Ter misericórdia com os mais pobres (AFP or licensors) |
O bispo de Cesareia, século IV, trabalhou muito com
pessoas que não tinham meios para a sobrevivência de modo que ele denunciou
situações de injustiças pelos quais muitas pessoas pobres passavam por
necessidades para terem uma vida digna.
Por Dom Vital Corbellini,
Bispo de Marabá – PA
São Basílio, bispo de
Cesareia, século IV, hoje na Turquia, foi um dos grandes defensores dos pobres.
A palavra pobre vem do latim, pauper-eris, cujo significado é o que
tem escassos meios econômicos, que tem a falta do dinheiro necessário para
viver[1].
O bispo de Cesareia trabalhou
muito com pessoas que não tinham meios para a sobrevivência de modo que ele
denunciou situações de injustiças pelos quais muitas pessoas pobres passavam
por necessidades para terem uma vida digna. Ele os encontrava nas praças, nas
ruas, nas periferias dos povoados, nos campos e nas cidades. Era preciso
realizar uma missão que ajudasse a viver melhor o cotidiano de suas
existências. Para isso ele organizou políticas, como formas de caridade, que ajudasse
os mais necessitados, através do movimento monacal, fundado por ele para que
este não se estabelecesse no deserto, como era a prática daquele tempo, para se
encontrar com Deus, com Jesus, mas ele quis que os monges estivessem nas
periferias das cidades, ajudando-os nas suas necessidades materiais e
espirituais. O encontro com o Senhor era dado nessas situações. A seguir
ver-se-á alguns pontos de sua doutrina e vida.
Misericórdia e
generosidade
Em suas regras pastorais, o
bispo insistiu junto aos seus fiéis para serem misericordiosos e generosos para
com aqueles e aquelas que não tinham os meios necessários para as suas vidas,
porque muitas vezes os pobres eram colocados sob acusação, ou seja, eram
criticados pelas pessoas que tinham o poder econômico ou político. Deste modo
ele insistia para que qualquer coisa que alguém tivesse a mais do necessário
para viver, fosse dado a eles em beneficência, segundo o preceito do Senhor,
através da pregação do Precursor, João Batista que exortava a todos aqueles que
tivessem duas túnicas, doassem as pessoas uma para quem não a tivesse e a quem
possuísse comida fizesse o mesmo, através da partilha com os mais necessitados
(Lc 3,11). A palavra de Deus também se concretizava pela exortação de São Paulo
aos Coríntios que diz que todas as coisas que a pessoa possui é dom de Deus (1
Cor 4,7)[2].
A abundância dos
bens
São Basílio dizia que as
pessoas não buscassem a superabundância dos bens na vida, nem fossem solícitas
pela opulência, mas que os fiéis se mantivessem puros diante de toda espécie de
ganância e de toda a vontade da busca pela riqueza[3]. O bispo seguiu a palavra
de Cristo no sentido de permanecer longe de toda a ganância pela riqueza,
porque a vida de um ser humano não consiste na quantidade de bens (Lc 12,15). A
vida presente não é dada só pelos bens, porque estes passam, enquanto as
relações que foram mantidas com as pessoas, com os pobres e com Deus, estas
permanecem[4]. Ele também colocou a necessidade de ser fiel a Deus, porque não
se pode servir a Deus e ao dinheiro (Mt 6,24)[5].
O trabalho
dignifica o ser humano
São Basílio também teve
presente a necessidade do trabalho para ganhar o pão de cada dia. Ele seguia
São Paulo que exortava a todos para o trabalho para assim a pessoa ir para
frente e louvar a Deus (2 Ts 3,10-12). Quem tem a possibilidade de trabalhar
ajude as pessoas mais necessitadas. No entanto quem não quisesse trabalhar não
era julgado merecedor de comer (2 Ts 3,10). Como São Paulo, o bispo afirmou que
se deve prestar socorro aos débeis e que há mais alegria em dar do quem em
receber (At 20,35). São Paulo ainda disse que as pessoas deixassem de roubar e
fizesse um trabalho honesto com as suas mãos para ter coisas para serem dadas a
quem está na necessidade (Ef 4,28)[6]. O trabalho é fundamental diante da
problemática do desemprego, do pobre que passa por necessidades, de modo que se
ele tiver algum trabalho tem condições de trazer para a sua casa alimento para
os seus familiares.
A venda dos
bens?
São Basílio afirmou as
palavras do Senhor que o seu seguimento exigia a venda dos bens, seja dado aos
pobres e a pessoa teria um tesouro nos céus e depois, seguiria a Jesus (Mt
19,21) ou mesmo aludindo à outra palavra de Jesus que diz que é para vender
tudo aquilo que a pessoa tem e seja dado em esmola (Lc 12,33). São Basílio
afirmou que a pessoa que se aproximasse ao serviço de Deus não desprezasse ou
abandonasse os bens que lhe competem. No entanto o bispo dizia que a pessoa
fizesse o possível de administrar no modo mais racional todos os bens que têm
tomado com grande diligência, como se fossem consagrados ao Senhor[7], sabendo
sempre que os bens são sempre instrumentos para melhor trabalhar para o
engrandecimento do Reino de Deus e jamais eles serão fim em si mesmo, porque
distorceriam o plano de Deus a respeito das riquezas, como criaturas, pois só
Deus é o Criador de todas elas.
Aqueles que
vivem no luxo?!
São Basílio teve uma palavra
bem clara no sentido que o luxo é um mal para ser evitado. A pessoa é chamada a
viver bem, como criatura e não no luxo, diante da situação de pobreza de
milhares de pessoas. Não há ocasião de fato que tenha algum reconhecimento que
não seja a sua condenação. O bispo disse que aqueles que vivem no luxo
desordenado e se ungem com as essências refinadas e bebem o vinho filtrado (Am
6, 6) são condenados pela Escritura. Ele tinha também presente a parábola do
pobre Lázaro e o rico epulão. Este foi privado do paraíso por causa de seu luxo
aqui na terra (Lc 16,22)[8].
São Basílio também disse que
não há como repartir as coisas para quem vive na opulência, porque o opulento
busca a si mesmo, enquanto o pobre ajuda o outro pobre. Se alguma pessoa veio
de fora e ela tem o mesmo objetivo na vida com a dos seguidores de Jesus,
reconhecerá à mesa a ele familiar, encontrando tudo aquilo que ele abandonou na
sua casa. Se ele for fatigado da viagem, as pessoas fornecerão o quanto lhe
serve para que ele se restaure da fadiga[9].
A vida do cristão segundo São
Basílio não é dada no luxo pelas coisas que passam, mas para a glória de Deus.
A palavra de São Paulo é clara no sentido de que se a pessoa coma, beba, ou
faça outra coisa, tudo seja feito para a glória de Deus (1 Cor 10,31)[10].
Aquilo que vai
além do necessário
São Basílio dizia que deveria
ter moderação na mesa sem que não se ultrapassasse os confins do necessário.
Este é o limite a quem acolhe as pessoas que iriam às casas dos fiéis, sabendo
que o abuso é o gasto que vai além do necessário. Ainda que seja o alimento de
um dia, no entanto, se estiver bom é usado para as pessoas, mesmo aqueles que
vêm de longe. O alimento, como dom de Deus não pode ser desperdiçado pelo luxo,
pois ele saciaria a fome dos famintos ou de pessoas necessitadas de
alimento[11]. O fato é que quem aprecia o luxo não vive bem porque faz
desperdício de muitas coisas possibilitando o aumento das injustiças no meio
onde as pessoas vivem.
Próximo aos
pobres
São Basílio se aproximava na
casa dos pobres também para aprender com eles a forma de viver, com pouca coisa
ou quase nada para assim servir melhor o Senhor. Ele tinha presente a palavra
de São João Batista para dar uma túnica a quem tivesse duas para alguma pessoa
que não a possuísse (Lc 3,11). O próprio Senhor disse que se a pessoa desejasse
a perfeição, ela venderia aquilo que tivesse, daria aos pobres, tendo um
tesouro no céu e em seguida o seguiria (Mt 19,21)[12].
São Basílio, bispo, seguiu o
Senhor, vivendo de uma forma pobre, sendo defensor dos mesmos diante das
injustiças que eram percebidas naquela época nas famílias, nas comunidades e na
sociedade. Ele agiu para o bem dos pobres, porque ele o fazia com amor e para
seguir a Jesus Cristo, o pobre entre os pobres. Ele amou os mais necessitados
de modo que viveu a alegria de estar com o Senhor que quer o bem de todos,
sobretudo os mais necessitados, os pobres em vista do Reino de Deus.
__________________
[1] Cfr. Pòvero.
In: Il vocabolario treccani, Il Conciso. Milano, Trento, 1998,
pg. 1241.
[2] Cfr. Regole morali
48, 1-2. In: Basilio di Cesarea. La cura Del povero e l´onore della
ricchezza. Testi dalle regole e dalla omelie, a cura di Luigi Pizzolato.
Milano, Paoline, 2013, pg. 165.
[3] Cfr. Idem 48, 4,
pg. 167.
[4] Cfr. Idem, 48,5.
Pg. 167.
[5] Cfr. Idem, 48,
5. Pg. 167.
[6] Cfr. Idem, 48,
7. Pg. 171-173.
[7] Cfr. Piccolo
Asceticon 5, 1. In: Idem, pg. 175.
[8] Cfr. Regole
Diffuse, 20, 1, pg. 187.
[9] Cfr. Ibidem,
pg. 187
[10] Cfr. Idem, 20,2, pg.
189.
[11] Cfr. Idem, 20,3,
pg. 193.
[12] Cfr. Excursus. Eraclide, Lettera CL. 3 (Ad
Anfilochio, Vescovo di Iconio), 3. Idem, pg. 205.
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