisco dos bispos vindos
da Amazônia in visita ad Limina no Vaticano, mais especificamente dos
representantes do Regional Norte 1 da CNBB (Estados do Amazonas e Roraima) e do
Noroeste (Acre, sul do Amazonas e Rondônia). Os 17 bispos foram recebidos
na manhã desta segunda-feira (20).
Para o arcebispo de
Porto Velho, em Rondônia, dom Roque Paloschi, foi um encontro de comunhão,
esperança e coragem. "De comunhão porque ele acolheu tudo aquilo que nós
trouxemos da realidade de nossas igrejas na Amazônia. De esperança, porque ele
nos motivou a vivermos a nossa missão de pastores e não burocratas, de não
perdermos este foco. E de coragem, para estar junto com as populações mais
pobres e, sobretudo, que a Igreja saiba respeitar as culturas, o desafio da
encarnação":
“Diante desse desafio que
temos hoje, da escassez de clero, das dificuldades econômicas, a questão da
situação desesperadora do desrespeito dos primeiros habitantes das terras de
Santa Cruz que moram lá, ele (o Papa) usou a expressão ‘arrisca, meu irmão, se
você não arriscar, já está errando’. Quer dizer, nós não temos que ter medo
para também nos lançarmos nos novos desafios, vivendo sobretudo a fidelidade
aos pobres. [...] Ele também nos pediu para sermos pastores, não burocratas;
pastores com cheiro de ovelha e a cercania com o povo.”
Para mons. Lúcio
Nicoletto, administrador diocesano de Roraima, Francisco encorajou os
bispos a atuarem "sem medo de encarar os desafios que nos apresenta o
momento atual, que precisa de uma palavra profética para anunciar a esperança
do Evangelho da vida, mas também denunciar tudo aquilo que pisoteia os direitos
fundamentais das populações indígenas e do cuidado com a casa comum".
Dom Roque e mons. Lúcio | Vatican News |
O olhar do Papa
para a Amazônia
Através desse encontro humano
e fraterno, com os bispos sendo incentivados à proximidade diária "com os
últimos e sem medo de arriscar", dom Roque contou que o Papa voltou a
falar da Conferência de Aparecida de 2007, que reuniu o episcopado latino-americano
e do Caribe, e de como ficou "intrigado" de como se falava tanto
sobre a questão da ecologia na época. Além dos bispos da Amazônia, o arcebispo
de Porto Velho comentou que a Laudato si' ajudou o Pontífice a dar esse passo
em direção à importância do tema, como o próprio Sínodo dos Bispos para a
Amazônia em 2019 e a exortação apostólica pós-sinodal de 2020
"Querida Amazonia":
"A 'Querida Amazonia' é
esse abraço de ternura e de carinho que ele assumiu não só para a questão dos
biomas amazônicos, mas o cuidado e - eu até usei essa expressão com ele - do
Jardim de Deus, da casa comum, e a preocupação com as gerações vindouras.
Então, o Papa demostrou, assim, esse empenho e essa clareza de que nós não
podemos abrir mão daquilo que é a nossa missão de cuidar desse Jardim, que
foi confiado a nós, mas não só para nós, para todas gerações. E reforçou por
três vezes a importância de nós aprendermos cotidianamente também com os povos
originários, com os povos indígenas, essa relação harmoniosa e respeitosa com a
criação. E, sobretudo, nos pediu a coragem e a ousadia de não ter medo de dar
passos também no sentido de viver uma fé que seja encarnada nesta realidade
onde se está: não querer voltar ao esquema da colonização, mas, pelo
contrário, entrar e mergulhar nas culturas. Isso foi muito bonito!"
O quadro
"SOS Yanomami" dado ao Papa
Segundo mons. Lúcio, a
audiência com o Papa foi para reabastecer o coração após tantos desafios numa
missão que é muito exigente: o Pontífice parecia "estar no esperando
para nos encorajar e nos acolher e, pela primeira vez, nada de puxão de
orelha", brincou ele. Em nome do povo de Roraima, o Monsenhor presenteou o
Papa com um quadro produzido em 1989 por um artista local, o indígena Cardoso,
que por muitos anos pintou o sofrimento e a esperança do povo amazônico. O
título da obra dada a Francisco é emblemático "SOS Yanomami",
uma das maiores etnias da Amazônia, que na época servia de denúncia ao
sofrimento dos povos nativos daquela região por causa dos "direitos
pisoteados e de questões como o extrativismo, o desmatamento, a falta de
preservação ambiental e a falta de respeito para com a populações".
"Hoje, depois de 33 anos,
esse quadro continua terrivelmente atual. Porque continua denunciando a falta
de respeito que nós deveríamos ter, de maneira especial, a parte pública, para
com as populações nativas que são para nós motivo para a gente rever inclusive
o nosso estilo de vida. O Papa Francisco, então, conclama a todos a rever a
nossa maneira de viver a partir de uma cultura que respeite a casa comum."
O Papa também ganhou um cocar da delegação da Amazônia |
"Quero
viver minha missão até Deus permitir"
Ao ser questionado por
Silvonei José sobre como está a saúde do Papa, para quem de perto pode
conferir, o arcebispo de Porto Velho confirmou que Francisco "manifestou
que tem muitos desafios, mas que não passa pela cabeça isso que tá saindo na
imprensa (de renunciar): ‘eu quero viver a minha missão até que Deus me
permitir', disse ele. E pronto". Monsenhor Lucio reforçou o pensamento de
dom Roque, dizendo que viu o Papa dentro da sua fragilidade, mas "também
com uma força muito grande e que traz para nós uma grande força! Às vezes até a
gente tem vergonha na cara por ficar aí se queixando de tanta coisa, e olha o
Papa como é que ele está com aquela animação toda!". E dom Roque
finalizou:
“Saio me sentindo muito contemplado desse abraço amoroso
e carinhoso do Papa Francisco com toda nossa região Amazônica.”
A visita ao Vaticano termina na próxima sexta-feira (24)
e ao longo da semana a delegação da Amazônia visita dicastérios, conselhos e
comissões do Vaticano, além de constar na programação a celebrarão da
Eucaristia nas quatro Basílicas Maiores de Roma: São Pedro, São João de Latrão,
Santa Maria Maior e São Paulo fora dos Muros.
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