Por Carlos Padilla Esteban - publicado em 24/12/23
Aquela noite em que esperamos que aconteça o que sonhamos, que tudo mude, que algo novo comece.
A noite está quieta no Natal. Será uma noite quieta e silenciosa. Eu olho, penso e paro meus passos. Se eu tivesse um pincel, gostaria de pintar esta noite de estrelas, ou de luzes caindo e subindo. De estrelas. Assim, com um pincel.
Mas às vezes os pincéis mentem. Eles coletam vagamente em cores uma pequena parte da verdade. Apenas um pequeno esboço, um trecho da beleza mais profunda, uma pequena parte de toda a vida. Os pincéis mentem. Ou melhor, eles não dizem toda a verdade.
Porque a verdade, toda a verdade, não pode ser capturada em uma pintura, com um pincel. Os pincéis só param o tempo por um instante no fluxo da vida. Eles retratam o que acontece em uma tentativa de imortalizá-lo. Eles têm sucesso de forma desajeitada. Eles tentam manter na tela todo o mistério que não pode ser explicado com palavras.
A vida não pode ser retida com pincéis. Ela não tem valor. A vida é um vagão silencioso, escondido no tempo, puxado por Deus. Uma carruagem em movimento.
Uma carruagem cheia de mistérios que não podem ser pintados. De olhares que não falam e não podem ser retidos. De olhares cheios de palavras e emoções. De olhares profundos e lágrimas. Lágrimas cheias de alegria ou tristeza. Porque as lágrimas nem sempre contêm tristeza. Muitas vezes elas exalam alegria, esperança, emoção. Esses são os paradoxos que as lágrimas contêm.
A noite santa é um vagão carregado de silêncios. De estrelas e vida. Uma carruagem que para novamente em nossa vida. Porque a vida sempre acontece em um vagão. Qual deles é o meu? Um vagão de primeira classe? Um de segunda classe?
Talvez seja mais importante saber com quem estamos no vagão do que onde estamos no trem. Afinal de contas, todos chegam ao seu destino. Primeiro o primeiro, depois o último, mas todos chegam.
Talvez o silêncio do meu vagão seja importante. Porque é verdade que as palavras às vezes quebram o mistério sagrado dos olhares.
O silêncio da noite sagrada de Belém. Sim, especialmente o silêncio daquela noite. Maria estava em silêncio olhando para Jesus. José estava em silêncio olhando para Maria. A criança adormecida. Silêncios. Estrelas. Paz. Sorrisos.
Não quero negar que a palavra tem a beleza de uma semente lançada no deserto ou no campo. Ela carrega em seu peito oculto um mundo inteiro, uma vida inteira, um milagre prestes a nascer. É verdade que as palavras também são importantes. Escritas ou faladas. Ditas em voz baixa ou gritadas ao vento.
João falou suas palavras no deserto, foi um grito que quebrou o silêncio. A vida surgiu. Jesus passou por ali falando palavras. Às vezes em voz baixa, às vezes em voz alta.
Ele também guardava silêncios. Aqueles silêncios misteriosos, escrevendo na areia, recebendo ofensas. Às vezes um olhar é suficiente, às vezes apenas um silêncio. Um gesto claro e um silêncio, para entender o que é importante.
Na vida, há muitos encontros cheios de silêncios. Quando estou emocionado, fico em silêncio. Olho para o horizonte e fico em silêncio. Surpreso. Atônito, cheio de vida, esperando.
Como nesta noite sagrada. Esta noite em que esperamos que o que sonhamos aconteça, que tudo mude, que algo novo comece. É o silêncio sagrado de Deus diante de meus olhos. Ajoelhado em frente a um estábulo. Isso sempre me comove.
Vou me ajoelhar novamente. Não por hábito, mas porque não quero deixar de ser uma criança. Vou me ajoelhar com surpresa. O que eu espero? O que eu temo? O silêncio. O silêncio de Deus cheio de respostas.
Deus pronuncia uma palavra e eu vivo. A Criança nasce em meus braços. Fico em silêncio e vivo. Ele olha para mim e eu vivo. Espero em silêncio em meu vagão cheio de silêncios. Ele nasce novamente para me dizer que me ama. E eu o amo. A misteriosa vida de Deus entre os homens.
A vida cotidiana dos homens sem Deus. Como encontrá-lo escondido na violência, na divisão, no ódio? Como descobrir seu rastro esquivo entre as vidas em busca de significado? Fico em silêncio.
Volto-me para tantas vidas misteriosas que não buscam respostas. Elas observam o tempo passar. Elas têm muitas perguntas. O trem da vida segue em frente.
Espero com os olhos entreabertos. Estarei pronto? Direi sim a Jesus em meio ao meu silêncio? Rompê-lo-ei com aquela palavra que marca nossa vida?
Octavio Paz disse: “A liberdade é simplesmente a diferença entre dois monossílabos: sim e não”. Eu escolho a liberdade novamente. Sim, quero seguir seus passos.
Vou me ajoelhar como uma criança. Eu confio. Espero. Sonho. De joelhos, é mais fácil estar no nível da criança. E de sua mãe. Estarei pronto? Nunca estou. Ele sempre me pega de surpresa. Quando menos espero, ele nasce de novo. Isso quebra minha rotina. Isso me dilacera por dentro.
Quero que ele venha e coloque minha vida em ordem. Parece fácil. Pelo menos para Ele, que pode fazer tudo. Eu espero. Eu quero.
Fonte: https://pt.aleteia.org/
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