"A Igreja procede da Santíssima Trindade enquanto tem nascido da mesma comunhão do Deus" |
"A
Igreja da Trindade (Ecclesia de Trinitate) não só expressa a origem da Igreja a
partir da Trindade, senão que indica também a continua participação da Igreja
no mistério da vida da Trindade."
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
"Para
perscrutar o mistério da Igreja, é conveniente meditar primeiro sobre a sua
origem no desígnio da Santíssima Trindade e sobre a sua progressiva realização
na história."
“«O
eterno Pai, que pelo libérrimo e insondável desígnio da sua sabedoria e
bondade, criou o universo, decidiu elevar os homens participação da vida
divina», para a qual a todos convida em seu Filho: «E, aos que creem em Cristo,
decidiu convocá-los na santa Igreja». Esta «família de Deus» constituiu-se e
realizou-se gradualmente ao longo das etapas da história humana, segundo as
disposições do Pai: de facto, a Igreja «prefigurada já desde o princípio do
mundo e admiravelmente preparada na história do povo de Israel e na antiga
Aliança, foi constituída no fim dos tempos, e manifestada pela efusão do
Espírito Santo, e será gloriosamente consumada no fim dos séculos (CIC 759).”
Em sua última reflexão: "O mistério do Filho na sua Igreja", padre Gerson Schmidt* nos recordou que "a redenção do Filho se perpetua nas ações da Igreja. Quando a Igreja atua, é Cristo quem opera, por obra do Espírito, a salvação entre nós". E "pela força do Evangelho rejuvenesce a Igreja e renova-a continuamente e leva-a à união perfeita com o seu Esposo. Porque o Espírito e a Esposa dizem ao Senhor Jesus: ‘Vem’!". Dando sequência a sua exposição sobre este tema, o sacerdote gaúcho nos fala hoje sobre "A Igreja da Trindade":
"Já apontamos aqui que Deus Pai tem a
iniciativa da Igreja, pois tem criado o mundo para salvar-nos em Cristo e,
portanto, por meio da Igreja. Nenhum cristão julga que o concílio Vaticano II
tenha inventado o Mistério da Santíssima Trindade e muito menos alterado esse
mistério tão rico, profundo e importante da doutrina da Igreja, presente desde
os primórdios. O concílio de modo algum poderia acrescentar ou diminuir algum
dos preciosos predicados da Trindade. O mistério da Santíssima Trindade é, de
alguma maneira, insondável e permanecerá imutável por todos os séculos. Deus é
imutável. É consenso entre os teólogos, porém, que o concilio Vaticano II
trouxe o Mistério da Santíssima Trindade para o centro das atenções: “centro na
vida de cada fiel, batizado em nome do Pai, e do filho e do Espírito Santo;
centro da liturgia, garantindo que toda ela se dirige ao Pai, pelo filho no Espírito
Santo; centro da teologia, com destaque em todos os seus tratados; e acima de
tudo, centro da Igreja que, a partir dele, passou a ser chamada Igreja da SS.
Trindade”[1].
Mas antes do Concílio Vaticano II, o Mistério da
Trindade parecia de fato insondável, impenetrável, como se permanecesse, como a
palavra mesmo diz, um “mistério”, um segredo ininteligível, inatingível,
incapaz do ser humano poder entender, adentrar e mergulhar. Não poderíamos
falar desse mistério, não nos era dado desvendá-lo nem entender sua
profundidade. Após o concílio não só afloraram obras sobre cada uma das pessoas
divinas, como também tratados sobre a presença trinitária na vida cristã e no
mundo. E por isso também a relação da Trindade com o mistério da Igreja.
O teólogo canonista Dom Dadeus Grings, hoje
arcebispo emérito da Arquidiocese de Porto Alegre, escrevia assim em uma de
suas inúmeras cartilhas pastorais, falando sobre os desafios do concílio
Vaticano II: “A Trindade tornou-se, por assim dizer, acessível e íntima de cada
fiel. O concílio indubitavelmente a trouxe para o centro da vida e das
considerações cristãs. Algo semelhante aconteceu com a Igreja. Mas com algumas
diferenças marcantes. O concílio Vaticano II pode ser definido como concílio
não só da Igreja, mas também sobre a Igreja. Não só a tirou dos tratados da
teologia fundamental, como sociedade perfeita e embasamento da teologia
dogmática, mas a passou decididamente para a própria teologia dogmática, como
mistério de salvação. Não só limitou a estudar mais a fundo a natureza da
Igreja como tal, mas também trabalhou para sua reforma. Ou melhor, dentro da
atual técnica da renovação, na Igreja não se efetua propriamente uma reforma
como um restauro, o que equivale a torná-la como realmente é e era. O Papa João
XXIII, ao convocar o Concílio, falava de uma atualização, ou melhor ainda, de
uma ventilação que dispersasse o mofo acumulado ao longo dos séculos”[2].
A Igreja procede da Santíssima Trindade enquanto
tem nascido da mesma comunhão do Deus Trino que tem querido estender sua
comunhão com os homens. “A Igreja tem nascido do amor do Pai eterno, tem sido
fundada no tempo pelo Filho e é vivificada continuamente pelo Espírito”[3].
A maior parte dos tratados clássicos da Igreja não sublinhavam essa conexão com
a Trindade, que aparecia na maioria dos casos como uma realidade inatingível e
insondável, quando na realidade a salvação cristã nasce dela e culmina nela. A
Igreja da Trindade (Ecclesia de Trinitate) não só expressa a origem
da Igreja a partir da Trindade, senão que indica também a continua participação
da Igreja no mistério da vida da Trindade. A Igreja é ícone da Trindade, como
afirmam alguns teólogos[4],
no sentido que é uma imagem que participa na vida trinitária que dela vive. “A
Igreja é a presença viva da Trindade no tempo pela missão do Filho e do
Espírito Santo. Por isso, a unidade das pessoas divinas é para a Igreja a
origem, o modelo e o fim de sua existência”[5]."
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de
janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é
graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
_____________
[1] GRINGS, Dadeus. Os desafios do
Concílio Vaticano II – Cartilha da Fé Conciliar. Editora Pe. Réus, 2013,
Porto Alegre, p.35.
[2] Idem, p.35-36.
[3] SAYÉS, José Antonio. La Iglesia de Cristo,
Curso de Eclesiologia, Editora Pelicano, Madrid, 1999, p. 19.
[4] B. FORTE, La Iglesia de la Trinidad, 51ss.
[5] SAYÉS, José Antonio. La Iglesia de Cristo, Curso de Eclesiologia, Editora Pelicano, Madrid, 1999, p. 20.
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