O cristianismo e as religiões | Politize! |
COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL
O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES
(1997)
b. "Paschali mysterio consociati"
71. A constituição dogmática sobre a Igreja Lúmen gentium fala
de uma ordenação gradual à Igreja do ponto de vista do chamado universal à salvação,
que inclui o chamado à Igreja. Pelo contrário, a constituição pastoral Gaudium
et spes abre uma mais ampla perspectiva cristológica, pneumatológica e
soteriológica. O que se diz dos cristãos vale também para todos os homens de
boa vontade, em cujos corações atua a graça de modo invisível. Também eles
podem ser associados pelo Espírito Santo ao mistério pascal, e podem, por
conseguinte, ser conformados com a morte de Cristo e caminhar ao encontro da
ressurreição (cf. GS 22).
72. Quando os não-cristãos, justificados mediante a graça de Deus, são
associados ao mistério pascal de Jesus Cristo, o são também com o mistério de
seu corpo, que é a Igreja. O mistério da Igreja em Cristo é uma realidade
dinâmica no Espírito Santo. Ainda que falte a essa união espiritual a expressão
visível da pertença à Igreja, os não-cristãos justificados estão incluídos na
Igreja "corpo místico de Cristo" e "comunidade espiritual"
(LG 8). Nesse
sentido, os Padres da Igreja podem dizer que os não-cristãos justificados
pertencem à ecclesia ab Abel. Enquanto estes são reunidos na Igreja
universal junto ao Pai (cf. LG 2), não serão
salvos aqueles que pertencem certamente "ao corpo" mas não "ao
coração" da Igreja, porque não perseveraram no amor (cf. LG 14).
73. Por isso, pode-se falar não só em geral de uma ordenação à Igreja
dos não-cristãos justificados, mas também de uma vinculação com o mistério de
Cristo e de seu corpo, a Igreja. Porém, não se deveria falar de uma pertença,
nem sequer de uma pertença gradual à Igreja, ou de uma comunhão imperfeita com
a Igreja, reservada aos cristãos não-católicos (UR 3; LG 15); pois a
Igreja, por sua essência, é uma realidade complexa, constituída pela união visível
e pela comunhão espiritual. É claro que os não-cristãos que não são culpáveis
de não pertencer à Igreja entram na comunhão dos chamados ao Reino de Deus,
mediante a prática do amor a Deus e ao próximo; tal comunhão se revelará
como Ecclesia universalis na consumação do Reino de Deus e de
Cristo.
c. "Universale salutis sacramentum"
74. Enquanto se partia da suposição de que todos os homens entravam em
contato com a Igreja, a necessidade da Igreja para a salvação foi entendida
sobretudo como necessidade de pertença a ela. Desde que a Igreja se fez
consciente de sua condição de minoria, tanto diacrônica como sincronicamente,
passou para o primeiro plano a necessidade da função salvífica universal da
Igreja. Essa missão universal e essa eficácia sacramental em ordem à salvação
encontraram sua expressão teológica na denominação da Igreja como sacramento
universal de salvação. Como tal, a Igreja está a serviço da vinda do Reino de
Deus, na união de todos os homens com Deus e na unidade dos homens entre si (cf. LG 1).
75. De fato, Deus se revelou como amor não só porque nos dá já agora
parte no Reino de Deus e em seus frutos, mas também porque nos chama e libera
para a colaboração na vinda de seu reino. Assim, a Igreja não é só sinal, mas
também instrumento do Reino de Deus que irrompe com força. A Igreja leva a cabo
sua missão como sacramento universal de salvação na martyria, liturgia e diakonia.
76. Por meio da martyria do evangelho da redenção universal
levada a cabo por Jesus Cristo, a Igreja anuncia a todos os homens o mistério
pascal de salvação que se lhes oferece ou do qual já vivem sem sabê-lo. Como
sacramento universal de salvação, a Igreja é essencialmente uma Igreja
missionária. Pois Deus, em seu amor, não só chamou os homens para alcançar sua
salvação final na comunhão com ele. Mais propriamente, pertence à plena vocação
do homem que sua salvação não se realize no serviço da "sombra do que
devia vir" (Cl 2,17),mas no pleno conhecimento da verdade, na comunhão do
povo de Deus e na ativa colaboração para a vinda de seu Reino, fortalecido pela
segura esperança na fidelidade de Deus (cf.AG 1-2).
77. Na liturgia, celebração do mistério pascal, a Igreja
cumpre sua missão de serviço sacerdotal representando toda a humanidade. Num
modo que, segundo a vontade de Deus, é eficaz para todos os homens, faz
presente a representação de Cristo que "se identificou com o pecado, por
nós" (2Cor 5,21), e em nosso lugar foi "suspenso no madeiro" (Gl
3,13) para nos livrar do pecado (cf. LG 10).
Finalmente, na diakonia, a Igreja dá testemunho da doação amorosa
de Deus aos homens e da irrupção do reino da justiça, do amor e da paz.
78. À missão da Igreja como sacramento universal de salvação pertence
também "que todo o bem que se encontra semeado na coração e na mente dos
homens, não só não pereça, mas seja curado, elevado e aperfeiçoado" (LG 17). Pois, às
vezes, a ação do Espírito precede inclusive visivelmente a atividade apostólica
da Igreja (AG 4), e sua ação
pode se manifestar também na busca e na inquietude religiosa dos homens. O
mistério pascal ao qual, do modo que Deus conhece, todos os homens podem ser
incorporados, é a realidade salvífica que abraça toda a humanidade, que une de
antemão à Igreja os não-cristãos aos quais ela se dirige e ao serviço de cuja
revelação deve sempre estar. Na medida em que a Igreja reconhece, discerne e
faz seu o verdadeiro e o bom que o Espírito Santo operou nas palavras e nos
feitos dos não-cristãos, converte-se cada vez mais na verdadeira Igreja
católica, "que fala em todas as línguas, que entende e abarca todas as
línguas no amor, e supera dessa forma a dispersão de Babel" (AG 4).
77. "Assim, esse povo messiânico, embora não compreenda de fato
todos os homens e muitas vezes apareça como uma pequena grei, é no entanto,
para toda a humanidade, o germe mais firme de unidade, de esperança e de
salvação. Constituído por Cristo para ser uma comunhão de vida, de caridade e
de verdade, é assumido também por ele para ser instrumento de redenção, e é
enviado a todo o mundo como luz do mundo e sal da terra (cf. Mt 5,13-16)"
(LG 9).
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