Esses dias na casa da Mãe
Aparecida foram uma oportunidade para experimentarmos a comunhão a partir da
riqueza de nossas diversidades.
CNBB -
Aparecida
A “Mensagem
da CNBB ao povo brasileiro” elaborada e aprovada pela quase totalidade dos 326
bispos ativos e parte dos 157 bispos eméritos brasileiros presentes na 60ª
Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foi
apresentada pelo arcebispo de São Paulo, cardeal Odilo Pedro Scherer, durante a
Coletiva de Imprensa desta sexta-feira, 27 de abril, no Centro de Eventos Pe.
Vítor Coelho de Almeida.
A íntegra
abaixo:
Aparecida - SP, 28 de abril de 2023
MENSAGEM DA CNBB AO POVO BRASILEIRO
“Ele é a
nossa paz: de dois povos fez um só, em sua carne derrubando o muro da inimizade
que os separava” (Ef. 2,14) Animados pelo amor do Pai, pela luz do Senhor
ressuscitado e com a força do Espírito Santo, nós, bispos católicos, nos
reunimos em Aparecida para a 60ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil-CNBB. Fizemos isso como pastores em comunhão com os
presbíteros, diáconos, religiosos e religiosas, consagrados e consagradas,
cristãos leigos e leigas. Sentimo-nos acompanhados pela oração de nosso povo,
representado visivelmente pela multidão de peregrinos de todo o Brasil, que rezaram
conosco nas celebrações eucarísticas. Maria, Mãe de Jesus, a Senhora Aparecida,
esteve perto de nós, acolhendo-nos, cuidando de nossos trabalhos e intercedendo
por nós.
Esses dias
na casa da Mãe Aparecida foram uma oportunidade para experimentarmos a comunhão
a partir da riqueza de nossas diversidades. Quem nos une é Cristo e, por ele,
esperançosos e comprometidos, renovamos nossa opção radical e incondicional com
a defesa integral da vida que se manifesta em cada ser humano e em toda a
criação.
A renovação desse compromisso com a vida dá-se num tempo marcado por grandes desafios que, longe de nos desanimarem, estimulam a Igreja na promoção do Reino de Deus. Nossas comunidades estão respondendo, com solidariedade fraterna, às consequências das tragédias socioambientais; com compromisso cidadão na defesa da democracia e, com responsabilidade social, ao drama da fome que nos assola. Com alegria, reconhecemos que esse é o autêntico e eficaz testemunho de que o mundo necessita, à luz da Palavra de Deus, pois não temos ouro nem prata, mas trazemos o que de mais precioso nos foi dado: Jesus Cristo ressuscitado (cf. At. 3,6).
Essa
alegria é consequente e, por isso, nos faz enxergar também os sofrimentos
presentes na sociedade. Nossa atenção se volta especialmente para o que estamos
vivendo: “uma terceira guerra mundial em pedaços” (Papa Francisco, em 13 de
setembro de 2014, ao lembrar o início da Primeira Guerra Mundial,), evidenciada
no solo ucraniano, mas também em outras regiões do planeta. Além do flagelo das
guerras, muitas outras situações nos preocupam, como os autoritarismos, as
polarizações, as desinformações, as desigualdades estruturais, o racismo, os
preconceitos, a corrupção, a banalização do mal e das vidas, as doenças, a
drogadição, o tráfico de drogas e pessoas, o analfabetismo, as migrações
forçadas, as juventudes com poucas oportunidades, as violências em todas as
suas dimensões, o feminicídio, a precarização do trabalho e da renda, as
agressões desmedidas à “casa comum”, aos povos originários e comunidades
tradicionais, a mineração predatória, entre tantas outras, que fragilizam o
tecido social e tencionam as relações humanas.
Certa
cultura da insensibilidade nos conduz a essas situações extremas. A degradação
da criação e o descaso com os mais pobres e abandonados estão presentes, por
exemplo, na criminosa tragédia ocorrida com o povo Yanomami. O mesmo ocorre com
muitos dos povos das florestas, das águas e do campo, submetidos a graves e
duras realidades que os expõem à globalização da indiferença.
Reconhecemos
a importância da resistência histórica do movimento indígena, cujo fruto se
traduz na chegada de suas lideranças a diversos postos de decisão no governo
federal e em alguns governos estaduais. Contudo, essa presença não pode ser
apenas figurativa. Há uma imensa necessidade de se adotarem providências e
ações concretas em defesa desses povos. Não podemos mais aceitar em nossa
história o descaso com os povos originários. Acreditamos que o julgamento da
tese do marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal, no próximo mês de junho,
seja decisivo para que suas terras sejam reconhecidas como legítimas e legais.
Temos esperança que essa definição venha a ser um passo importante para a
garantia dos direitos constitucionais.
Esses
problemas têm origem na opção por um modelo econômico cruel, injusto e
desigual. Por trás da palavra “mercado” existe um sistema financeiro e
econômico autônomo, que protagoniza ações inescrupulosas, destrói a vida,
precariza as políticas públicas, em especial a educação e a saúde, adota juros
abusivos que ampliam o abismo social, afeta a cadeia produtiva e reduz o
consumo dos bens necessários à maioria do povo brasileiro.
Às vésperas
do dia 1º de maio, saudamos os trabalhadores e as trabalhadoras de nosso País,
com as palavras do Papa Francisco: “O mundo do trabalho é prioridade humana, é
prioridade cristã, a partir de Jesus trabalhador. Onde há um trabalhador, ali
há o olhar do amor do Senhor e da Igreja. Lugares de trabalho são lugares do
povo de Deus” (Encontro com Trabalhadores em Gênova, Itália, 2017). Diante das
mudanças do mundo do trabalho, percebemos que promessas de crescimento
econômico, geração de empregos, melhores condições de trabalho, aumento de
renda, redução da carga horária, mais tempo de descanso e convivência social,
enfim, condições mais saudáveis de vida, continuam sendo desafios sem soluções.
A crescente informalidade das relações trabalhistas reduz a segurança social e
impede o acesso ao mínimo para a sobrevivência. O trabalho análogo à
escravidão, presente em todo o território nacional, é uma chaga social que
precisa ser energicamente combatida pelos poderes constituídos e por toda a
sociedade.
As
constatações desses tempos difíceis não podem nos limitar, nem servir para que
as soluções sejam adiadas. As estruturas do Estado, os poderes da República, as
autoridades públicas, as lideranças sociais, as organizações religiosas, os
meios de comunicação, as plataformas e as redes sociais, cada um e cada uma,
com sua competência, devem apoiar-se reciprocamente para o bem do País.
Precisamos criar um “espaço de corresponsabilidade capaz de iniciar e gerar
novos processos e transformações. Sejamos parte ativa na reabilitação e apoio
das sociedades feridas” (Fratelli Tutti, 77). Assumindo nosso dever social, não
podemos deixar de cobrar dos governos, legitimamente eleitos, o protagonismo
que lhes foi confiado, uma opção clara e radical pela vida, desde a concepção
até à morte natural, passando inevitavelmente pelos direitos sociais e humanos.
Chamamos a atenção para a importância da vacinação, especialmente para das
crianças. No cuidado com a vida, nenhuma seletividade pode ser tolerada e será
sempre, por nós, denunciada.
Conclamamos
toda a sociedade brasileira a construir um amplo projeto de reconciliação e
pacificação, a partir de um diálogo franco e aberto, que possibilite superar o
que nos afasta, com o objetivo de assegurar o que nos une: o país, o seu povo e
a criação. O ponto de partida dessa construção se dá nas famílias, comunidades,
relações sociais, profissionais, eclesiais e políticas, através da amizade
social que promove a cultura do encontro. Como comunidade de fé, cremos que sua
concretização passa necessariamente pelas nossas orações. Rezemos, pois, como
nos pede o Papa Francisco, pelo fim das guerras, dos conflitos e das
violências. Somos “caminhantes da mesma carne humana, como filhos desta mesma
terra que nos alberga a todos, cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas
convicções, cada qual com a própria voz” (Fratelli Tutti, 8).
Reafirmamos
nossa profunda confiança no povo brasileiro. Não tenhamos medo. A esperança é a
nossa coragem! Sejamos semeadores de mudança, de solidariedade e de vida. Pelo
amor do Cristo vivo e ressuscitado, por intercessão de Nossa Senhora Aparecida,
Padroeira do Brasil, invocamos a bênção de Deus sobre o povo brasileiro, suas
famílias e comunidades.
Dom Walmor
Oliveira de Azevedo Arcebispo de Belo Horizonte - MG Presidente da CNBB
Dom Jaime
Spengler Arcebispo de Porto Alegre - RS - 1º Vice-Presidente
Dom Mário
Antônio da Silva Arcebispo de Cuiabá - MT - 2º Vice-Presidente
Dom Joel Portella Amado Bispo auxiliar do Rio de Janeiro - RJ Secretário-Geral
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt
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