S. Paulo, apóstolo | xaverianos.org |
Podemos
dividir a vida de Paulo em quatro períodos. Cada período mostra um aspecto da
vida de Paulo. A passagem de um para o outro foi dura e dolorosa. Houve muita
ruptura e mudanças.
Com a ajuda de Deus e a
amizade dos irmãos e irmãs conseguiu superá-las, integrá-las na sua vida e
fazê-las render para a caminhada das comunidades.
OS
QUATRO PERÍODOS SÃO:
-
Do nascimento aos 28 anos de idade: o judeu observante
- Dos
28 aos 41 anos de idade: o convertido fervoroso.
-
Dos 41 aos 53 anos de idade o missionário itinerante
-
De 53 até à morte aos 62 anos de idade: o prisioneiro e o organizador das
comunidades.
I.
PAULO UM JUDEU PRATICANTE
1 –
LUGAR E AMBIENTE ONDE PAULO CRESCEU E SE CRIOU.
Não sabemos a data exata de
seu nascimento. Tudo indica que aconteceu na primeira década de nossa era.
Nasceu na cidade de Tarso de pais judeus. Pertencia à tribo de Benjamim e tinha
uma irmã (At.23,6).
Tarso era uma cidade bonita e
grande, com mais de 300.000 habitantes. Estava na beira do mar Mediterrâneo e
era um centro importante de cultura e de comércio com um porto muito ativo. Por
lá passava também uma estrada romana que unia Oriente com Ocidente.
Seus antepassados tinham vindo
da cidade palestina de Gischala, segundo S. Jerônimo, quando se deu aquele
fenômeno chamado “Diáspora”, durante a dominação grega. Em Tarso havia um
bairro judeu, como em quase todas as cidades do Império romano, cada um com sua
sinagoga e organização comunitária. Jerusalém e os judeus da Diáspora estavam intimamente
interligados. Muitos judeus iam a Jerusalém para completar sua instrução.
Nascido numa família judaica,
Paulo foi criado dentro das exigências da lei e das tradições paternas (Gl
1,14). Os judeus da Diáspora eram judeus praticantes. Sua preocupação maior era
a observância da Lei. Lutavam, portanto para serem fiéis, contra aquilo que
lhes impedia de serem autênticos: o culto ao imperador, a violação do repouso
sabático, o serviço militar... Muita vez eram perseguidos por causa disto. De
certa maneira eles eram “separados” diferentes dos outros povos.
Desde o nascimento Paulo foi
cidadão romano, mas sempre se ufanou de ser judeu e fariseu. Ele tinha
dois nomes: Saulo, o nome judaico e Paulo o nome grego. Paulo afirma em
suas cartas que seu nome é PAULO. Foi denominado assim desde o nascimento e não
somente depois de sua conversão. Este nome é usado também por Pdr. 3,15 e nos
Atos dos Apóstolos a partir de 13,9. Nos capítulos anteriores dos Atos é
chamado SAULO, que é uma helenização do hebraico “SAUL”.Em At, 13,9 encontramos
a expressão (Saulos de xai Paulos) que significa “Saulo ou Paulo”.
Paulo é forma grega de
sobrenome de família romana. Tinha este nome por ser cidadão romano (At. 26,39;
22,27; 25,10). Facilmente algum ascendente de Paulo era um escravo. Libertado
pelo dono assumiu o nome do patrão. Saulo é um nome acrescido. Tinha, então, um
nome grego e outro semítico, conforme era costume dos judeus da época. É errado
dizer que antes da conversão se chamava Paulo e depois Saulo. Também depois da
conversão, os Atos dos Apóstolos usam diversas vezes a expressão Saulo.
2 –
JUVENTUDE E FORMAÇÃO.
Como todos os meninos judeus
da época, Paulo recebeu sua formação básica na casa dos pais, na sinagoga do
bairro e na escola ligada à sinagoga. A formação básica compreendia: aprender a
ler e escrever; estudar a Lei de Deus e a história do povo; assimilar as
tradições religiosa; aprender as orações, sobretudo os salmos. O método era:
pergunta e resposta; repetir e decorar; disciplina e convivência. Além da
formação básica em Tarso, Paulo recebeu uma formação superior em Jerusalém.
Estudou aos pés de Gamaliel (At 22,3). Esses estudos tinha as seguintes
conteúdos:
- A
Lei de Deus, chamada de Torá: Compreendia os cincos primeiros livros da
Bíblia (o Pentateuco). O estudo se fazia através de leituras freqüentes,
até conhecer tudo de memória.
- A
Tradição do Antigos: atualizava a Lei de Deus para o povo. Tinha duas
partes, que eles chamavam, na língua deles Halaká e Hagadá.
A Halaká ensinava como viver
de acordo com a Lei de Deus. Compreendia os costumes e as leis complementares,
reconhecidas como tais pelas autoridades competentes. Havia a Halaká dos
fariseus, a mais estrita, e a dos saduceus. Paulo se formou na tradição dos
Fariseus (Fl 3,5; At 26,5). A Hagadá ensinava como ler a vida à luz da Lei de
Deus. Não tinha aprovação oficial da autoridade. Era mais livre. Compreendia as
histórias da Bíblia. O jeito de se lembrar a história antiga ajudava a ler sua
própria história e a descobrir nela os apelos de Deus. A Hagadá era, por assim
dizer, a interpretação da Palavra de Deus que o povo recebia nas Sinagosa. A
Interpretação mais erudita da Bíblia, era chamada Midrash. Midrash significa
busca. Ensinava as regras e o jeito de se buscar o sentido da Sagrada Escritura
para a vida do povo e das pessoas e a descobrir, pela janela do texto, o
passado do povo, e ver, como num espelho, “hoje” do mesmo povo.
A leitura da Bíblia era o eixo
da formação. Marcava a piedade do povo. “Desde criança” (2Tm 3,15), os judeus
aprendiam a Bíblia. Era sobretudo a mãe, em casa, que cuidava de transmiti-la
aos filhos (2Tm 1,5 e 3,14). Assim desde pequeno, Paulo aprendeu que “toda a
Escritura é inspirada por Deus e útil para instruir, para refutar, corrigir,
educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito, qualificado para
toda boa obra” (2Tm 3,16-17; cf. Rm 15,4; 1Cor 10,6.11).
3 –
PROFISSÃO E CLASSE SOCIAL.
Paulo era fabricante de tendas
(At 18,3) e tinha recebido esta profissão do pai. Tal aprendizado começava aos
treze anos de idade e durava dois ou três anos. O aprendiz trabalhava de sol a
sol e obedecia a uma disciplina rígida. Por ser cidadão romano de
nascimento, a família de Paulo não era pobre, com certeza, pois a cidadania se
obtinha com muito dinheiro (At 22,28). Disto alguém concluiu que o pai de Paulo
era o dono de uma oficina com empregados. É possível, então, que Paulo tenha
apreendido o ofício não tanto para ter um meio de viver, mas para poder, um
dia, administrar a oficina do pai. Como ‘cidadão” era membro oficial da “polis”
(cidade) e podia participar da assembléia do povo onde se discutia e decidia
tudo o que diz respeito à vida e à organização da “polis”. Daí vem a palavra
política. Os habitantes das cidades se dividiam em três classes básicas:
cidadãos, libertos e escravos. Só os cidadãos eram considerados povo (Demos) e
só eles participavam da Assembléia. O sistema de governo era, então, chamado
“Demo (povo) cracia (governo)”. Na realidade não era o “governo do povo”, mas
de uma pequena elite: dos cidadãos.
A formação de Paulo se deu, em
sua maior parte, na cidade de Jerusalém (At. 22,3). Isto implica que o modo de
pensar de Paulo foi mais semita do que grego e a língua de sua educação foi o
aramaico. Seus estudos com Gamaliel nos dizem que ele se preparava para ser
Rabi. No tempo de sua conversão já não era mais um discípulo, mas um mestre
reconhecido e capaz de tomar decisões legais. O papel que representou em sua
ida a Damasco nos leva a pensar neste sentido (At. 9,12; 22,5). Paulo tinha
qualidades de líder.
Cidadão romano, cidadão de
Tarso, aluno de Gamaliel, testemunha oficial da execução de Estevão, (At 7,58)
emissário do Sinédrio para Damasco At 9,2; 22,5; 26,12), membro, talvez do
Sinédrio, formação superior, membro ativo da comunidade, todos estes título e
qualidades situam Paulo entre a elite da sociedade quer por formação, quer por
posse e liderança. Tinha diante de si um futuro promissor e a possibilidade de
uma carreira brilhante. A entrada de Jesus em sua vida, porém, modificou esta
situação. “O que era lucro se tornou perda” (Fl 3,7).”Por causa dele perdi tudo
e considero tudo como lixo, a fim de ganhar Cristo e estar com ele” (Fl 3,8).
II. PAULO
UM CONVERTIDO FERVOROSO A QUEDA NA ESTRADA DE DAMASCO
Era aproximadamente o ano 36.
Paulo estava com 28 anos de idade. Em (Gal 2,1 e 1,18) o autor afirma que 14
anos depois de sua conversão houve o Concílio de Jerusalém. Este Concílio se
deu pelos anos 49-50. Então a data da conversão estaria em consonância com este
memorável fato. Paulo tinha poder e prestígio. Em nome do Sinédrio liderava a
perseguição contra os cristãos. Teve a autorização de persegui-los até Damasco,
na Síria (At 9,1-2; 26,9-12), a mais de 200Km de distância de Jerusalém. Oito
dias de viagem. Enquanto caminhava por lá, eis que de repente uma luz aparece.
Paulo cai e ouve uma voz: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” (At 1,9). Paulo
estava perseguindo a comunidade dos cristãos. Mas Jesus pergunta: “por que me
persegues?”. Jesus se identifica com a comunidade. Colocando-se do lado do
perseguido, desaprova o perseguidor. A queda nas estradas de Damasco foi o
divisor das águas. De agora em diante a vida de Paulo se divide em antes e
depois. A entrada de Jesus na sua vida não foi pacífica, mas uma tempestade
violenta. A Bíblia usa algumas imagens para descrever o que aconteceu. Duas
delas são de Lucas e duas do próprio Paulo.
- Queda. Deus não pediu licença. Entrou sem mais e o
derrubou (At 9,4; 22,7; 26,14). E Paulo, caído no chão, se entrega. É o
caçador vencido pela caça. A expressão “cair do cavalo” tem sua origem.
- Aborto. “Por último Jesus apareceu a mim que sou um
aborto” (1Cor 15,18). Seu nascimento para Cristo não foi normal. Foi
forçado. Foi arrancado de dentro do seu mundo como se arranca uma crianç
aqui. Não há cavalo, porém, na história e Paulo, só queda. Uma queda muito
mais violenta do que cair de um cavalo.
- Cego. Uma luz o envolveu (At 9,3). Paulo caiu por terra
ao ver a luz da glória de Javé (Ez 1,27-28). Era uma luz tão forte que
ficou cego. E ficou cego durante três dias , sem poder comer e beber (At
9,8-9). Três dias de escuridão e de morte antes da Ressurreição. O líder
foi conduzido pelas mãos de seus liderados (At 9,8). Só pode enxergar de
novo quando Ananias impôs as mãos e disse: “Saulo, meu irmão”!. (At 9,18).
Ressuscitou quando foi acolhido na comunidade como Irmão. Morreu o
perseguidor e ressuscitou o profeta.
- a do seio da mãe por meio de uma
operação.
- Fui apanhado. Também esta imagem é de Paulo. Ele afirma:
“Procuro apanhá-lo assim como eu mesmo fui apanhado por ele” (Fl 3,12). É
como se Deus estivesse perseguindo Paulo com um laço na mão e, de repente,
o apanhasse pelo pé e o derrubasse no chão.
Queda, cegueira, aborto e
laço! Estas imagens são bem eloquentes. Deixam transparecer algo que Paulo
viveu. Sugerem a ruptura que houve. Revelam o fracasso do sistema em que ele
vivia. Apareceu o nada de Paulo de onde vai nascer o tudo de Deus. “Sem mim
nada podeis fazer” (Jô 15,5). “Tudo posso naquele que me conforta” (Fl 4,13).
A experiência no caminho de
Damasco foi definitiva para Paulo. Lá se encontrou com o Senhor. Desde então
Paulo adotou novo estilo de vida. O evento é narrado por Paulo em Ga1 1,13-17 e
três vezes em At. 9,13-19; 22,6-16 e 26,12-18. Todas estas narrações falam de
uma experiência fortíssima e não esperada, quando estava no auge de seu papel
de perseguidor. Existe entre elas variantes a respeito de detalhes. O elemento
essencial, porém, é igual em todas. As variantes dependem das fontes donde
Lucas tirou o seu material. Paulo, falando desta experiência, associou a ela
seu mandato apostólico. Por amor de Jesus ele se fez tudo a todos (1Cor 9,22);
ficou o servo dos servos (Gal. 1,10; Rom. 1,1). Tornou-se semelhante aos
grandes servos de Javé do AT (Moisés, Josué, Davi...) Depois da experiência de
Damasco, Ananias o curou de sua cegueira com a imposição das mãos e Paulo foi
batizado, ficando em Damasco por uns dias (At. 9,19).
Não muito tempo depois Paulo
foi à Arábia (Gal. 1,17), o que não é mencionado nos Atos. Por Arábia se
entendia a Transjordânia de hoje. Por que se retirou no deserto? Uns dizem que
foi para meditar, outros afirmam que peregrinou até o Sinai, o monte da Lei, e
outros ainda opinam que foi pregar o Evangelho. Ficou breve tempo e na
primavera de 37 voltou para Damasco onde ficou 3 anos, o que foi tempo
considerável (At. 9,23). Durante este tempo os judeus ficaram alvoroçados.
Paulo lhes demonstrou ter sido Jesus o Messias. Agora Paulo já tinha
discípulos. Alguém aventou a hipótese que neste tempo Paulo foi influenciado
pelos essênios de Damasco. Nas cartas não existe o mínimo aceno a respeito.
A oposição judaica, apoiada
pelo rei Aretas de Damasco, o obrigou a deixar a cidade. A fuga foi organizada
pelos seus discípulos que o desceram num cesto para fora dos muros da cidade
(At. E 2Cor. 11,32). Então foi a Jerusalém pela primeira vez depois de sua
conversão (At, 9,26; Gal. 1,18). Barnabé fez com que fosse aceito em Jerusalém
sem desconfiança (At. 9,27). Esta visita aconteceu no ano 40. O motivo foi para
tomar informações de Cefas (Pedro – Gal. 49,15). Durante esta visita Paulo teve
uma visão no templo em que Deus lhe ordenava de deixar Jerusalém (At. 22,17).
Paulo foi então a Tarso (At. 9,30; Gal. 1,21). Ficou 4 anos na Cilícia e
nada sabemos desta época. Barnabé foi buscá-lo e o levou para Antioquia onde
permaneceu um ano (At. 11, 25) evangelizando a cidade.Em Jerusalém um profeta
chamado AGAPO anunciou uma grande caristia (At. 33,28). Em Antioquia se fez uma
grande coleta que Paulo levou aos pobres de Jerusalém no ano 46 (At. 11,29-30;
12,25). As visitas de Paulo a Jerusalém foram muitas, mas sempre muito breves.
III.
PAULO UM MISSIONÁRIO INTINERANTE
1. AS
VIAGENS DE PAULO PELO MUNDO
“Fiz muitas viagens. Sofri
perigo nos rios, perigo por parte de ladrões, perigos por parte dos meus
compatriotas, perigos da parte dos pagãos, perigos nas cidades, perigos no
deserto, perigos no mar. Três vezes naufraguei. Passei um dia e uma noite em alto
mar” (2Cor 11,25,26)...
Os Atos afirmam que o terceiro
período da vida de Paulo foi marcado por três grandes viagens missionárias. A
primeira começou no ano 46 (At 13,1-3) quando Paulo tinha mais ou menos 41
anos. A terceira terminou no ano 58 com sua prisão na praça do templo, em
Jerusalém (At 21,27-34). Treze anos de andanças... E naquele tempo não havia
ônibus, asfalto... Andava-se no lombo de um animal, ou a pé, ou de barco.
Milhares de quilômetros. Nas estradas não havia segurança nenhuma. Hospedarias
cada trinta quilômetros, mas somente nas grandes rodovias...
Durante treze anos viajou
assim, visitando Antioquia, Atenas, Corinto, Éfeso, Tessalonica, Filippos,
Corinto, Roma, adaptando-se a mentalidades diferentes, a gregos e romanos, a
gente das cidades e do campo... Nunca viajava só. Na 1a viagens foi com Barnabé
e Marcos (At 13,3-5). Na segunda com Silas (At 15,36-40) e Timóteo (At 15,1-3),
com Lucas.e o casal Priscila/Áquila (At 18,18). Na terceira houve mais pessoas
(At 19,22; 20,4-5; 21,16). Era uma comunidade cristã viajando e
Evangelizando.
2. OS
COMPANHEIROS DE PAULO.
Alguns companheiros de sexo
masculino e feminino aparecem como mais íntimos de Paulo. Sem eles não teria
conseguido fazer o que fez. Eis alguns deles.
- Barnabé : Levita de Chipre que
tornado cristão se destacava por sua generosidade. Seu nome era José.
Acolheu Paulo em Jerusalém e foi o intermediário entre ele e os Apóstolos.
Buscou Paulo em Tarso depois da conversão, trabalhou com ele em Antioquia
e o acompanhou em sua 1a viagem e em Corinto. Desentendeu-se com Paulo ao
início da 2a viagem por querer levar junto Marcos, seu sobrinho, o que
Paulo não quis. (At 9,27; 11,25-26; 13,2; ..1Cor 9,6; Gl 2,1.9.13).
- Lídia: Natural de Tiatira e vendedora de púrpura.
Ofereceu hospitalidade a Paulo e se converteu com sua família. Foi uma
mulher muito piedosa. Paulo a escolheu como coordenadora da comunidade de
Filipos (At 16,14-15.40; Fl 1,5.7-8; 4,15)
- Priscila e Áquila: casal originário do
Ponto, mas residente em Roma. Fugiu para Corinto quando o Imperador
Cláudio perseguiu os judeus. Áquila tinha a mesma profissão de Paulo.
Acolheu Paulo em sua casa durante a 2a viagem missionária . Ele e sua
mulher Priscila ou Prisca acompanharam Paulo até Éfeso tornando-se, por
sua vez, missionário pregadores. Converteram Apolo (At 18,18-26),
voltaram a Roma depois da morte de Cláudio e retornando a Éfeso pouco
depois. São Paulo acentua em suas cartas todos os serviços que o casal
prestou às comunidades cristãs. (At 18,2.18; Rm 16,3-4).
- Febe: gentia-cristã de Roma a serviço da comunidade de
Cêncreas, recomendada por São Paulo aos romanos. Talvez, foi ela quem
levou para Roma a Epístola aos Romanos. (Rm 16, 1-2).
- Timóteo: Natural de Listra, na Ásia Menor. Paulo conhecia
sua famáilia, a avó Lóide e a mãe Eunice. Levou consigo Timóteo na sua 2a
e 3a viagem apostólica. Recebeu tarefas importantes de Paulo que o
considerava como Filho. Foi o destinatário de duas cartas. Participou do
cativeiro de Paulo em Roma. A tradição venera Timóteo como Bispo de Éfeso.
(At 16,1; 14,19-20; 19,22; 2Tm 1,5; 3,14-15; 1Tm 1,3.18-19; 1Ts 3,2.6;
1Cor 4,17;16,10; Fl 2,19-22)
- Marcos: Filho de Maria cuja casa em Jerusalém estava á
disposição dos primeiros cristãos. Sobrinho de Barnabé e de família
sacerdotal. Na 1a viagem acompanhou Paulo até Perge mas não agüentou a
parada e voltou. Na segunda viagem Paulo não o quis mais consigo.
Ele e Barnabé foram, então, a Chipre pregar o Evangelho. Mais tarde, em
Roma, acompanhou de novo Paulo e também Pedro. Escreveu o Evangelho que
leva seu nome. A tradição diz que fundou a Igreja de Alexandria onde
teria morrido. (At 15,39; 12,12.25; 4,36; 13,5.13; Col 4,10; Fm 24; 2Tm
4,11; 1Pdr 5,13;)
- Tito: Amigo e companheiro de São Paulo. Nunca mencionado
nos Atos. Gentio e incircunciso foi com Paulo a Jerusalém para o Concílio
Apostólico. Paulo lhe deu uma missão especial em Corinto e em Creta onde
recebeu uma carta do Apóstolo. Compartilhou o 2o Cativeiro de Paulo,
partindo, em seguida, para uma missão especial na Dalmácia. Teria morrido
como Bispo de Creta.
3. ALGUMAS
DIFICULDADES NAS VIAGENS DE PAULO
- Dificuldades
de comunicação Paulo falava grego, hebraico, aramaico e, talvez,
latim. Na Ásia Menor os dialetos e as línguas faladas eram dezenas. Paulo
diz na carta aos Gálatas: “Diante de vós foi desenhada a imagem de Jesus
crucificado!” (Gl 3,1). O que faz supor que devia muita vez usar gestos de
comunicação e desenhos. Terá tido intérpretes também...
- Dificuldades
de saúde Quem não tinha boa saúde não podia agüentar canseiras, noites mal
dormidas, comidas diferentes. Paulo devia ter uma saúde de ferro para
agüentar durante treze anos subidas e descidas de morros, frio e calor, o
trabalho para se sustentar e o trabalho missionário... A doença apareceu
durante a 2a viagem e o obrigou a parar na Galácia. Foi assim que nasceu a
comunidade dos gálatas (Gl 4,13). Qual terá sido o problema? Uma doença na
vista ou aquele “aguilhão da carne” (2Cor 12,7)? Paulo não explica.
Preocupava-se sim com a saúde dos companheiros, principalmente de Timóteo
que sofria de estômago (1Tm 5,23)
- O
sustento Era o problema maior. Uma viagem naquele tempo não era como hoje.
Hoje, você entra no ônibus, passa a viagem dormindo numa cadeira e
amanhece a 600 quilômentros de distância. Naquele tempo, percorrer uma
distância de 600 quilômentros levava no mínimo vinte dias, a uma média de
trinta quilômentro por dia. Hoje, quem esquece de levar lanche, agüenta
passar a noite no ônibus de Belo Horizonte a São Paulo. Mas como levar
lanche para vinte dias? Impossível! E onde arrumar dinheiro para comprar
comida para quatro ou cinco pessoas durante três semanas? Como é que eles
faziam? Interrompiam a viagem, paravam e trabalhavam para conseguir o
dinheiro suficiente. Assim, uma viagem de 600 quilômetros podia durar dois
meses ou mais. Quando Paulo chegava a um lugar, uma das primeiras
providências a tomar era procurar uma oficina onde pudesse conseguir
biscate e ganhar, uns trocados. (O lema de Paulo era: “Quem não quiser
trabalhar, também não deve comer!” (2Ts 3,10). “Vocês mesmos sabem que estas
minhas mãos providenciaram o que era necessário para mim e para os que
estavam comigo” (At 20,33-34).
- O
Contato com as comunidades Paulo mantinha contato com as comunidades
através de mensageiros (Cl 4,10, 1Cor 1,11; 16,12-18; 1Ts 3,2-6) e de
cartas. Pedia que suas cartas fossem lidas nas reuniões de comunidade (1Ts
5,27). Escrever cartas era, para aquele tempo, muito dificultoso e exigia
uma pessoa especializada no assunto. Paulo viajava, formava uma comunidade
e continuava líder desta comunidade. Mantinha constante contacto com ela.
Não tendo, como nós temos, telefone, rádio, jornal, TV telegramas, podemos
imaginar as dificuldades que devia enfrentar.
4.
A GEOGRAFIA DAS VIAGENS DE PAULO.
Lucas (At 2,8-11) enumera os
povos presentes em Jerusalém no dia de Pentecostes. No decorrer da narração ele
mostra como aqueles povos foram atingidos pelo Evangelho, sobretudo com as
viagens de Paulo. Realiza-se, pois, a profecia de Pentecostes. A história da
humanidade, desintegrada pela confusão das línguas na construção de Babel (Gen
11,5-9), vai sendo refeita através do trabalho missionário de Paulo e do povo
das comunidades. Jerusalém, porém, é o centro de onde parte a ação missionária.
A ordem de Jesus é de ir até o fim do mundo, começando por Jerusalém. O fim do
mundo é Roma. Lá acabam os Atos dos Apóstolos. Cada uma das viagens de Paulo
começa e acaba em Jerusalém.
5.
O CONCÍLIO DE JERUSALÉM
Foi no ano 49, depois da 1a
viagem missionária.. Em Antioquia os judeus armavam a maior das confusões
pregando que aos pagãos convertidos se deviam aplicar as leis judaicas da
circuncisão e outras. A Igreja antioquena decidiu enviar a Jerusalém Paulo,
Barnabé e outros (Gal. 2,11) para consultar os apóstolos e presbíteros e ter
uma decisão sobre os problemas da comunidade. A visita concluiu-se com o
chamado Concílio de Jerusalém. A controvérsia que se deu naquele Concílio diz
respeito, principalmente, à dois pontos doutrinários.
- A
circuncisão (Gal. 1-10; At. 15,6-12). Era uma questão com muitas
implicâncias. A grande questão era: “A salvação depende unicamente da fé
em Cristo ou da fé em Cristo junto com a circuncisão e a observância da
lei judaica?”
- A
questão disciplinar relativa aos alimentos (At. 15,13-29) foi outro
assunto quente. Em Jerusalém Paulo se encontrou com toda a Igreja local,
apóstolos e presbíteros. Também aqui os “falsos irmãos” (eram aqueles que
provocaram confusões em Antioquia) insistiam na obrigatoriedade da circuncisão.
Paulo se opôs a essa forma de cristianismo. Os Apóstolos e os presbíteros
examinaram a fundo a questão (Gal. 2,2) e Pedro, como chefe da Igreja,
apresentou a opinião da maioria que era contra a obrigatoriedade da
circuncisão. A assembléia acatou esta decisão e, com este ato, a jovem
Igreja se separou da matriz judaica e se abriu para um apostolado
universal. A posição de Paulo foi aprovada e Paulo pode prosseguir sua
pregação sem maiores oposições. Em relação ao segundo ponto Pedro
declarou:” Pois decidimos, o Espírito Santo e nós, não vos impor nenhum
fardo, além destas coisas indispensáveis: abster-sedas carnes sacrificadas
aos ídolos, do sangue, de animais sufocados e de uniões ilícitas. Fareis
bem se evitardes estas coisas”.
IV.
PAULO PRISIONEIRO
Em 58 Paulo foi a Jerusalém e
visitou Tiago (At 21,18), pois os judeus preparavam atos de hostilidade para
com Paulo (21,17,22) Tiago lhe deu o conselho de associar-se a 4 homens que
estavam para fazer voto de nazireato, para captar as simpatias dos judeus, de
pagar as despesas deles e acompanhá-los ao templo durante sete dias (At.
21,23-24). Paulo assim fez, mas pouco adiantou. Acusado de profanar a lei
judaica quase foi linchado. Quem o salvou foi um tribuno da coorte romana o
qual o prendeu (At. 22,27). Foi, então, enviado a Cesaréia Marítima ao
procurador Antônio Félix (At. 23,23-33) que o segurou prisioneiro durante dois
anos e procurou extorquir dinheiro (At. 24,26). Félix foi substituído no ano 60
por Pórcio Festo. Paulo apelou para ser processado em Roma (At. 25,11), pois
era cidadão romano e foi atendido. Acompanhado por um centurião e por Lucas,
fez a viagem por mar, ao longo da costa, em direção a Creta. O tempo logo se
manifestou ruim e o navio foi arrastado ao largo até Malta, onde naufragou
(At. 28,1).
Salvo por milagre do naufrágio
e da mordida de uma víbora, passou o inverno em Malta, depois contornou a
Sicília e terminou a viagem de mar em Putéoli, perto de Nápoles. Foi então por
via terrestre para Roma, onde ficou em prisão domiciliar durante dois anos, de
61 a 63, guardado à vista por um soldado (At. 28,16). A situação não lhe
impedia de reunir em sua casa judeus romanos (At. 28,16-28).
Paulo foi absolvido. Viveu
durante dois anos numa casa alugada e com o fruto do próprio trabalho (At.
28,30). Sua principal tarefa, porém, era a pregação do Evangelho. Alguns dizem
que foi a Espanha, mas a notícia carece de provas. Certo é que voltou ao
oriente, na Grécia, na Macedônia. Quando e onde de novo foi preso não o
sabemos. Parece que foi pelo ano 67, quando foi levado de novo para Roma, onde
reinava o Imperador Nero. Santo Eusébio nos fala de seu martírio. Dionísio de
Corinto escreveu que Paulo e Pedro foram aprisionados ao mesmo tempo.
Tertuliano relata que o martírio de Paulo foi semelhante àquele de João
Batista, isto é, foi decapitado. A afirmação de Eusébio a respeito da morte de
Paulo durante o reinado de Nero é universalmente aceita. A perseguição de Nero
durou de 64 a 68. Estabelecer o ano exato do martírio de Paulo é praticamente
impossível, mas deve ser colocado entre 66 e 68. Que Pedro e Paulo tenham
morrido na mesma ocasião é improvável. O que pode ser aceito é que o martírio
dos dois se deu durante a mesma perseguição, ao máximo, no mesmo ano. Paulo,
segundo a tradição popular, foi decapitado no lugar onde surge hoje a Basílica
de São Paulo fora dos muros. Sua cabeça, destacada do corpo, teria pulado três
vezes e teriam brotado por lá três fontes de água.
Paulo foi sepultado na Via
Ostiense, perto da catedral que toma seu nome. No ano 258, por causa da
perseguição do imperador Valeriano, que tinha o mau hábito de profanar as
sepulturas dos mártires famosos, os restos de Paulo foram levados num lugar
chamado “Ad Catacumbas”, na Via Ápia. Mais tarde, passadas as perseguições,
foram recolocados no lugar originário onde o Imperador Constantino construiu a
Basílica.
V.
AS CARTAS PAULINAS
1. QUANTIDADE
E AUTOR DAS CARTAS
Os escritos do NT são 27.
Deles 21 são apresentados em forma de cartas, numa proporção de 3 para 1. Entre
as cartas 14 são atribuídas a Paulo. Aceitamos como primeiro escrito do NT a
1Tessalonicenses e que cronologicamente o “Corpo Paulino” antecede todos os
outros escritos do NT. Por isto ousamos afirmar que Paulo introduziu na Igreja
o gênero literário epistolar. A autenticidade das 14 cartas que lhe são
atribuídas, hoje é assim interpretada:
- Não há
problema para sete delas: 1Ts, Gal. 1 e 2Cor, Rm, Fil, Fm.
- Existem
reservas, especialmente entre os protestantes, para 2Ts, Col, Ef.
- É
seriamente discutida a autenticidade paulina para 1 e 2Tm e Tt.
- Certamente
Paulo não é o autor da carta aos Hebreus.
2. OS
DESTINATÁRIOS DAS CARTAS
As cartas do Corpo Paulino
abrangem uma rica variedade de sub-gêneros literários. Estendem-se de uma
comunicação privada de indivíduo a indivíduo (veja-se, como exemplo, a carta a
Filêmon), para grupos de pessoas (Igrejas). Por determinação do autor ou pelo
conteúdo dos escritos podemos considerar muitas delas “Cartas abertas” às
comunidades (Rm, Hebreus, etc..). Paulo, para seus destinatário é sempre o
“Apóstolo”. Embora suas cartas possam ter características diferentes e tenham
origem de circunstâncias particulares, estão sempre a serviço da comunidade e
são o prolongamento e o eco fiel de sua voz apostólica. Por este motivo elas
foram cuidadosamente conservadas pelas Igrejas destinatárias e passadas para
outras Igrejas irmãs, constituindo, assim, o Corpo Paulino.
3.
CARTAS PAULINAS PERDIDAS
A coleção das cartas do NT
atribuídas a Paulo não representa toda a correspondência histórica entre ele e
as Igrejas. Paulo mesmo acena indiretamente a outras cartas que não chegaram
até nós. Como podemos conhecer isto?:
- Paulo
afirma (2Ts): “a saudação é de meu próprio punho. É o meu sinal em toda
carta”. Isto faz pensar que a carta em questão não seja simplesmente a sua
segunda experiência literária.
- Em 1Cor
5,9 faz referência explícita a uma carta precedente.
- A carta
pois, escrita “numa grande aflição e com muitas lágrimas”, da qual
se fala em 2Cor 2,4, não pode ser identificada com 1Cr, mas antes como uma
missiva entre a primeira e a segunda.
- As
cartas ao Laodicences à qual se faz aceno em Col 4,16 podem ser a carta
aos Efésios, mas também escritos perdidos.
- Em Fil
3,1s existem acenos a bilhetes enviados a Filipos antes da carta e
perdidos, para nós. O conteúdo destes recados, conforme alguns
exegetas de hoje, estaria incluído na carta.
Resumindo:
Parece que houve ao menos os seguintes escritos que andaram perdidos:
- Um
carta aos Coríntios antes da atual 1Cor.
- Outra
carta aos Corintios entre a 1Cor e 2Cor.
- Cartas
aos Filipenses que precederam àquela que temos. Acreditamos, porém, que a
correspondência paulina, desconhecida por nós, foi bem maior.
4.
AS CARTAS PAULINAS À LUZ DA EPISTOLOGRAFIA ANTIGA
Como os antigos escreviam
cartas ? Os antigos tinham 4 maneiras de escrever carta.
- Escreviam-nas
diretamente, de próprio punho.
- Ditavam
a carta a um escriba palavra por palavra.
- Confiavam
a redação da carta a um secretário ou amanuense, fornecendo a ele a
temática geral da carta.
- Davam
ao amanuense ou secretário o endereço do destinatário, com o encargo de
escrever em seu nome, sem ver, sequer, a composição.
A maneira última de escrever
cartas, nos é bastante estranha. Era usada também por Cícero que, escrevendo
para Atico, lhe autoriza o seguinte: “Se houver alguém para o qual você ache
necessário enviar alguma carta em meu nome, gostaria que a escrevesse e a
entregasse”
Esta variedade de costumes
epistolares nos é ricamente comprovada pela epistolografia grego romana que
chegou até nós pela literatura clássica, pelo modo de escrever dos Padres da
Igreja e pelas incontáveis (mais de 15 000) cartas descobertas nos últimos
séculos.Escrever era um trabalho muito penoso e lento por causa do material
usado (papiro, tinta, caneta). Por isto se recorria geralmente a escribas
profissionais. No tempo de Diocleciano um escriba pedia por 100 linhas o mesmo
salário que recebia um operário por um dia de trabalho. Escreviam de próprio
punho os pobres que não tinham escriba ou não podiam pagá-lo, e os ricos
também, quando as coisas eram muito reservadas, e não era oportuno que o
escriba as conhecesse.
Qual o modo usado por São Paulo para escrever?
- Não é fácil responder de maneira cabal. Só podemos dar afirmações
cautas e genéricas.
A) Paulo não teria escrito de
seu próprio punho nenhuma carta. Não existe motivo para que nós nos afastemos
do modo comum da praxe de escrever dos antigos. Paulo não foi, com certeza, uma
exceção à regra geral, dispensando um escriba. As suas ocupações, pelo
contrário, o ministério da pregação e o trabalho que lhe possibilitava viver,
não lhe davam o tempo necessário para escrever. Em seis de suas cartas
manifesta diretamente isto. (Fl 19; 2Ts 3,17; 1Cor 16,21; Gal 6,11; Rm 16,22;
Col 14,18)
B)
Do outro lado parece-nos impossível imaginar Paulo ditando, palavra por
palavra, suas cartas. Seria um tempo precioso tirado ao seu apostolado e ao seu
trabalho. Pelos cálculos de “Roller”, especialista em epistolografia antiga, a
1a carta aos tessalonicenses teria custado 20:00 (vinte) horas de ditado e
aquela aos romanos 90 horas e 42 minutos. É possível, então, que tenha
encarregado alguém indicando-lhe as idéias principais e deixando para ele o
encargo de pô-las por escrito. Lembremos que entre os antigos a memória era bem
mais cultivada do que entre nós. Portanto a fidelidade ao pensamento Paulino
era garantida. Como conclusão, poderíamos dizer que os pensamentos são de
Paulo, mas a composição é de alguém que ouviu a doutrina de Paulo e a redigiu
por escrito, em seu nome.
C) A respeito da carta aos
Hebreus é provável que esteja em jogo a 4a hipótese. Alguém,
talvez discípulo de Paulo (Barnabé, Lucas, Clemente de Roma, Apolo, Sila,
Filipe Aristão, Priscila, outros?..), expressou com uma carta pensamentos
essencialmente paulinos. Esta seria também a opinião de Orígenes.
5. RAIOS
X DAS CARTAS DE SÃO PAULO
As pessoas, em geral, também
aquelas de cultura superior, conhecem nada ou muito pouco de Paulo. Ao ler suas
cartas dizem que é um escritor muito difícil de ser entendido. Elas têm toda a
razão. Digo mais: Quanto mais se aprofunda o estudo, tanto mais se compreende
que é difícil entendê-lo corretamente e se intui como possa ser mal
interpretado pelas pessoas que o lêem superficialmente. Paulo é difícil quer
pelos conceitos que apresenta, quer pelo modo de expressar os conceitos.
Seu estilo é entrecortado,
cheio de anacolutos (mudanças abruptas de construção, termos deslocados...) de
subentendidos... Deixa, às vezes, o leitor hodierno meio atordoado e confuso.
Muita vez, quem lê, depois de ter examinado dez palavras de uma sua proposição,
sente a necessidade de acrescentar outras cinco palavras para apresentar a si
mesmo o conceito claro e completo.
Se o seu estilo causa
dificuldades, o que dizer de sua doutrina? Encontramos a cada passo
especulações teológicas, elevações místicas, ensinamentos catequéticos, alusões
históricas apresentando, para nós, problemas muitas vezes de difícil solução e
ainda não plenamente resolvidos. Quando Paulo discute com os Coríntios a
respeito daquilo que acontecia na comunidade era plenamente entendido por
aquela comunidade que vivia a situação, enquanto nós, agora, não sabemos bem do
que se tratava. Quando os instruía a respeito dos carismas, falava de um
fenômeno comum naquele tempo, enquanto hoje está fora de nossas experiências
desde séculos. Quando lhes dava normas para as assembléias litúrgicas, visava
somente costumes vigentes naquela época, enquanto nossa norma de agir, hoje, é
diferente. Quando recomendava aos tessalonicenses de se lembrarem daquilo que
tinha dito a eles oralmente a respeito da parusia, nós nos perguntamos o que
teria dito, pois não conhecemos aquela sua pregação oral ...
É normal, portanto, que as
cartas de Paulo tenham sido julgadas difíceis até pelos antigos. Pedro,
na sua segunda carta, reconhece haver certa dificuldade na interpretação dos
escritos de Paulo : “Ele (Paulo) disse isto também em suas cartas, se bem que
nelas se encontrem algumas coisas difíceis que homem sem instrução e vacilantes
deformam, para sua própria perdição” (2Pdr 2,16). Os destinatários de suas cartas
pertenciam a classes sociais baixas e não podiam ser todos inteligentes e
sábios. Eles também podiam não entender, ou entender mal, coisas que Paulo
escrevia.
Hoje teólogos muito
perspicazes em doutrina e história colocam à nossa disposição suas experiências
para nos dar luzes sempre mais fúlgidas na interpretação das cartas paulinas.
Todavia, não nos iludamos. Nós, vinte séculos distantes de Paulo, estamos em
condições bem pior dos antigos destinatários e, portanto, entenderemos as
cartas de Paulo muito menos do que eles.
Lembremos, porém, uma coisa
importante. Se Paulo é de difícil interpretação, todavia não deve ser colocado
de lado. Para catequistas, sacerdotes e Bispos é uma séria responsabilidade
moral conhecer e fazer conhecer a doutrina paulina. Uma meditação feita sobre
os escritos de Paulo vale 4 meditações sobre outros escritos excelentes
(Ricciotti). É típico o exemplo de Santo Agostinho. Todos sabem que o último
empurrão para a sua conversão aconteceu numa leitura ocasional de um trecho de
Paulo:”Me agarrei avidissimamente sobretudo ao Apóstolo Paulo e se esvaíram em
mim aquelas dúvidas que, como os adversários julgavam, não estariam de acordo
com o testemunhos da Lei e dos Profetas.”... (Confissões VII, cap 21, &27).
Aquele “avidissimamente” faz transparecer o estado de alma de um grande gênio
que se encontrava com um outro grande gênio.
Este gênio semita tem uma boa
cultura grega, recebida em Tarso desde a infância, e enriquecida pelos seus
contínuos contatos com o mundo grego-romano. Esta influência se reflete na sua
maneira de pensar, na sua linguagem, no seu estilo. Ele cita, na ocasião
oportuna, autores clássicos (1Cor 15,33; Tt 1,12; At 17,28), conhece a
filosofia popular baseada no estoicismo, tirando dela algumas noções. Imita a
“diatribe”, maneira de discutir com perguntas e respostas, própria dos cínicos
e dos estóicos. Suas argumentações seguem o fluxo e o defluxo das argumentações
filosóficas da época. Fala corretamente o grego como uma segunda língua materna
(At 21,40). Naturalmente é o grego popular, sem nenhuma pretensão de aticismo,
pois despreza os artifícios da eloqüência humana e não quer fazer depender sua
força de persuasão senão do poder da Palavra e da Fé, confirmada pelos sinais
do espírito (1Ts 1,5; 1Cor 2,4s; 2Cor 16,21; Rm 15,18). Por vez, sua
expressão é incorreta e inacabada (1Cor 9,5), parecendo ser sua linguagem
incapaz de conter o impulso de um pensamento rico demais ou de emoções
demasiadamente vivas.
Em suas cartas há trechos que
nos dão a impressão de uma redação longamente meditada (Ex: Cl 1,15-20) e
outros trechos parecem saído de um primeiro impulso espontâneo e sem retoques.
Seu estilo fogoso é, apesar ou por causa disto mesmo, de uma densidade
extraordinária. Muitos textos paulinos por seu vigor religioso e mesmo
literário, permanecem, talvez, sem rival na história das cartas humanas.
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