Rembrandt, Cristo e a adúltera, Munique, Sala das Estampas | 30Giorni |
Arquivo 30Dias – 03/2003
Luciani e a confissão
A sua paciência nos espera
“O Senhor é um pai que espera no portão. Que nos vê quando ainda estamos longe, e se enternece, e, correndo, vem se atirar ao nosso pescoço e nos beijar com ternura... Nosso pecado, então, transforma-se quase numa joia que podemos lhe dar de presente para prover-lhe a consolação de perdoar... Agimos como senhores, quando damos joias de presente. E não é derrota, mas uma vitória cheia de alegria deixar Deus vencer!”
de Stefania Falasca
“Que seria de mim, pobre coitado,
se não houvesse a confissão”
(santo Cura d’Ars)
Entre os confessores de Albino Luciani, são lembrados em particular alguns
monges da Cartuxa de Vedana, mosteiro que gostava de frequentar desde os tempos
de Beluno, frequência que não deixou de lado durante todo o período em que foi
bispo de Vitório Vêneto. E se nos trinta e três dias de pontificado manteve
como seu confessor o jesuíta Paolo Dezza, que fora também confessor de Paulo
VI, quando estava em Veneza ia com frequência ajoelhar-se no confessionário do
padre Leandro Tiveron, jesuíta também. Modesto e reservado, padre Tiveron
pronunciou poucas palavras a respeito de seu ilustre penitente, depois de sua
morte: “Luciani foi um exemplo de coragem e confiança indestrutível em Deus, de
humildade unida a uma grande fortaleza de espírito”. São palavras que remetem
uma vez mais à história humana boa, simples e misteriosa que Luciani encontrara
quando criança na fé de sua mãe, de padre Filippo Carli, seu pároco em Canale,
amigo e coetâneo de padre Cappello. Assim, lembrou tantas vezes as orações que
aprendeu com a mãe e sua infância em Canale, os episódios daquela piedade
humaníssima, de devoção, de amor por Jesus que vira e vivera quando criança. A
verdade é que devia muito a seu pároco. Devia a ele ter-se tornado padre. Dele
aprendera que, para um padre, não há coisa maior e mais frutuosa que batizar,
dar a eucaristia, absolver os pecados. In persona Christiý E dele
aprendera também toda a sinceridade e a humildade na confissão. “Vejam”, disse
Luciani uma vez num encontro durante a Quaresma, “que o Senhor nos deu a
confissão como instrumento da Sua misericórdia, e portanto de paz para nós. Não
é preciso angustiar-se, ter medos demais. E não é preciso remoer os pecados
cometidos. Vocês os confessaram? Pronto, não pensem mais neles. É claro que a
confissão deve ser simples, límpida. Alguns, quando vão se confessar, fazem um
exame de consciência um pouco complicado, pois pensam: tenho de me sair bem.
‘Esse não é o lugar para se sair bem!’, dizia sempre meu pároco. Então, não é
simples: é melhor falar claramente, com poucas palavras, o que se tem a dizer.
O que houve, com brevidade, com humildade, sem rodeios. [...] Mais que entrar
em exames de consciência muito complicados, é importante pedir ao Senhor que
nos faça sentir dor pelos pecados”. A paciência para explicar com clareza as
fórmulas do catecismo, com exemplos eficazes que todos pudessem compreender,
sempre foi uma prerrogativa de Luciani. “Uma vez, durante uma aula de catecismo
em Canale”, lembra a irmã, Antônia, “ouvi Albino explicar a importância da
confissão com exemplos contados pelo Cura d’Ars, que repetia sempre: ‘Que seria
de mim, pobre coitado, se não houvesse a confissão? Que seria de nós?’. E
recomendava que as pessoas se confessassem com frequência. ‘As mães’, dizia
Albino, ‘por acaso não trocam sempre suas crianças? A alma também é assim: nós
sempre temos faltas e temos sempre de nos lavar, não uma vez ou duas por ano,
mas devemos nos confessar com freqüência, se for possível’”. Indicava
explicitamente a seus sacerdotes: “Sejamos fiéis ao que diz o código: Frequentará.
Vários sínodos dizem: toda semana. Procurem ser fiéis. Um pouco de esforço, mas
depois a pessoa fica melhor, fica mais contente, retoma as forças. O
arrependimento contínuo, a humilhação contínua também é útil e salutar”.
Os anos do patriarcado de Veneza foram os mais difíceis para Albino Luciani. E
foi lá, em Veneza, que teve de se dar conta com amargura do quanto aquela
herança cristã tão cara estava cada vez mais longe do horizonte da vida.
“Ouve-se cada vez com mais freqüência: ‘O pecado não existe’. Essa maneira de
pensar está realmente na última moda, e assusta”, escrevia numa carta aos
párocos, continuando: “Há sacerdotes que não acreditam mais na confissão. [...]
Pecados sempre existiram, sempre choveram - não há muito o que dizer -, até
mesmo na Idade Média cristã. Mas as pessoas sabiam que pecavam, rompiam a lei
até mesmo com pecados graves, mas continuavam a respeitar a lei rompida e nem
sonhavam em negar o pecado. Hoje, no entanto, dizem que não existem leis muito
menos pecados. [...] É isso que assusta”. Em 1974, por ocasião dos exercícios
espirituais para o clero, disse: “Não tenho vontade nenhuma de ser heresiólogo;
mas às vezes tenho uma forte tentação de apontar sinais de quietismo e
semiquietismo, de pelagianismo e semipelagianismo em escritos e discursos que
ou descrevem o trabalho pastoral como se tudo dependesse dos homens ou falam de
nós, pobres homens, como se não tivéssemos mais de nos preocupar com o
pecado...”. E respondeu decidido aos sacerdotes que lamentavam uma queda no
número de confissões: “O pecado mortal saqueia nossas almas. Rouba da alma a
graça. Vocês estudaram o tratado De gratia e conhecem os
efeitos da graça na alma. [...] A confissão é o banco a partir do qual se
distribui o sangue de Cristo, é uma cruz vermelha em que se consertam os ossos
quebrados pelo pecado. Uma coisa portentosa. [...] Mas repito, como é que as
pessoas podem se confessar se vocês não lhes explicarem claramente o exame de
consciência, a dor, o propósito e as outras coisas? E repito, sobretudo: quem é
que vai se confessar se vocês não disserem o que é a graça de Deus e o quanto é
preciosa?”.
Fonte: http://www.30giorni.it/
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