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quinta-feira, 25 de maio de 2023

Gratidão, paciência, espera. Três palavras para a Igreja na China

John Tong Hon, bispo de Hong Kong [© Associated Press/LaPresse]

Gratidão, paciência, espera.
Três palavras para a Igreja na China

Entrevista com o novo cardeal John Tong Hon, bispo de Hong Kong.

Entrevista com o cardeal John Tong Hon por Gianni Valente

O cardeal John Tong Hon se apresenta como uma pessoa simples e sorridente. Prefere os tons pacatos e um estilo low profile. Entre os novos cardeais criados por Bento XVI no Consistório de 18 de fevereiro de 2012, seu itinerário biográfico se distingue por mais de um motivo: jogador de basquete, especialista no pensamento taoísta e confuciano, cristão “de segunda geração”. Mas agora o atual bispo de Hong Kong será para todos sobretudo o sétimo cardeal chinês na história da Igreja, chamado a oferecer com maior intensidade e autoridade a sua contribuição de conselhos e avaliações equilibradas em relação à questão crucial das relações entre Santa Sé, Igreja na China e governo chinês.

O senhor hoje é bispo e cardeal. Mas, se observarmos a sua biografia, veremos que seus pais não provinham de famílias cristãs. Nenhum de seus avós foi batizado.

JOHN TONG HON: É verdade. Foi minha mãe a primeira que teve a oportunidade de entrar em contato com a fé católica. Ela desde menina frequentava o ensino fundamental na escola das irmãs canossianas, onde havia também muitas religiosas italianas. Uma vez até encontrou o núncio na China, em visita a sua escola: as irmãs escolheram justamente ela para entregar um buquê de flores ao representante do Papa. E ela ficou muito orgulhosa disso. Chegou a começar a estudar o catecismo, mas sem receber logo o batismo, pois em sua família nunca tinha havido nenhum católico. Só foi batizada depois da Segunda Guerra Mundial, quando eu já tinha nascido e tinha seis anos.

Foram anos terríveis, aqueles em que o senhor passou a sua infância.

Quando os japoneses conquistaram Hong Kong, fugimos para Macau. Depois fiquei com minha avó paterna, que vivia num vilarejo da região de Guangdong. Só no final da guerra pude reunir-me a meus pais no Cantão. Eram os anos da guerra civil. Comunistas e nacionalistas lutavam entre si no norte. Enquanto isso, as províncias do sul recebiam refugiados e soldados feridos. Os missionários americanos presentes no Cantão acolhiam e ajudavam todos aqueles que necessitavam, qualquer que fosse o lado a que pertencessem. Minha mãe e eu também ajudávamos a distribuir doações aos que retornavam da guerra e aos refugiados. Vendo o testemunho do meu pároco, Bernard Meyer, e de seus confrades missionários de Maryknoll, comecei a pensar que eu também, quando crescesse, poderia me tornar um sacerdote.

O senhor foi estudar em Roma justamente nos anos do Concílio Vaticano II.

O Concílio me ajudou muito a ampliar o olhar. Fui ordenado padre – o Concílio tinha-se encerrado havia poucas semanas – pelo papa Paulo VI, no dia da Epifania de 1966, com outros 61 diáconos de 23 países de missão, todos estudantes de Propaganda Fide.

Quase meio século depois, no último Consistório, foi o senhor quem proferiu um discurso diante do Sacro Colégio para explicar a condição da Igreja na China. O que disse a seus colegas cardeais?

Para descrever a situação na China, usei três palavras. A primeira é wonderful, surpreendente. É um fato surpreendente que nas últimas décadas a Igreja na China tenha crescido e continue a crescer, ainda que esteja submetida a muitas pressões e restrições. Esse é um dado objetivo, que pode ser comprovado também pelos números. Em 1949 havia 3 milhões de católicos na China; hoje são pelo menos 12 milhões. Em 1980, depois de iniciada a reabertura promovida por Deng Xiaoping, havia 1.300 sacerdotes. Hoje são 3.500. E há ainda cinco mil freiras, dois terços das quais pertencem às comunidades registradas no governo. E também 1.400 seminaristas, dos quais mil estão-se formando nos seminários financiados pelo governo. Há dez seminários maiores reconhecidos pelo governo e seis instituições semelhantes ligadas às comunidades clandestinas. De 1980 até hoje foram ordenados três mil novos padres, e pronunciaram seus votos 4.500 freiras. Noventa por cento dos padres estão na faixa etária dos vinte e cinco aos cinquenta anos.

Portanto, tudo vai bem?

A segunda palavra com que descrevi a situação da Igreja na China foi a palavra difficult, difícil. E a provação mais difícil que a Igreja tem de enfrentar é o controle imposto sobre a vida eclesial pelo governo por meio da Associação Patriótica dos Católicos Chineses (AP). Citei uma carta que me foi enviada por um bispo muito respeitado da China continental, que escreveu: “Em todo país socialista o governo recorre ao mesmo método, usando alguns cristãos de fachada para dar vida a organizações estranhas às estruturas próprias da Igreja, às quais entrega o controle da própria Igreja”. A Associação Patriótica é um exemplo desse modus operandi. E na Carta do Papa aos Católicos Chineses publicada em junho de 2007 está escrito que esses organismos não são compatíveis com a doutrina católica. Nós o vimos novamente nas ordenações episcopais ilegítimas impostas à Igreja entre 2010 e 2011.

Tong Hon durante a procissão do Domingo de Ramos de 2010, diante da Catedral da Imaculada Conceição, em Hong Kong | 30Giorni

Mas por que a superpotência chinesa ainda sente a necessidade de manter a vida da Igreja sob um controle tão rigoroso?

Segundo a análise de Leo Goodstadt – famoso estudioso de Hong Kong que foi também consultor do último governador britânico, Chris Patten –, há diversas razões para isso. Os regimes comunistas temem a competição da religião como fator de influência da mente do povo, de suas ideias, e eventualmente de suas ações. Eles se dão conta de que as religiões não estão desaparecendo do horizonte das sociedades humanas, e que o número dos seguidores das religiões vai aumentando. Depois do 11 de Setembro a inquietação cresceu, uma vez que vimos de novo que as ideias religiosas podem também impelir à guerra. Enfim, os novos líderes que se preparam para assumir um cargo em 2012 devem demonstrar neste momento ser comunistas leais.

Como escreveu claramente o Papa em sua Carta aos Católicos Chineses, “a Igreja católica que está na China tem a missão não de mudar a estrutura ou a administração do Estado, mas de anunciar aos homens Cristo”. Como é possível que o governo de uma nação poderosa como a China tenha medo das interferências políticas do Vaticano?

Vivemos na sociedade e a nossa vida real tem necessariamente relação com a dimensão política. Mas certamente a Igreja não é uma entidade política. Não é mesmo problema nosso a mudança dos sistemas políticos. E além de tudo, no nosso caso, isso seria totalmente impossível.

Voltemos a seu discurso no Consistório. Qual foi a sua terceira palavra?

A terceira palavra que usei para descrever a condição da Igreja na China é a palavra possible, possível. Para que entendessem o motivo dessa escolha, li outros trechos da carta do bispo que já citei. Esse bispo se dizia sereno e confiante em relação ao presente, mesmo porque olhava para os problemas de hoje também a partir das experiências que vivera nas tempestuosas décadas da perseguição, entre 1951 e 1979. Ele, naquelas duras provações, pudera experimentar que todas as coisas estão nas mãos de Deus. E Deus pode dispor das coisas de modo que até as dificuldades possam enfim concorrer para o bem da Igreja. Assim, vemos que por si só não é o aumento do controle que pode extinguir a fé. Até pode acontecer que o efeito disso seja o crescimento da unidade na Igreja. Dessa forma, o futuro pode parecer até luminoso. E nós podemos esperar com confiança a graça de Deus. Talvez a solução de certos problemas não aconteça amanhã. Mas também não será preciso esperar por um tempo distante demais.

Há quem diga que no enfrentamento dos problemas é preciso escolher entre dois caminhos alternativos: ou o caminho do diálogo, ou o caminho da defesa dos princípios. Mas na sua opinião as duas coisas são realmente incompatíveis?

Eu por minha conta estou tentando ser moderado. É preferível ser paciente e aberto ao diálogo com todos, também com os comunistas. Estou convencido de que sem diálogo nenhum problema pode ser realmente resolvido. Mas, enquanto nós dialogamos com todos, deveríamos ao mesmo tempo manter firmes os nossos princípios, sem sacrificá-los. Isso significa que, por exemplo, um novo bispo só pode aceitar a ordenação episcopal se existir o consenso do Papa. A isso não podemos renunciar. Faz parte do nosso Credo, no qual confessamos a Igreja como una, santa, católica e apostólica. E depois há também a defesa da vida, os direitos invioláveis da pessoa, a indissolubilidade do matrimônio... Não podemos renunciar às verdades de fé e de moral tal como são expostas também no Catecismo da Igreja Católica.

Às vezes tem-se a impressão de que alguns ambientes católicos de Hong Kong têm a tarefa de “medir” o grau de catolicidade da Igreja na China. É essa a missão da Igreja de Hong Kong?

A fé não vem de nós. Vem sempre de Jesus. E nós não somos os controladores e os juízes da fé dos nossos irmãos. Nós somos simplesmente uma diocese irmã em relação às dioceses que existem no continente. Assim, se elas quiserem, ficamos felizes por compartilhar com elas o nosso caminho e o nosso trabalho pastoral. E se elas estiverem em situações difíceis, enquanto nós gozamos de maior liberdade, nossa intenção é apenas tentar ajudá-las. Rogando que todos possam manter a fé, mesmo em meio às pressões a que são submetidos.

Em certos comentários, uma ampla área eclesial na China é sempre descrita como se estivesse às margens da fidelidade à Igreja. Ao mesmo tempo, é reconhecida a grande devoção dos católicos chineses. Como as duas coisas convivem?

Não me parece nunca apropriado falar da China, que é tão grande, de maneira tão incompreensiva quanto genérica. Não me convencem as afirmações segundo as quais “a fé é forte na China”, nem tampouco as que enfatizam o contrário. Tudo depende das pessoas. Há muitas boas testemunhas da fé, que oferecem a sua vida e também os seus padecimentos a Jesus. E ainda há também algumas pessoas que, impelidas pela pressão ambiental, sacrificam os princípios. São apenas alguns. Por exemplo, aqueles sacerdotes que aceitaram receber a ordenação episcopal sem ter a aprovação do Papa. Isso não pode ser bom, e nós temos de dizê-lo.

É justamente sobre os jovens bispos que se concentra a atenção de muita gente. Segundo alguns, seriam frágeis, e entre as suas fileiras haveria também alguns oportunistas. O que fazer com eles? Isolá-los? Condená-los? Justificá-los sempre e de qualquer forma?

Não, não, nada de isolamento. A primeira coisa que devemos fazer é rezar por eles. Também por aqueles que cometeram erros evidentes. E, se alguém puder aproximar-se deles, e puder ser seu amigo, que os exorte a reconhecer o que houve de incorreto em suas escolhas. E também a mandar uma carta às autoridades para explicar como aconteceram as coisas e eventualmente pedir perdão. Essa é simplesmente uma forma de correção fraterna.

As divisões entre dois grupos de católicos, os chamados “oficiais” e os chamados “clandestinos”, foram desencadeadas apenas pelas pressões e pela submissão impostas pelo governo?

Infelizmente, não. Há também muitas outras razões.

Na China também cresce o fenômeno dos sites que atacam os católicos com argumentos doutrinais e morais – a começar pelos bispos –, acusando-os de terem traído a fé e a Igreja por oportunismo ou covardia, ao cederem às ilícitas pretensões do regime. O que o senhor acha?

Acredito que a correção fraterna de que eu falava antes é feita por meio do diálogo, não dos ataques pela internet.

As dificuldades vividas pela Igreja na China envolvem o vínculo de comunhão com o bispo de Roma. Com o passar do tempo, o senhor vê o perigo de que esse laço seja percebido com menor intensidade entre o clero e entre os fiéis?

Na China, continuo a perceber uma grande devoção pelo Papa. Amam o Santo Padre, isto é certo. Estão sob pressão nesse ponto. São impedidos no seu desejo de ter contatos normais com o sucessor de Pedro. É também por esse motivo que seu desejo se torna mais forte. Eu diria que é quase natural.

John Tong Hon cumprimenta os cardeais na Basílica de São Pedro depois de receber o barrete cardinalício de Bento XVI no consistório de 18 de fevereiro de 2012 [© Reuters/Contrasto]

Gostaria de lhe fazer uma pergunta sobre um episódio de bastante tempo atrás. É verdade, eminência, que o senhor estava presente na ordenação episcopal do bispo Aloysius Jin Luxian, ocorrida há vinte e sete anos?

Sim, eu estava presente naquela missa. Era o ano de 1985. Eu, na época, era sacerdote da diocese de Hong Kong e desde 1980 dirigia o Holy Spirit Study Centre [respeitado centro de pesquisa sobre a vida da Igreja na China, ndr]. Jin me pediu que estivesse presente. Queria ter o meu apoio, naquele momento. Tinha-me contado que estivera na prisão, que queria conservar a sua fé e a sua comunhão com a Igreja universal e que mandaria cartas a Roma para refrisar a sua submissão à Sé Apostólica e ao primado do Papa. Dizia ter ponderado tudo em sua consciência, e que naquele momento histórico lhe parecia que não houvesse outro caminho senão aceitar a ordenação episcopal. Dadas as circunstâncias, lhe parecia uma escolha obrigatória para levar adiante a diocese de Xangai e salvar o seminário. Sete anos atrás a Santa Sé acolheu seus pedidos e o reconheceu como legítimo bispo de Xangai. Mas isso são águas passadas. Agora é preciso pensar no futuro...

Olhando justamente para o presente e para o futuro, o que o senhor aprendeu com as experiências daquela época?

Aprendi que time can prove, o tempo pode dar conta das coisas. Certas vezes só a longo prazo você pode reconhecer se uma coisa é certa ou errada, se uma escolha foi ditada por boas razões ou não. Na imediatez transitória do momento, não podemos julgar claramente como são as coisas. Mas a longo prazo vem à tona se pelo menos a intenção do coração era boa. Às vezes na China as situações são complicadas. Somos submetidos a pressão, não encontramos pessoas com as quais nos confrontar. Mas, se fazemos as nossas escolhas tendo no coração o amor a Jesus e à Igreja, a reta intenção no final pode ser verificada por todos, a longo prazo.

E o que isso implica, se pensarmos nos episódios controversos em que se envolveu a catolicidade chinesa?

Não nos podemos fixar no fato isolado, não podemos abrir uma sindicância sobre cada decisão, e pretender que todo gesto e toda escolha realizada pelos membros da Igreja na China sejam sempre perfeitos, em cada instante e em cada situação. Somos seres humanos, somos seres humanos! Todos nós erramos e caímos muitas vezes ao longo do caminho. Mas depois podemos pedir perdão. Se, ao contrário, o erro é isolado e se torna motivo de condenação sem apelo, quem se pode salvar? É a longo prazo que vemos se um padre ou um bispo têm no coração um propósito bom. Vemos se o que fazem é feito por amor a Deus, à Igreja e ao povo, mesmo com todos os seus erros humanos. Isto é importante: descobrir que as pessoas perseveram na fidelidade porque são movidas pelo amor de Jesus, mesmo nas situações difíceis. No final, todos o verão. E certamente Deus, que perscruta o coração de cada um de nós, o vê.

Fonte: http://www.30giorni.it/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF