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segunda-feira, 31 de julho de 2023

A presença de Jesus no mundo (2/2)

Jesus ensina na sinagoga de Nazaré, painel de madeira policromo de teto pintado, segunda metade do século XII, igreja de São Martinho, Zillis, Suíça

Arquivo 30Dias – 11/2005mero 11 - 2005

A presença de Jesus no mundo

A conferência do jornalista e escritor judeu Alain Elkann no congresso sobre o “Rosto dos rostos. Cristo”, realizado em outubro, em Roma, cujas atas acabam de ser publicadas.

de Alain Elkann

Um padre rosminiano me hospedou em seu colégio no Vale de Aosta quando eu estudava para prestar alguns exames, e festejei, como todos, em 5 de agosto, a festa de Nossa Senhora das Neves.

Mais tarde, numa favela de uma cidadezinha brasileira, padre Arturo, um père da ordem de Foucauld, me fez entender o que sig­nificava dedicar a vida a Jesus e ao Evangelho e, mesmo realizando os trabalhos mais humildes, me falou muito do fascínio de Deus, dos Evangelhos e da figura de Jesus. Fez-me entender o que significa a palavra confiança, sentir uma fé profunda que guia a todos os atos da nossa vida.

O cardeal Martini me levou a refletir sobre a palavra de Deus, sobre as Escrituras, sobre o silêncio e sobre Jerusalém. Ensinou-me como era importante sentir os outros como nossos irmãos.

É verdade que Jerusalém, para mim, é a cidade judaica, a cidade em que rezamos no Muro das Lamentações, mas a presença de Jesus é fortíssima por toda parte naquela cidade. Afinal, todos sabem que Jesus era judeu, vivia ali, entre aqueles muros, naquela paisagem, naqueles lugares que hoje são sagrados também para os muçulmanos. É verdade que por toda a parte em Israel, na Palestina, se sente a presença do Cristo que lá nasceu, viveu e morreu. Mas, como já disse outras vezes, vejo o curso de nossa história judeu-cristã como o percurso de um trem que, para os judeus, partiu há mais de cinco mil anos e no qual, há dois mil anos, subiram os cristãos.

O fato de não pensar viver na era messiânica não significa que eu não tenha respeito e também sentimentos de alegria, de proximidade fraterna por aqueles que já receberam o Messias e vivem um estado de felicidade interior profunda todas as vezes que O sentem próximo.

Entendo muito bem que deve ser fascinante para quem tem a sorte de ser cristão ter fé e poder viver numa religião que permitiu poder rezar, poder dirigir-se também ao filho de Deus, que quis trazer Deus a ser homem e, portanto, imagem. Os judeus falam diretamente com Deus, mas Ele não é representado de nenhuma forma.

Não o digo me lamentando, pois tenho muito orgulho de meu destino de judeu.

Creio que se existimos há tantos anos e se nenhuma perseguição, nem a mais bárbara e mais atroz, conseguiu nos exterminar totalmente e calar-nos para sempre, isso se insira num desígnio divino que não cabe a nós, homens, entender. Acredito que o papa João Paulo II fez bem ao definir os judeus como “irmãos mais velhos”. Eles o são não por idade, mas porque mantêm em sua vida uma tradição, uma religião muito antiga, que são, de qualquer forma, a tradição e a religião de Jesus.

Não é por acaso, acredito eu, que Jesus foi judeu; sendo assim, grande parte do caminho dos judeus e dos cristãos é um caminho comum, que para uns e outros se desenvolve nos lugares descritos pela Bíblia.

O que significa a presença de Jesus no mundo de hoje? Creio que é uma das grandes mensagens de paz da humanidade, uma grande resposta de como deveria ser conduzida uma vida humana para que seja o mais feliz e serena possível.

Jesus é uma grande mensagem de esperança e de solidariedade para o mundo, que hoje precisa disso, e sua Igreja demonstrou e demonstra saber ser ainda mais uma formidável organização de paz, de caridade e de amor.

O papa é um incansável defensor do bem, da paz, dos jovens, dos doentes e dos necessitados.

Jesus, além disso, é ética, justiça, poesia e inspiração. Obras-primas da arte, nos últimos dois milênios, da música à pintura, passando pela escultura e pela arquitetura no Ocidente, foram de inspiração cristã, e a Itália é ainda hoje o testemunho vivo disso. Os crucifixos pintados e esculpidos, as cenas da vida de Cristo e dos apóstolos inspiraram os maiores artistas de todos os séculos e de todas as gerações.

Por isso também, Jesus é uma figura tão conhecida e familiar para quem não é cristão, pois pessoas de grandíssimo talento dedicaram seu trabalho a procurar interpretá-lo, imaginá-lo, como um modelo, um herói, um mártir; como um amigo.

Nesta altura eu sinto a necessidade de fazer uma pergunta. Como seria o mundo sem Jesus? Sinceramente, muito diferente e até difícil de imaginar. Os judeus são poucos e sempre foram poucos, os muçulmanos são mais recentes e vêm depois do cristianismo.

Talvez, sem os cristãos, nem houvesse muçulmanos. Talvez tivesse existido um outro filho de Deus em algum outro lugar. O fato, porém, de não se conseguir pensar na história sem Cristo significa, por si só, que Ele era uma exigência do mundo e que os homens sentiam necessidade dele.

O Rosto dos rostos. Cristo, organizado pelo Instituto Internacional de Pesquisa sobre o Rosto de Cristo, Bérgamo, Velar, 2005, 300 pp.

Acredito que seja difícil continuar, como eu já estou fazendo há tempo demais, a caminhar no vazio, ou seja, a procurar imaginar o que significa o Cristo, quando sou apenas um escritor, um jornalista.

Com o passar dos anos, tive uma grande experiência de amor e de amizade profunda que me ligou à presença cristã. Senti próximas de mim e amei ternamente pessoas de fé que tinham por Jesus um sentimento muito profundo que as inspirava e as guiava ao longo da vida. Minha esposa é católica e sempre traz consigo um rosário, que mantém por perto em todos os momentos de sua vida. Um rosário que lhe foi dado por dom Cafarra, o arcebispo de Bolonha, e que pertencia à mãe dele.

Minha esposa teve de enfrentar a vida sem uma mãe que a acompanhasse e estivesse próxima dela enquanto crescia, e acredito que sua fé em Jesus sempre a tenha ajudado a continuar em frente. Isso, para mim, é motivo de grande respeito e me faz entender o que deve ser para ela a força profunda que lhe dá a presença de Jesus em sua vida.

Mas talvez entendamos melhor a presença de Jesus no mundo vendo na televisão uma mulher indígena pele-vermelha que, em New Orleans, diz desconsolada, olhando para os destroços da sua cidade destruída: “Depois que chegou o furacão Katrina, para onde foi Jesus?”. O sentimento de abandono e de impotência diante do silêncio de Jesus, que parece tê-la deixado sozinha e abandonado sua cidade, nos diz como em sua ausência Jesus faz sentir sua falta. A mulher, na verdade, não lhe pede que se explique, mas que volte e a console, que não se afaste.

Não é uma repreensão, mas uma exigência de amor.

Fonte: http://www.30giorni.it/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF