Igreja no ano de 1966 | neocatechumenaleiter |
Kiko Argüello nos arredores | neocatechumenaleiter |
«QUANDO AS PEDRAS VOLTAM A FALAR»
No último 12 de outubro (2022), festa da Virgem do
Pilar ‒ dia em que a Espanha comemora solenemente a aparição,
no ano 40 DC, sobre um pilar de mármore
às margens do rio Ebro, da Virgem Mãe
de Deus ao apóstolo São
Tiago e seus companheiros para animá-los a continuar na evangelização ‒,
em Fuentes de Carbonero o Maior, uma pequena aldeia próxima
de Segóvia, desabitada desde 1960, foi realizada uma
celebração com um significado verdadeiramente extraordinário.
A Eucaristia foi presidida pelo bispo de Segóvia,
S. E. Mons. César Franco, acompanhado de mais de 30 presbíteros e com a
presença de cerca de 500 pessoas que encheram o interior da Igreja e o espaço
em volta. Esteve também presente o governador de Segóvia, Miguel Ángel de
Vicente, a prefeita de Carbonero o Maior, María Ángeles Sanz, acompanhados de
outras autoridades e representantes do Caminho Neocatecumenal do noroeste da
Espanha e muitos irmãos de diversas comunidades neocatecumenais da Região. Foi
comovente a participação de numerosos habitantes de Carbonero e dos filhos das
famílias originárias de Fuentes antes de as casas desta pequena aldeia serem
abandonadas e caírem em ruínas.
A área, mais à frente da pequena igreja agora
completamente restaurada graças ao esforço e trabalho do Caminho, é cercada por
uma paisagem campestre. Ao longe, podem ser vistas as paredes destruídas de
algumas antigas casas rurais, uma pequena fonte no fundo de uma encosta e uma
fazenda do outro lado do fosso.
O que este lugar tem de particular? Por que foi
reconstruída uma igreja em um lugar abandonado pelos homens, do qual se poderia
pensar que foi deixado de lado por Deus?
Igreja N. Sra. da Assunção – Fuentes de Carbonero | neocatechumenaleiter |
Kiko Argüello no poço | neocatechumenaleiter |
Foi lembrado antes da Eucaristia por Dom Antonio
Riquelme, presbítero do Caminho responsável desta região, que leu uma mensagem
enviada por Kiko Argüello, iniciador com Carmen Hernández do Caminho
Neocatecumenal, que não pode estar presente ao evento, mas cuja história está
unida a este lugar e que constitui a razão da recuperação deste edifício.
Deixemos que Kiko fale:
Bendigo a Deus, que permitiu a reconstrução desta
pequena igreja, que foi tão importante para mim. Agradeço ao Sr. Bispo por sua
presença e a todos os que tornaram possível a reabilitação deste templo.
O Caminho Neocatecumenal é uma Iniciação Cristã
aprovada oficialmente pela Santa Sé em 2008. O Senhor se serviu de Carmen e de
mim para esta renovação da Igreja nascida com a estrela do Vaticano II. Começou
em 1964 entre os habitantes dos barracos de Palomeras Altas de Madri, quando os
pobres com quem vivíamos nos pediram que lhes anunciássemos o Evangelho de
Jesus Cristo. Uma grande alegria para todo o Caminho e para a Igreja será a
abertura da Causa de Beatificação de Carmen Hernández em 4 de dezembro.
Deus quis que em 1965, desejando buscar um lugar de
retiro e oração, encontrasse abandonada a igreja de Fuentes de Carbonero.
Enquanto caminhava pelo planalto castelhano em um dia nublado, um raio de luz
iluminou as pedras de mica que são abundantes na região, e de repente tudo
ficou iluminado, e fiquei impressionadíssimo: a igreja no meio daquela planície
era um verdadeiro deslumbre. Estava aberta e vazia; ainda tinha o retábulo e
algumas imagens; a sacristia com paletes de madeira me serviu para dormir. Estive
vivendo ali durante 15 dias, rezando, só e com grandes frutos. Vendo que era um
lugar estupendo, retirei-me ali outras vezes, vivendo em solidão, em jejum e
oração e dormindo com meu saco de dormir na sacristia.
Como passava um rio próximo desse lugar, decidi levar comigo uns irmãos dos barracos nesses dias de verão para que eles também tivessem férias. Vivemos uma semana de descanso, de comunhão e de amor. Fiquei impressionado ao ver que enquanto todas as casas do povoado estavam em ruínas, a única construção que estava de pé naquela aldeia abandonada era a igreja, e uma igreja cheia de pobres. Disse aos irmãos dos barracos para recolherem palha. Foram ao campo e cada família preparou para si a cama com palhas e cobertores. Era emocionante, dava para fazer um filme. Fora, todas as casas demolidas; dentro, a igreja cheia de pobres.
Carmen Hernández | neocatechumenaleiter |
Irmãos no rio de Fuentes de Carbonero | neocatechumenaleiter |
No último dia celebramos uma missa e vieram todos
os do povoado que viviam em Carbonero. Alguns disseram que, ao ouvir o badalar
dos sinos, choraram de emoção, porque fazia anos que não os ouvia tocar.
Celebramos uma Missa e vieram participar conosco. Estavam emocionados; de novo
haviam ouvido os sinos de seu povoado. A igreja ficou cheia. Havíamos
adornado-a com flores e preparado muito bem; estava formidável.
Com o passar do tempo, este Kerigma anunciado
aos pobres se concretizou em uma síntese catequética fundada sobre o tripé
“Palavra de Deus – Liturgia – Comunidade” e cuja finalidade é conduzir as
pessoas à comunhão fraterna e a uma fé adulta.
Este novo itinerário de Iniciação Cristã suscitou o
interesse do então Arcebispo de Madri, Monsenhor Casimiro Morcillo, que nos
animou a levá-lo às paróquias; assim se difundiu em Madri e em outras Dioceses
espanholas. Em 1968 o Caminho começou em Roma e a partir dessa data foi-se
difundindo em dioceses de todo o mundo.
Aqui celebramos a Vigília Pascal com os irmãos dos
barracos e os da primeira comunidade de Madri. Não tínhamos luz; éramos
iluminados por um círio velho que encontramos. Ao amanhecer comemos um cordeiro
que havíamos encomendado em Carbonero.
Hoje, depois de 57 anos, os sinos de Fuentes de
Carbonero voltam a ser ouvidos. Como não agradecer ao Senhor? Como não
agradecer à Santa Maria Virgem que inspirou o Caminho Neocatecumenal e
justamente na festa do Pilar nos concede sua reabertura? Justamente hoje se
comemora o descobrimento da América em 1492. A Virgem do Pilar: patrona da
América hispânica, estrela da evangelização do novo continente. Foi a partir
daqui que partiram os primeiros itinerantes do Caminho para evangelizar a
América, que hoje está cheia de comunidades.
Rezem por mim.
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Depois da leitura do testemunho de Kiko foram realizadas
a benção da Igreja restaurada e a Celebração da Eucaristia. O Bispo, em sua
homilia, quis também destacar que a recuperação deste lugar é um “milagre” de
Deus, que faz grandes coisas em nós, salientando a importância simbólica da
reconstrução da igreja como sinal da missão da Igreja de anunciar a Cristo:
“Este edifício – afirmou – exemplifica o que Kiko Argüello queria fazer e o que
a Igreja faz desde suas origens, ou seja, evangelizar, catequizar, enviar ao
mundo os que tem fé para continuar a única e definitiva missão de Cristo”.
Assim, desejo a Kiko que mantenha o “valor com o que há evangelizado tantas
pessoas por meio do Caminho, um Caminho que está dando muitos frutos à Igreja”.
Precisamente a reconstrução desta igreja é “outro fruto do Caminho
Neocatecumenal”.
Um sonho – uma visão.
O testemunho de Kiko e a benção da igreja de
Fuentes depois do trabalho de reconstrução fazem que a partir deste lugar
abandonado chegue a nós a lembrança da gênesis de alguns acontecimentos que são
essenciais para a história do Caminho e que tiveram sua origem aqui em Fuentes:
a Vigília Pascal, vivida segundo o redescobrimento do Concílio Vaticano II, e a
forma de missão com equipes itinerantes.
Em outra história/testemunho do Kiko, ele
acrescentou alguns detalhes que achamos importante lembrar como complemento ao
que foi dito anteriormente. Em sua jornada de fé, Kiko teve a intuição de que
Cristo estava presente no sofrimento dos “últimos na terra”. Seguindo os passos
de São Charles de Foucauld, em 1964 decidiu ir viver com os mais pobres, num
barraco de Palomeras Altas, nos arredores de Madri, onde conheceu Carmen
Hernández, dando início assim a uma nova forma de pregação que pouco depois
levou à formação de uma comunidade cristã.
Kiko nos conta:
“Nos barracos havia uma tal Vicenta (uma voluntária
que ia ajudar os moradores dos barracos) e um dia lhe disse: “Olhe, antes que
você viesse, nunca tínhamos nos agredido, e estivemos sempre em comunhão; desde
que você veio, aqui há uma bagunça…”. E ficou brava e decidiu ir embora.
Era de Segóvia. E então um dia pensei em procurá-la e pedir-lhe perdão. Fui a
seu povoado, Carbonero o Maior, e como não tinha o endereço, perguntei por ela
e me disseram que estava na horta.
Eu comecei a caminhar tranquilamente pelo planalto
castelhano, um deserto; o planalto castelhano é maravilhoso, parece a estepe
russa. O dia estava nublado e de repente abriu-se um raio de luz e iluminou
Fuentes. Acontece que as pedras daquele povoado são de mica, brilham; e de
repente tudo se iluminou e fiquei muito impressionado. A igreja no meio daquela
estepe era um verdadeiro deslumbre…
Em 1967 celebramos a Vigília Pascal na igreja de
Fuentes com os irmãos de Palomeras e os da primeira paróquia de Madri.
Em 1969 D. Francesco Cuppini – o primeiro
presbítero que acompanhou a Carmen e a mim – disse que viria comigo passar a
Semana Santa. Fomos ali e não tínhamos luz, mas havia um círio antigo, e o
acendemos. Encomendamos no povoado ao lado um cordeiro para, ao
amanhecer, comer na ceia pascal. Celebramos a Vigília Pascal sem luz, Francesco
Cuppini a presidiu.
Também em Fuentes foi celebrada a primeira
convivência de itinerantes, e desse lugar partiram para a América as primeiras
equipes de evangelização.”
Kiko ficou muito impressionado pelo “raio de luz”
que iluminava as pedras de mica, que davam uma nova visão a toda aquela região,
com uma igreja abandonada. Esta visão nos fez recordar a outra igreja, outra
palavra e outro sonho da vida de São Francisco de Assis.
Carmen Hernández e Kiko Argüello | neocatechumenaleiter |
Na vida de São Francisco de Assis há dois
acontecimentos muito interessantes, digamos assim, muito próximos de nós.
Conta-se que estando próximo da igreja de São Damião, um pequeno edifício então
em ruínas não distante de Assis, entrou para rezar, e durante a oração,
enquanto seus olhos estavam fixos na Cruz do Senhor, ouviu uma voz que dizia:
“Francisco, vai e repara minha igreja que, como tu vês, está em ruínas”. São
Francisco pôs em seguida mãos à obra para reparar a igreja, mas logo
compreendeu que o chamado do Senhor ia muito além. Na “Legenda Maior”, a vida
de São Francisco escrita por São Boaventura, se conta o sonho do Papa Inocêncio
III – admiravelmente pintado por Giotto na Basílica de Assis – em que viu a
Basílica de São João de Latrão, que estava para desmoronar e que estava
sustentada por um frade… Todos conhecemos a obra que Deus fez na Igreja por meio
da reforma franciscana e não só na Igreja de então, mas até nossos dias.
A reconstrução da igreja de Fuentes cria um
surpreendente paralelo entre a situação da Igreja no século XII e a situação
atual. Certamente, sem ter nenhuma presunção, sabemos que são duas histórias e
dois acontecimentos muito diferentes: ali está a história consolidada, aqui
ainda se trata de uma “visão”, mas basta abrir um pouco os olhos para ver como
Deus leva adiante a história: a Iniciação Cristã, iniciada por Kiko e Carmen, à
luz do Concílio Vaticano II e seguindo suas pegadas, aberta em 135 países dos
cinco continentes, é algo que realmente pode ser decisivo para a Igreja de
nossos dias.
No centro, no coração deste Caminho está o
redescobrimento da Páscoa, da Vigília Pascal, que o próprio Papa Francisco, aos
bispos de Santo Domingo em visita “Ad limina”, reconheceu como um mérito do
Caminho Neocatecumenal. E esta Vigília teve seu nascimento aqui, em Fuentes. De
fato, Kiko e Carmen se aventuraram a celebrar com aquela primeira comunidade
nascida entre os pobres da favela tanto a Páscoa do ano 1967 – durante toda a
noite – como depois o Tríduo Pascal do ano 1969. A Páscoa foi também
fundamental na formação do itinerário neocatecumenal, para dar força e impulso
aos primeiros anos de Caminho. Com a beleza e a graça do Tríduo Pascal e a
Vigília, foi fundamentada a transmissão da fé às famílias que iam formando as
comunidades.
Alguns anos mais tarde, de 1º a 20 de agosto de
1969 – depois do início do Caminho na Itália –, Kiko e Carmen convocaram
novamente aqui em Fuentes, em uma convivência., os primeiros irmãos nascidos
destas evangelizações. E foi aqui que se formou a primeira equipe de
missionários itinerantes que partiu para Colômbia.
Igreja da Assunção em Fuentes de Carbonero | neocatechumenaleiter
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Igreja da Assunção em Fuentes de Carbonero | neocatechumenaleiter |
Ezechiele Pasotti. Segundo telhado | neocatechumenaleiter |
Reconstruir a igreja de Fuentes – tão importante para Kiko, como ele recordou em sua saudação – é como fazer memória destes quase 60 anos de história do Caminho: um necessário agradecimento a Deus que a partir dos barracos e a partir de Fuentes lançou a vida de Kiko e Carmen e a dos primeiros itinerantes a uma aventura que viu levar esse “raio de luz” aos cinco continentes e iluminar com estas “pedras de mica” para que se convertam em sinais de esperança no mundo de hoje para milhares e milhares de pessoas.
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