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quarta-feira, 17 de maio de 2023

Ser e tornar-se irmãos na convivência sociopolítica (3/5)

Ser e tornar-se irmãos | Opus Dei

Ser e tornar-se irmãos na convivência sociopolítica

Uma das novidades mais importantes da encíclica “Fratelli Tutti” é o vínculo que ela postula entre a fraternidade e o bem comum político. Oferecemos o estudo de Maria Aparecida Ferrari, publicado no boletim Romana.

04/05/2023

2. Fraternidade social, rosto da cidadania política

Se o bem comum político é gerado pela ação conjunta do Estado e da sociedade civil, é obrigatório reconhecer que uma parte essencial desse bem comum político é a idoneidade − competência e propensão − dos cidadãos para a realização do bem pessoal e social. A ausência deste patrimônio ético torna difícil resistir, dizer “não”, por exemplo, a benefícios injustos quando é fácil obtê-los, principalmente se, como se diz com mais ou menos verdade, “todo mundo faz isso”, ou quando a conduta injusta consegue burlar os sistemas de controle legal. Em outras palavras, ser agente gerador do bem comum exige do cidadão algo mais do que a estrita obediência ao sistema jurídico estabelecido: implica um exercício de liberdade que ultrapassa os limites legais, pois exige laboriosidade, honestidade, solidariedade, prudência, subsidiariedade, confiança, temperança etc.

No exercício da cidadania assim entendida a fraternidade social toma a sua forma, de modo que quando um cidadão se relaciona com os outros com sentido de respeito e reciprocidade, desempenha com competência a sua profissão ou as suas funções, ocupa-se dos interesses comuns..., ele mostra o rosto da fraternidade no âmbito sociopolítico e, ao fazê-lo, configura o bem comum político em seu sentido mais autêntico. A Fratelli Tutti ilustra isso claramente com a parábola do bom samaritano.

Dirigindo-se aos homens de boa vontade, a todos e cada um dos homens, a encíclica convida a deixar-se interpelar por esta parábola para além da diversidade das convicções religiosas (FT 56). Recorda que o relato evangélico os convida a “fazer ressurgir a nossa vocação de cidadãos do próprio país e do mundo inteiro, construtores dum novo vínculo social”, e destaca que se trata de “um apelo sempre novo, embora seja escrito como uma lei fundamental do nosso ser: que a sociedade se oriente para a busca do bem comum e, a partir deste objetivo, reconstrua incessantemente a sua ordem política e social, o tecido das suas relações, o seu projeto humano” (FT 66).

Cada indivíduo humano encarna de alguma forma, ao longo da sua vida, um ou outro dos personagens da parábola, mas para efeitos desta reflexão vale a pena centrar-se naquele aparentemente menos central, o estalajadeiro. Este personagem, que na exegese habitual muitas vezes passa despercebido, demonstra ainda melhor do que os outros que cada pessoa, com sua vida simples e normal, pode viver a fraternidade social de forma estável e de acordo com as suas peculiaridades no campo da cidadania política.

De fato, como observa a encíclica, até o bom samaritano “precisou da existência de uma estalagem que lhe permitisse resolver o que não estava em condições de garantir sozinho, naquele momento” (FT 165). Assim, na sociedade política, todos – inclusive o próprio Estado – precisam que os cidadãos e sociedades intermediárias cumpram a sua tarefa cotidiana nos diversos âmbitos da convivência e do trabalho profissional. É necessário que todos, em suas relações, sejam continuamente estalajadeiros e, portanto, irmãos, não só no acolhimento e no cuidado do outro na família e nas várias comunidades fundadas na amizade e na confiança, mas também nos outros âmbitos de relacionamento.

Nesse sentido, as ações propriamente cívicas e políticas são também exercício de fraternidade, pois se dirigem às pessoas, da mesma forma que todo gesto fraterno de amor, de cuidado mútuo, é também uma ação cívica e política, pois constrói verdadeiramente uma sociedade melhor (FT 181). Sem dúvida, na sociedade política as relações tendem a ser extensas e anônimas, mas isso não exclui a sua dimensão fraterna. Quem, por exemplo, limpa uma praça − seja como funcionário municipal ou como usuário desse espaço − ao fazê-lo respeita e cuida de todos os outros cidadãos, mesmo que não conheçam os seus rostos e não tenham uma relação direta específica com eles; exerce a amizade cívica, o amor social ou a fraternidade social, ou seja, aquela relação de benevolência (querer o bem do outro) baseada na coparticipação e na responsabilidade comum pelo bem público. Exerce assim uma fraternidade que pode evoluir para uma virtude social, uma disposição firme e habitual de agir sempre no respeito-promoção do bem dos outros; uma virtude que, por sua vez, pode gerar inúmeras formas de solidariedade. À medida que se estenda mais para o ambiente social, essa conduta solidária também ajudará a construir a cultura de toda a cidade.

O exercício da fraternidade social traduz-se, assim, na personificação do estalajadeiro no cotidiano nas diversas áreas de relacionamento: respeitar as regras de trânsito ao dirigir, pagar impostos, realizar o trabalho com responsabilidade e eficiência, não admitir práticas ilícitas (“subornos” , corrupção etc.) em benefício próprio ou alheio, dar importância às boas maneiras, comportar-se honestamente em todas as situações, usar a inteligência criativa para atender às necessidades próprias e alheias.

Maria Aparecida Ferrari* Professora Associada de Ética Aplicada na Faculdade de Filosofia da Pontifícia Universidade da Santa Cruz (Roma)

Fonte: https://opusdei.org/pt-br

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF