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sexta-feira, 28 de julho de 2023

Celibato eclesiástico: História e fundamentos teológicos (10/15)

Celibato eclesiástico (Presbíteros)

Celibato eclesiástico: História e fundamentos teológicos.

CARD. Alfons M. Stickler

        5. A Legislação do II Concílio Trullano.

Qual foi, então, a legislação da própria Igreja Oriental frente às essas disposições imperiais? Como já foi referido, no Oriente, há uma atividade que é desenvolvida em conjunto com a igreja ocidental com a Igreja sobre questões de fé, mas nunca chegou a uma legislação comum em matéria disciplinar.  

Uma vez que o Concílio Trullano I, do ano 680/81, não tinha emitido disposições disciplinares, o imperador Justiniano II, convocou um segundo Concílio “em Trullo”, no Outono de 690. Nele se tentou reunir todas a legislação disciplinar da Igreja bizantina, e decidir as necessárias atualizações e complementos, incluindo a legalização de situações carentes, de fato, do necessário suporte normativo. Isso foi feito através da promulgação de 102 cânones, que foram acrescentados mais tarde ao antigo Syntagma adauctum, transformando-se dessa forma no último Código da Igreja bizantina. 

Toda a disciplina atualizada no que respeita ao celibato foi fixado de forma vinculativa e com sanções adjuntas em sete cânones (3, 6, 12, 13, 26, 30, 48). Este Concilio II “em Trullo”, também chamado Quinisexto, foi um Concílio da Igreja bizantina, convocado e frequentado somente por seus bispos e mantido pela sua autoridade, que se apoiava de modo decisivo na autoridade de imperador. A Igreja Ocidental não enviou delegados (embora Apocrisário, o legado de Roma em Constantinopla, assistiu a esse Concílio) e nunca reconheceu este Concílio como ecumênico, apesar das repetidas tentativas e pressões, especialmente por parte do imperador. O Papa Sérgio (687 701), que procedia da Síria, negou o reconhecimento. João VIII (872-882) só reconheceu as disposições que não eram contrários à prática de Roma, em vigor até aquele momento. Qualquer outra referência por parte dos Romanos Pontífices aos cânones “trullanos” não deve ser considerada como outra coisa além de uma consideração, com um reconhecimento mais ou menos explícito, do direito particular da Igreja oriental. 

Então, de que fontes derivam as decisões “trullanas” sobre disciplina celibatária bizantina, vinculantes até hoje? Para responder adequadamente a esta pergunta é necessário considerar antes tais disposições. 

Cân. 3: decide que todos os que depois do batismo tenham contraído um segundo matrimônio ou tenha vivido em concubinato, bem como aqueles que se tinham casado com uma viúva, uma divorciada, uma prostituta, uma escrava ou uma atriz não poderiam tornar-se nem bispos, nem sacerdotes, nem diáconos. 

Cân. 6: declara que aos sacerdotes e diáconos não estão autorizados a se casar após a Ordenação. 

Cân. 12: ordena que os bispos não podem, após a Ordenação, coabitar com sua esposa e, por conseguinte, não podem mais usar do matrimônio; 

Cân. 13: estabelece que, ao contrário da prática romana que proíbe o uso do matrimônio, os sacerdotes, diáconos e subdiáconos da Igreja oriental, em virtude de antigas prescrições apostólicas, podem conviver com suas esposas e usar dos direitos do casamento para a perfeição e ordem correta, exceto nos tempos em que prestam o serviço no altar e celebram os sagrados mistérios, devendo ser continentes durante este tempo. Esta doutrina havia sido afirmada pelos Padres reunidos em Cartago: “os sacerdotes, diáconos e subdiáconos devem ser continentes durante o tempo do seu serviço ao altar, tendo em vista o que foi transmitido pelos Apóstolos e observado desde os tempos antigos também nós o custodiemos, dedicando um tempo para cada coisa, especialmente à oração e ao jejum: assim, pois, os que servem no altar devem ser em tudo continentes durante o tempo do seu serviço sagrado, para que possam obter o pedem a Deus com toda simplicidade.” Portanto, quem ouse privar, mais além do que estabelece os cânones apostólicos, aos ministros in sacris, quer dizer, aos sacerdotes, diáconos e subdiáconos da união e comunhão com as legítimas esposas, deve ser deposto, bem como aquele que, sob o pretexto de piedade, expulsa à sua esposa e insiste na separação. 

Cân. 26: decreta que um sacerdote que por ignorância houvesse contraído casamento ilícito tem de se conformar com a sua situação anterior, mas abstendo-se de todo ministério sacerdotal. Esse matrimônio deve ser dissolvido e toda comunhão com a esposa está proibida. 

Cân. 30: permite que os que, com consentimento mútuo, querem viver continentes não devem habitar juntos; isto é válido também para os sacerdotes que residem em países bárbaros (isso é entendido como os que vivem no território da Igreja ocidental). Esse compromisso assumido é, no entanto, uma dispensa dada a esses sacerdotes por sua pusilanimidade e pelos costumes das pessoas ao redor. 

Cân.: 48: manda que a mulher do bispo, que após consentimento mútuo, se separou, deve ingressar num mosteiro depois da Ordenação do marido e deve ser mantida por ele. Pode também ser promovida a diaconisa. 

Destas disposições conciliares resulta o seguinte: o Oriente conhece bem a disciplina celibatária do Ocidente. Apela, como no Ocidente, como apoio à prática diferente, a uma tradição que remontaria até os Apóstolos. De fato, a Igreja bizantina concorda na legislação trullana com a Igreja latina nos seguintes pontos, que como no Ocidente, se fundamenta nos textos sagrados do Novo Testamento: o casamento antes da sagrada Ordenação deve ter ser apenas um, e não com uma viúva ou com outras mulheres que a lei exclui. Não é legítimo um primeiro ou sucessivo casamento após a Ordenação. Os bispos não podem mais ter convivência matrimonial com a esposa, mas devem viver em plena continência, e por isso as mulheres não podem viver com eles, mas devem ser mantidas pela Igreja. Oriente exige ainda o ingresso das esposas num mosteiro ou a ordenação dessas como diaconisas. 

A diferença substancial da prática da Igreja Oriental se refere só aos graus do Ordem sagrado inferiores ao episcopado. Para estes, a abstenção do uso do matrimônio se exige somente durante o tempo do serviço efetivo no altar, que então estava limitado ao domingo ou a outro dia da semana. 

Encontramos aqui, portanto um volta à prática vigente no Antigo Testamento, que a Igreja havia rejeitado sempre explicitamente com razões claras. Pelo contrário, a convivência e o uso do matrimônio durante o tempo livre do serviço direto não somente é defendido aqui com grande resolução, mas que qualquer atitude contrária é castigada com gravíssimas sanções. A compreensível exceção para os sacerdotes que residem na Igreja latina é declarada como uma dispensa que se concede só por causa da evidente debilidade humana de tais sacerdotes e pelas dificuldades que provêm do ambiente, entre as quais está certamente o fato da geral prática de continência do clero ocidental. 

Alfons M. Stickler
Cardeal Diácono de São Giorgio in Velabro
CIDADE DO VATICANO 

Tradução para o português:

Pe. Anderson Alves.
Contato: 
amralves_filo@yahoo.com.br

Fonte: https://presbiteros.org.br/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF