A VIA-SACRA – II
Dom Aloísio Alberto Dilli
Bispo de Santa Cruz do Sul (RS)
(...) Na mensagem anterior, vimos
o contexto histórico em que surgiu a Via-Sacra, normalmente considerada como um
exercício de piedade, muito apreciado pelos fiéis, com o objetivo de acompanhar
os passos da condenação, paixão e morte de Jesus Cristo, através de leituras
bíblicas, de meditação e de oração. As diversas estações evocam o caminho
percorrido por Jesus nos últimos momentos de sua vida e que culminaram com a
ressurreição, trazendo-nos a salvação.
Se no programa anterior lembramos os aspectos
históricos de seu surgimento, hoje queremos refletir mais sobre o sentido da
Via-Sacra. Ela é recomendada pela Igreja, devido ao seu alto valor como
meditação da Paixão do Senhor. Atualmente encontramos grande variedade de
textos e de temáticas para a Via-Sacra. Os textos mais tradicionais, com forte
acento ao realismo descritivo do sofrimento dos personagens em evidência,
seguem muitas vezes linguagens de piedade individual e que podem conduzir a
sentimentalismos exagerados. Tendo como orientação a reforma litúrgica do
Concílio Vaticano II, hoje encontramos ricos textos de Via-Sacras, com farta
distribuição de leituras bíblicas, acompanhadas de orações, meditação e canto,
que, não poucas vezes, nos colocam bem próximos de verdadeiras celebrações litúrgicas
da Palavra, realizadas na fé e no amor da comunidade eclesial (cf. DAp 253). Em
nossos dias, com a insistente reflexão sobre o compromisso a que deve levar a
Palavra, a oração e a meditação cristã, encontramos Via-Sacras com conteúdo de
acentuado compromisso social, apontando os grandes clamores ou urgências do
mundo atual, que prolongam a agonia e a morte de Jesus em seus membros
sofredores. No Brasil, isso acontece normalmente com a Campanha da
Fraternidade, que convida os fiéis a refletir, rezar e assumir algum aspecto
específico da vida do povo de Deus, onde continua a longa via-crucis de
condenações, quedas, encontros/desencontros, dores e mortes. Em 2023, o tema
foi Fraternidade e Fome. A Via-Sacra do subsídio do Regional Sul 3
nos fez rezar assim, numa das estações (p. 43): “Senhor, queremos assumir
nossa cruz e seguir-vos! Sabemos que convosco ela se torna leve e carregada de
esperança. Com vossa presença, a cruz da partilha e da solidariedade garante a
ressurreição para nós e para tantas vidas ameaçadas de morte pela fome e o
abandono. Amém!”.
Em síntese, podemos dizer que a Igreja incentiva a Via-Sacra (caminho sagrado) ou Via-Crucis (caminho da cruz) como um exercício de piedade de grande valor, especialmente para a meditação da paixão de Jesus Cristo, relacionada com a paixão da humanidade. Sabemos que o mistério da morte e ressurreição do Senhor Jesus é especialmente tornado presente nas celebrações litúrgicas sacramentais, mas estamos também cientes que a reflexão e meditação, como da Via-Sacra, são meios que ajudam a levar os fiéis a celebrar com mais fervor e fruto os mistérios centrais do culto cristão. A liturgia celebra, torna presente o que a Via-Sacra e outras devoções meditam, rezam, conscientizam. Quanto mais a Via-Sacra for enriquecida com a proclamação da Palavra de Deus, sobretudo com textos que dão sentido às diversas estações, ela qualificará sua meditação e oração. É também sumamente importante que a Via-Sacra não perca a unidade do mistério pascal, ressaltando a morte e a ressurreição. Se isso não está implícito nas 14 estações, acrescente-se a 15ª estação com este tema. Que ela não seja uma devoção que nos aliene da vida real em que há tantos membros sofredores que suplicam por vida mais digna. Que as nossas Via-Sacras nos convidem sempre mais a seguir o amor de Jesus, que deu sua vida para nos salvar, tendo aos pés da cruz, sua e nossa Mãe, a Virgem Maria.
Fonte: https://www.cnbb.org.br/
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