Jesus nasceu em 25 de dezembro?
Na verdade, esta data nada tem de arbitrária. Antes, possui profundas
raízes bíblicas, e é ancorada na tradição da Igreja.
Como fazemos para estabelecer o dia do nascimento de Jesus? A contagem
dos dias começa pelo anúncio do nascimento de São João Batista. A Bíblia diz:
- “Nos tempos de Herodes, rei da Judéia, houve um sacerdote por nome Zacarias, da classe de ABIAS; sua mulher, descendente de Aarão, chamava-se Isabel. Ora, exercendo Zacarias diante de Deus as funções de sacerdote, na ordem da sua classe, coube-lhe por sorte, segundo o costume em uso entre os sacerdotes, entrar no santuário do Senhor e aí oferecer o perfume” (Lc 1,5.8-9).
Pois bem, mas quando era o turno da classe de Abias?
No Primeiro Livro de Crônicas (1Crônicas
24,1-7.19), está estabelecida a ordem das 24 classes sacerdotais.
Cada uma das classes deveria servir duas vezes ao ano, por uma semana, de
sábado a sábado. A ordem sorteada e imutável foi a seguinte:
- Joiari;
- Jedei;
- Harim;
- Seorim;
- Melquia;
- Maimã;
- Acos;
- ABIAS;
- Jesua;
- Sequenia;
- Eliasib;
- Jacim;
- Hofa;
- Isbaab;
- Belga;
- Emer;
- Hezir;
- Afses;
- Feteia;
- Ezequiel;
- Jaquim;
- Gamul;
- Dalaiau;
- Maziau.
Alguns irmãos se apegam a esta ordem, alegando que não corresponde a uma
possibilidade de que o Natal fosse em dezembro, pois o ano religioso judaico,
começando por volta de março, daria ao 8º Turno, provavelmente, o final do mês
de junho, começo do mês de julho. Daí, fazendo os cálculos, Jesus teria nascido
em finais de setembro, inícios de outubro, pela festa dos Tabernáculos.
Contudo, ninguém se pergunta se a ordem dos turnos,
nos tempos de Cristo, estava estabelecida exatamente assim. A pergunta é
razoável, pois, desde os tempos da construção do Templo, o culto já havia sido
interrompido diversas vezes, e um descompasso entre os turnos e o calendário
poderia ter-se dado. E, por incrível que pareça, foi isto mesmo que
aconteceu!
Uma especialista francesa, Annie Jaubert, escreveu um artigo intitulado
“Le calendrier des Jubilées et de la secte de Qumran: Ses origines bibliques”,
in Vetus Testamentum, Suppl. 3 (1953) pp. 250-264, em que estudou o calendário
do Livro dos Jubileus, um apócrifo hebraico muito importante, do final do
século II a.C. Como muitos fragmentos desse calendário foram encontrados entre
os escritos de Qumram, vê-se que ele estava em uso nos tempos de Jesus. Este
calendário, também, é solar, e não dava os nomes dos meses, mas apenas seu
número de sucessão. E a mesma estudiosa publicou outros artigos importantes
sobre isso. Veja-se o verbete “Calendario di Qumran”, in Enciclopedia della
Bibbia 2 (1969) pp. 35- 38; e uma célebre monografia, “La date de la Cène,Calendrier
biblique et liturgie chrétienne”, Études Bibliques, Paris 1957.
Por outro lado, o especialista Shemarjahu Talmon, da Universidade
Hebraica de Jerusalém, trabalhou sobre os escritos de Qumram e sobre o
calendário do Livro dos Jubileus, e conseguiu precisar a ordem semanal
dos 24 turnos. Os resultados desta pesquisa então no artigo “The Calendar
Reckoning of the Sect from the Judean Desert. Aspects of the Dead Sea Scrolls”,
in Scripta Hierosolymitana, vol. IV, Jerusalém 1958, pp. 162-199.
Na lista que o Prof. Talmon reconstruiu, o turno de ABIAS (Ab-Jah),
prescrita duas vezes por ano, acontecia assim:
- a primeira vez, de 8 a 14 do terceiro mês do calendário; e
- a segunda vez de 24 a 30 do oitavo mês do calendário.
Ora, segundo o calendário solar (não o lunar, como o atual calendário judeu),
esta segunda vez se data assim [*]: o 2º Turno de Abias correspondia
aos dias de 24 a 30 de setembro. Portanto, quando São Lucas recolhe
esta indicação, sendo ele um atencioso narrador da história, nos dá a
possibilidade de reconstruir a data histórica do nascimento de Jesus.
Agora, resta-nos fazer as contas:
- O anúncio do nascimento de São João Batista seria no dia 24 de
setembro (no calendário ortodoxo, esta festa se celebra no dia 23 de
setembro, mesmo dia de São Pio de Pietrelcina). Note-se que esta Festa é
muito antiga na Tradição da Igreja Oriental.
- Portanto, seis meses depois, seria o anúncio a Nossa Senhora, no
dia 25 de março (festa litúrgica da Anunciação).
- Três meses depois, o nascimento de São João Batista (dia 24 de
junho, festa litúrgica do seu Natal).
- E seis meses depois, 25 de dezembro, o nascimento de Jesus
(Solenidade do Natal do Senhor).
Portanto, essas teorias de que o Natal surgiu para cristianizar a festa
pagã do “Sol Invicto”, do solstício de verão etc., não passam de banais
conjecturas.
Pe. José Eduardo
[*] Sobre estes estudos, veja-se o artigo de Tommaso Federici, “25 dicembre, una data storica”, in “30 giorni” [11/2000].
Fonte: https://presbiteros.org.br/
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