São Gregório de Nissa | FASBAM |
A Questão da Relação Corpo e Alma em Gregório de Nissa
A filosofia grega,
de maneira geral, foi caracterizada por um desprezo com relação ao corpo e,
inversamente, por uma valorização da alma. Este chamado “dualismo” entre o
corpo e a alma se encontra marcado, sobretudo, em Platão que concebe o corpo
como a prisão da alma. Na verdade, para Platão, o corpo nada mais é do que
uma morada da alma por um determinado tempo até́ ela transmigrar para outros
corpos e, finalmente, chegar ao Hades. Todavia, a alma se apresenta também
como a faculdade por excelência do conhecimento, tanto intelectual quanto
moral. Neste sentido, e ao que tudo indica, Platão foi, o primeiro a
desenvolver, de maneira racional e sustentada ao longo de seus diálogos, a
questão da imortalidade da alma. Nele se encontra também a divisão
tripartite da alma. Deve- se, no entanto, notar que, embora Platão o faça de
maneira racional, ele está́ constantemente fazendo apelo ao mito para
demonstrar a imortalidade da alma. Assim, o que nos chama mais a atenção na
filosofia de Platão é a problemática da imortalidade da alma, a sua
tripartição e valorização com relação ao corpo. São estas as principais
teorias platônicas de que Gregório de Nissa se utilizou para explicar a
relação entre o corpo e a alma.
Porém, a filosofia
platônica é apenas uma base para o desenvolvimento do pensamento de Gregório
de Nissa que culmina, justamente, nas Sagradas Escrituras, sobretudo em São
Paulo, no que diz respeito à concepção do corpo, da alma e de suas
relações fundamentais. Evidentemente, Gregório inclui também, nas suas
análises da alma e do corpo, a doutrina paulina da ressurreição. Trata-se,
portanto, de um corpo glorioso, ou de luz.
Além de Platão,
nós analisamos, embora de maneira breve, o pensamento de Aristóteles. Com
efeito, Gregório de Nissa não foi tão influenciado pelo Estagirita como o
fora por Platão. Na esteira de Platão, destacamos também o pensamento de
Plotino naquilo que diz respeito à valorização da alma e do espírito com relação
ao corpo. No tocante ao estoicismo, a influência deste movimento sobre o Nisseno foi
principalmente moral e também, do ponto de vista ontológico, destacamos a questão
do macrocosmo e do microcosmo. Isto quer dizer que o homem é uma miniatura, ou
um resumo, do grande cosmos. No que se refere ao pensamento cristão, Gregório
de Nissa foi, além das Escrituras, diretamente influenciado por Origenes. Na
verdade, os seus contatos com o grande mestre alexandrino remontam à sua infância.
A partir destas considerações,
em Gregório de Nissa, o ser humano é um composto de corpo, alma e espírito e
que ele forma uma unidade indissociável, essencial, substancial. Isso nos
remete tanto às ideias de Origenes quanto, mais diretamente, às do apóstolo
Paulo. Em Paulo, com efeito, o ser humano se apresenta como uma unidade
completa – corpo, alma e espírito – que deve estar sempre em referência a Deus,
como criador, e a Jesus Cristo como salvador. Desta composição essencial do
homem, e de sua referência a Deus, decorrem as outras doutrinas paulinas
relativas à liberdade, ao mal, ao pecado, à carne, à morte e à ressureição.
São, pois, estas questões
que irão influenciar fundamentalmente o pensamento de Gregório de Nissa que,
conforme já dissemos, é tributário da filosofia grega (Platão), das
Escrituras e do pensamento cristão: Origenes, sua avó, sua irmã̃ Macrina e seu
irmão Basilio Magno. O pensamento do Nisseno não é exclusivamente platônico,
origeneano ou paulino. Ele é, na verdade, imbuído destas três fontes, ao mesmo
tempo em que elabora e cria o seu próprio pensamento, mas em referência à tradição
que o precedera.
O pensamento do
Nisseno, principalmente na obra A criação do homem, gira em torno
da doutrina da participação, com base no dito de Gn 1,26: Façamos o homem à
nossa imagem e semelhança. Com esta afirmação, o Nisseno lança-se na questão da
criação do mundo e, consequentemente, do homem. O homem se apresenta no seu
universo numa escala gradativa, ou seja, desde as coisas mais ínfimas até́ os
seres mais perfeitos. Ele está́, pois, colocado num entre-dois, isto é, entre
o mundo dos brutos e o mundo das criaturas espirituais, que são os anjos. No
homem, com efeito, se encontra não somente a sensibilidade – como nas criaturas
irracionais – mas também a inteligência, o nous. É pelo nous que o homem
manifesta a sua semelhança com o Criador. Na perspectiva de Gregório de Nissa,
ele é um ser unitário, composto de corpo, alma e nous.
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