Os enganos que o demônio usa
para que deixemos o caminho da virtude
O engano do qual se serve o demônio para nos
atacar se manifesta quando seguimos o caminho da virtude com retidão. Ele
consiste em diversos bons desejos que provocam em nós a queda da virtude para o
vício.
Por exemplo: uma pessoa doente
suporta a sua enfermidade com grande valentia. O que fará o astuto inimigo,
sabendo que ela poderá dessa forma alcançar a virtude da paciência? Sugerirá à
pessoa enferma muitas boas ações que ela poderia realizar se estivesse em
situação diversa, e fará o possível para convencê-la de que serviria melhor a
Deus e seria mais útil a si mesma e aos demais se tivesse saúde. Esse desejo
vai crescendo a tal ponto que põe em desassossego a pessoa que não consegue
realizar o que quer. E quanto mais cresce o desejo, mais cresce a inquietação,
da qual o inimigo se aproveita para conduzi-la pouco a pouco à impaciência e à
rebeldia contra a doença, não por esta mesma, mas pelo impedimento de realizar
as boas obras às quais tanto aspirava, buscando um bem maior.
Tendo-a conduzido a esse ponto,
é fácil ao diabo fazer com que a pessoa se esqueça da sua principal obrigação
(servir a Deus) para buscar somente os meios de se livrar da doença.
Ao ver que isso não acontece,
ela se inquieta de tal maneira que perde totalmente a paciência; e então, sem
se dar conta, perde a virtude que praticava e cai no vício contrário.
A maneira de se opor a esse
engano é não alimentar bons desejos que não possam ser realizados no momento,
evitando assim a inquietação de não os poder realizar. Para isso, com
humildade, paciência e resignação, convence-te de que teus desejos não teriam o
efeito esperado, pois és mais fraca e incapaz do que imaginas. Ou então pensa
que Deus, por algum desígnio oculto ou devido aos teus pecados, não deseja que
realizes essa boa obra, mas sim que te humilhes e te rebaixes, aceitando com
paciência a Sua vontade (1Pd 5,6).
Do mesmo modo, se o teu diretor
espiritual ou qualquer outra causa te impedem de praticar alguma devoção do teu
gosto, especialmente receber a comunhão, não te deixes abater e nem te
inquietes no desejo dela, mas, despojando-te de toda vontade própria,
entrega-te à vontade do Senhor, dizendo contigo:
“Se a divina providência não
visse em mim ingratidão e pecado, eu não estaria agora impedida de receber a
Eucaristia. Já que o Senhor me revela desta maneira a minha indignidade, seja
Ele para sempre bendito e louvado. Confio plenamente em tua bondade, meu Deus,
e creio firmemente que por este modo não desejas senão que me incline à tua
vontade e te obedeça em tudo, abrindo meu coração para que nele entres
espiritualmente e o consoles, fortalecendo-o contra os inimigos que pretendem
afastar-me de Ti. Que se cumpra tudo o que é agradável aos Teus olhos. Que a
Tua vontade seja agora e para sempre o meu alimento e sustento, meu Criador e
Redentor. Só esta graça Te peço, meu divino Amor, que minha alma seja
purificada e limpa de qualquer coisa que te possa desagradar, que esteja sempre
adornada de virtudes e preparada para a tua vinda, bem como para tudo o que
quiseres pedir a esta tua indigna criatura”.
Se observares estes princípios,
podes estar certa de que, sempre que não te for possível realizar algum bom
propósito, seja por alguma deficiência da tua natureza, seja pela ação do
demônio que te quer afastar do caminho da virtude, seja porque o próprio Deus
quer provar dessa forma a tua resignação à Sua vontade, será justamente nessa
resignação que realizarás a vontade divina. Precisamente nisso consiste a
verdadeira devoção e o serviço que Ele espera de nós.
A fim de que nunca percas a
paciência nas provações, venham de onde vierem, quero advertir-te que, mesmo
usando dos meios lícitos que Deus concede aos Seus servos, não o faças com a
intenção de ver-te livre das provações, mas apenas por que Deus o quer. Pois
não sabemos se é Sua vontade livrar-nos das provações. Se assim não fizeres,
facilmente cairás na impaciência ao ver que as coisas não sucedem segundo a tua
expectativa, ou tua paciência será defeituosa, pouco agradável a Deus e de
pouco mérito.
Finalmente, previno-te sobre um
engano muito sutil do nosso amor-próprio, que é muito hábil em dissimular e até
defender, em certas ocasiões, os nossos defeitos. Um exemplo é quando um doente
se impacienta com a sua enfermidade e tenta justificar essa impaciência
alegando para ela uma causa justa. Ele dirá que a sua impaciência não se deve à
enfermidade, mas ao remorso por ser ele mesmo o seu causador, ou pelo incômodo
que causa aos que cuidam dele, ou por outros danos que podem advir dessa
doença.
O mesmo se dá com o ambicioso,
que, perturbado por não haver obtido a dignidade que desejava, não atribui essa
perturbação à sua própria soberba e vaidade, mas a outras razões que,
entretanto, em nada o preocupam quando não estão em jogo os seus interesses.
Como o enfermo, que tanto se compadece dos que se ocupam dele, mas não sofre
igualmente quando essas mesmas pessoas se dedicam a outros doentes.
É um sinal evidente de que a
raiz de suas lamentações não está nas razões alegadas, mas unicamente no fato
de terem seus desejos contrariados. Para não caíres nesse erro, procura
suportar sempre com paciência e humildade o sofrimento e a dor, venham de onde
vierem.
Retirado do livro: “O Combate Espiritual”. Padre Lorenzo Scupoli. Ed. Cléofas.
Fonte: https://cleofas.com.br/
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