O falso drama dos pseudoescrupulosos | Presbíteros |
O falso drama dos
pseudoescrupulosos
Por Pe. José Eduardo Oliveira e
Silva
A
CONFISSÃO E OS (PSEUDO) ESCRUPULOSOS
O que faz uma pessoa se
apresentar com trinta páginas escritas em letra miúda, frente e verso, dizendo
que quer fazer uma nova confissão geral, pois a que fez na última semana teria
sido inválida? O que a faz, na semana seguinte, chegar com vinte novas folhas,
do mesmo modo escritas, alegando serem apenas de pecados esquecidos?
De fato, não é o escrúpulo. É a ignorância
presunçosa.
O escrúpulo caracteriza-se por um
medo do pecado e pela desorientação de uma consciência flutuante, que necessita
de ajuda para sair da insegurança, para entender a moralidade dos próprios
atos.
As pessoas acima descritas são,
ao contrário, munidas de muita segurança: querem confessar cada pecado cometido
na vida passada e chegam a passar duas horas aos pés de um padre, muitas fazes
fazendo leituras apressadas e até mesmo explicando e repetindo coisas já ditas.
Ora, tais comportamentos se devem
apenas à falta de conhecimento da doutrina católica a respeito do modo de
confessar-se.
O Concílio de Trento estabeleceu
que a confissão dos pecados deve ser pela “espécie” e pelo “número” (De
Sacramento Paenitentiae, cc. 7-8 in DS 1707-1708). A mesma referência é tomada
na atual Instrução Geral para o Sacramento da Penitência, n. 7. Veja-se também
o Catecismo da Igreja Católica, nn. 1456 e 1497).
Deixe-me dar um exemplo
hipotético: “Padre, quando eu tinha 19 anos, eu me envolvi com uma moça e fui à
sua casa, permaneci duas horas sozinho com ela… Então, começou a surgir um
clima entre nós e ela começou a me seduzir. Daí etc. etc.”. Este modo de se
acusar está completamente errado e é abusivo. Não interessa ao padre, no caso,
um conto erótico. Bastaria dizer: “Cometi um pecado de fornicação (completa ou
incompleta)”, esta é a espécie moral.
Estaria igualmente errado alguém
confessar os seus pecados pelo “gênero” dos mesmos. Por exemplo, “pequei contra
a castidade”. Quantas espécies de pecados contra a castidade existem?
Adultério, masturbação, pornografia, fornicação, concubinato, atos
homossexuais, etc. Muitos! É nas espécies que se deve confessar, não no gênero
nem nos atos individuais.
O Concílio de Trento estabelece,
também, que se deve mencionar as “circunstâncias” que podem mudar a espécie do
ato. Por exemplo, se uma pessoa diz “padre, cantar é pecado?”, a resposta seria
obviamente que “em si, não”. Contudo, se a pessoa cantasse uma música profana
para atrapalhar um ato de culto, isso alteraria a espécie moral: a pessoa não
estaria propriamente cantando, o culto não seria uma mera circunstância, pois,
ao fazê-lo, estaria “interrompendo um ato de culto”, esta é espécie moral.
Portanto, as circunstâncias que
interessam são apenas as relevantes para a determinação da espécie do ato. Por
exemplo, se uma pessoa diz que cometeu fornicação, mas foi com uma pessoa
consagrada, essa “circunstância” alteraria a moralidade do ato, pois, ao invés
de cometer apenas uma fornicação, cometeria também um pecado de sacrilégio. No
entanto, se isso aconteceu à meia-noite ou ao cantar do galo, estas já não são
circunstâncias relevantes.
A distinção numérica, por sua
vez, precisaria ser o quanto mais exata possível. Obviamente, isso nem sempre é
fácil. No entanto, essa acusação pode ser tanto por ato individual quanto por
período.
Exemplificando: seria tão correto
dizer “eu disse dez mentiras” como dizer “durante os últimos cinco meses, eu
disse cerca de uma mentira a cada quinze dias”. Aqui, mais uma vez, se a
mentira, por exemplo, fosse para um padre dentro do sacramento da confissão,
essa circunstância alteraria a moralidade do ato, pois não seria apenas uma
mentira, mas um sacrilégio que invalidaria a confissão e se constituiria num
pecado moral a mais.
Ou exemplo: “durante dez anos de
minha vida, faltei todos os domingos à missa”. Pronto! O
pecado está confessado tanto na
espécie quanto no número.
Quando uma pessoa confessa os
pecados por espécie e por número não consegue encher facilmente tantas folhas…
Isso é apenas fruto da ignorância presunçosa. Não é escrúpulo nem muito menos
delicadeza de consciência. É tão somente ignorância.
Aconselho aos colegas padres que,
em acontecendo tais coisas, mandem a pessoa de volta para casa, após darem essa
explicação acima, a fim de que façam uma redução dos pecados à sua espécie e ao
seu número. Deste modo, não cooperamos com a ignorância. Ao contrário, ajudamos
essas pessoas, muitas vezes egoístas e inoportunas, a ganharem virtudes e a se
corrigirem diante de Deus.
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