Percorrendo nove estados
brasileiros, Yvan Junior deu vida ao Projeto Mochileiro Missionário. Durante
todo o ano de 2022, o cearense evangelizou em paróquias e comunidades, gerando
também o Projeto Mochila Solidária.
Luiz Felipe
Bolis – Massaranduba, Diocese de Campina Grande
Yvan
Junior, registrado Francisco Ivon da Silva Junior, ousou escrever uma história
missionária pelas estradas do Brasil. Fossem estas de asfalto, de terra, as
grandes rodovias ou os caminhos jamais mapeados, em todos os chãos Yvan enxergava
uma oportunidade para levar a Boa Nova a corações sedentos de Deus.
Terço de
Nossa Senhora nas mãos. Mochila nas costas. Bíblia junto aos pertences. Pés
firmes de uma Igreja em saída por terras brasileiras. Os primeiros suspiros de
2022 e os novos sopros de evangelização na alma itinerante do jovem de 27 anos.
Yvan sequer
imaginava que daquele 01 de janeiro em diante contemplaria 365 dias de
surpresas nas pegadas da missão, além de percorrer 3 mil quilômetros a pé, 9
mil quilômetros de carona, 9 estados brasileiros, 91 cidades e uma infinidade
de filhos e filhas de Deus encontrados pelo caminho. O cearense da cidade de
Jaguaribe aceitou o chamado de deixar a sua querida “terra do queijo coalho,
renda de filé e Virgem das Candeias” para seguir aonde aprouvesse.
O Senhor
chama. E mais: transforma. De Abrão o homem recebe o nome de Abraão. De
Francisco Ivon passa a ser Yvan Júnior, mochileiro, aspirante franciscano, um
escolhido. A pedido de Deus, o servo segue à terra por Ele confiada. O desígnio
divino o torna profeta das nações e o envia sob os ares da juventude. Promessas
que nascem da voz do Pai desde o Gênesis até os escritos de Jeremias.
Os pés de
Yvan já vinham de uma extensa caminhada de fé e vocação. Em 2014, ele fez a
primeira grande mochilagem de Jaguaribe/CE até Aparecida do Norte/SP,
percorrendo mais de 2.500 quilômetros de carona para pagar uma promessa e
agradecer pela cura do avô. Anos depois, nos tempos de seminarista, o Papa
Francisco lhe mostrou o verdadeiro sentido da evangelização nas páginas da
Encíclica Evangelii Gaudium.
“Eu lia as
páginas no momento pessoal de oração e pensava: ‘por que não viajar de carona e
conversar com as pessoas, já que eu gosto tanto da estrada? Por que não usar
disso de toda essa aventura de fazer trilhas, de conhecer outras cidades,
conhecer outras realidades como uma ferramenta para também levar o evangelho
para os que estão na estrada? Em 2021 eu cheguei até o noviciado, deixei a
caminhada de seminarista e fiquei me perguntando o que faria no novo ano que se
aproximava. Daí pensei em tirar o Projeto Mochileiro Missionário do papel e
colocá-lo em prática”, sublinha Yvan Junior.
Pelo Brasil
ele foi desbravando Brasis e descobrindo as respostas de Deus para a sua nação
e especialmente para a sua própria vida. No rosto um sorriso. A alegria do
Evangelho. O testemunho de uma vida tão iluminada quanto o sol que cobre toda a
Jaguaribe. Luz de Cristo.
Nos caminhos da Terra de Santa Cruz
Ceará,
Paraíba, Pernambuco, Bahia, Minas, São Paulo, Paraná, Goiás e Pará foram os
estados brasileiros onde Yvan peregrinou. “Raramente eu me identificava como um
missionário nessas peregrinações. Eu era um mochileiro. E nas conversas as
pessoas iam descobrindo que eu era um missionário, que eu tinha uma Boa Nova
para trazer. Uma Boa Nova que talvez eles já conheciam e que estava
adormecida”, comenta.
No primeiro
nascer do sol de 2022, ele se despediu da família e partiu de manhã cedo pela
BR 116, levando a carta de apresentação escrita e assinada por seu pároco,
indicando que estava apto a promover momentos de evangelização em paróquias e
comunidades. O filho do Francisco e da Valdeir e irmão da Beatriz e da Cláudia
enfrentou o peso da mochila, os pregos da saudade, os pés calejados de bolhas,
as dores pelo corpo e as provações vindas de todas as partes. A estrada, grande
escola, foi para Yvan Junior lugar de encontro consigo, com o outro e com Deus.
No decorrer
do ano, Yvan falou de Cristo a pessoas de todas as idades, foi muito bem quisto
pelas comunidades paroquiais por onde passou e em algumas cidades foi convidado
a permanecer por semanas. A cada sete dias ele planejava o roteiro da semana
seguinte, sob o agir do Espírito Santo.
Entre as
principais atividades desenvolvidas, o cearense visitou famílias, conviveu com
moradores em situação de rua, realizou celebrações da palavra, rezou o terço de
Nossa Senhora com várias pessoas, visitou os santuários da Menina Benigna e do
Padre Cícero em seu estado, trilhou o Caminho da Fé entre São José do Rio
Preto/SP e Aparecida do Norte/SP. Yvan fez-se um entre todos, um cristão, um
outro Cristo.
“No Caminho
da Fé, quando eu chegava nas pousadas e as proprietárias descobriam que eu era
missionário - porque as notícias correm -, elas não queriam cobrar e nem que eu
trabalhasse. Elas pediam que eu realizasse celebrações da palavra para as
pessoas que estavam na pousada, os peregrinos do Caminho. Então foi como um
retiro espiritual para mim e para todos”, recorda-se.
Estar entre
pessoas sempre foi o intuito de Yvan e de seus itinerantes dias. Em
Curitiba/PR, ele participou da Festa de Jesus das Santas Chagas, partindo para
o estado de Goiás em seguida.
“Quando eu
cheguei a Goiás, eu não sentia a minha perna direita e tive que retornar para
São Paulo. Eu tive um rompimento no ligamento do joelho e isso me
impossibilitou de andar. Senti muita dor. E eu só queria encerrar o projeto
chegando a Belém, porque era um sonho passar pela Festa do Círio de Nazaré. Um
colega mandou uma frase da Madre Teresa de Calcutá para mim, dizendo: ‘Deus me
chamou a ser fiel e não bem-sucedido’, e aquilo me acalmou”, partilha.
Muito mais
mensagens chegavam ornadas de agradecimentos e de frutos gerados pela missão,
desde motoristas que caridosamente deram uma carona a Yvan até os que
participaram de encontros de oração por ele celebrados. Com as devidas melhoras
do corpo, um sacerdote da Arquidiocese de Belém e também servo da Comunidade Obra
de Maria foi canal do agir da Providência divina para Yvan, informando que uma
senhora benfeitora iria custear as passagens de avião até o Pará.
“Passei
todo o Círio de Nazaré em Belém. Preguei para jovens, participei da vida
comunitária em uma comunidade, fiquei muito encantado com o Círio de Nazaré e
depois voltei para São Paulo, desenvolvendo atividades com a Ajuda À Igreja Que
Sofre e acompanhando as vocações franciscanas, junto às quais Deus despertou a
minha vocação para o carisma. Nós distribuíamos marmitas para os irmãos de rua
e fazíamos outras ações”, afirma.
De todas as
certezas, Yvan destaca que é a de ter sido o principal evangelizado pelo
projeto e pelas pessoas que encontrou. Recorda-se do terço rezado com o
caminheiro que o deu carona, das lágrimas que o motorista derramou. O
caminheiro, depois de expressar toda a fé posta naquela devoção, visitou na
memória as mulheres de sua família e a Igreja Católica, que há dez anos não
frequentava.
Em outro
momento e em uma estrada de terra, uma simpática mulher ofereceu carona ao
jovem, o conduziu até o centro de uma cidade e, enquanto dirigia, contou-lhe
que havia sofrido traições, que perdeu grande parte de seus bens materiais e
que tinha recebido grandes golpes da vida, motivos estes para ter pensando em
pular da ponte minutos antes de avistar Yvan e ter escutado uma voz lhe dizendo
para desistir do plano e ir de encontro ao mochileiro. Yvan disse a ela
confortantes palavras e, bastante agradecida, foi vista à noite na Casa do Pai
para a santa missa.
No Caminho
da Fé, no estado de São Paulo, Yvan trilhou a rota ao lado de três mulheres que
se apresentaram como católicas não-praticantes. Após os conselhos do
missionário, estas foram tocadas a reiniciar uma caminhada de amor nos mandamentos
da Igreja. As mulheres começaram a participar ativamente de suas comunidades e
semanas depois agradeceram ao jovem pelo apoio na fé.
Os
testemunhos iam surgindo como frutos na terra semeada pelos esforços de Yvan.
Certa vez, um garoto com muita fome lhe pediu uma marmita para se alimentar.
Yvan deu-lhe todo o dinheiro que tinha e recebeu de Deus a resposta para a
criação de um novo projeto: o Mochila Solidária. Inúmeras pessoas em situação
de rua puderam ser ajudadas com alimentação, produtos de higiene pessoal e
acomodação. Para suprir o projeto, rifas foram um dos recursos utilizados pelo
missionário.
“Certa vez
eu estava em uma comunidade e fui pedir comida, e a pessoa me negou. Aquilo foi
muito forte para mim. Eu chorava muito, porque eu lembrava da minha avó, que
dizia que a gente podia negar tudo às pessoas, menos comida. Eu chorava na
praça e um senhor chegou, me perguntou o motivo e eu falei para ele, já que eu
estava com muita fome àquele dia e não tinha dinheiro. Passou um carro preto,
ele fez um sinal com a mão e falou de mim para o casal de senhores dentro do
veículo. Eles me levaram para a casa deles, me deram comida. Estes participavam
de uma igreja protestante e eu falei que eles eram sinal da Providência de Deus
em minha vida”, cita o jovem.
Em janeiro
de 2023, os pés de Yvan, hoje aspirante franciscano, puderam sentir novamente o
chão de suas origens em Jaguaribe. O sentimento de vitória o visitou. Uma
vitória assistida entre ele e Deus. A história escrita com fé, suor, sangue,
dor, perseverança e alegria. A história dessa vez escrita com os pés, não com
as mãos. E com Yvan o prêmio mais valioso de todos: a felicidade.
“Eu trouxe
de volta comigo a bandeira da minha cidade. Na Evangelii Gaudium, o
Papa cita que o discípulo é ‘um homem que faz memória’, e ter levado a bandeira
em meu ombro me lembrava que eu levava comigo a história de um povo que sofre,
que luta, que tem fé, que confia na Mãe de Deus, que reza, que celebra e que,
diante de todas as circunstância, tem esperanças. O meu povo está presente no
meu sotaque, no jeito de falar, de agir, nas minhas expressões, no meu rosto”,
diz.
Em um
convento franciscano na cidade de Ituporanga, em Santa Catarina, o mochileiro
missionário acolhe a sua nova casa, a nova missão, a nova rotina e as novas
surpresas de Deus. Em sua liberdade, Yvan escolheu obedecer nas mínimas coisas
ao seu superior, confiando ao religioso até mesmo a itinerância de seus
testemunhos sob autorização pelos lugares e momentos adequados.
“Deus nos
chama a sermos santos felizes e plenos de amor. A Igreja é viva. A Igreja é
jovem. Precisamos ser contagiados pelo Evangelho e não termos medo de sermos
santos, de renunciar – mesmo que nos doa -, de levantarmos quando cairmos. Deus
não nos tira nada, mas nos dá tudo”, sublinha.
Uma Igreja em Saída com o Papa Francisco
Francisco
Ivon tem à sua frente duas grandes inspirações: São Francisco de Assis,
baluarte de sua vocação, e o Papa Francisco, o pastor de sua Igreja.
Ao saber
que o novo Pontífice da Igreja viria ao Brasil realizar a Jornada Mundial da
Juventude em 2013, o jovem de 17 anos, sonhador desde sempre, organizou-se como
pôde com vendas e ações para ver Jorge Bergoglio de perto. Yvan viajou de avião
pela primeira vez. E viu, no Rio de Janeiro, a radicalidade das palavras de
Francisco de Assis impressas nas palavras do Papa Francisco, já naquela
emocionante missa de envio que participou.
“O Papa
Francisco está conosco há dez anos. São dez anos do agir do Espírito Santo na
Igreja e do ruah de Deus sobre a terra. Ele traz a mensagem de
um Deus que se preocupa com o homem em sua totalidade, e São João Paulo II
também realizou um importante papel para nós jovens nos motivando a termos
coragem e entusiasmo”, reflete.
Yvan
contempla o legado de Francisco para uma Igreja do encontro, a Igreja do rosto
da misericórdia de Deus, do anseio a todas as vocações, da proximidade com as
pessoas, do diálogo, da escuta, da cura das feridas, dos impulsos do Espírito
Santo, da saída para as periferias existenciais, de uma Igreja que é resposta
para as dúvidas do mundo e que está de portas abertas às pessoas e às moções de
Deus. “O maior convite dessa Igreja em Saída é que, como Francisco, sejamos
instrumentos em um mundo de paz e bem”, concluem as palavras de Yvan Junior.
O que dizer de um jovem cearense que tanto caminhou pelas estradas reais de um Brasil ainda em descoberta e de seus brasileiros? Um autêntico missionário que trilhou diversos caminhos impulsionado pelo zelo da evangelização e disposto a propagar a Boa Nova. O livro de Isaías responde: “que formosos são, sobre os montes, / os pés do mensageiro que anuncia a paz, / que traz a boa nova, e que apregoa a vitória! / que diz a Sião: o teu Deus é Rei” (52, 7).
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt
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