Tudo o que aconteceu com o Verbo de Deus encarnado,
Nosso Senhor Jesus Cristo, possui uma altíssima razão de sabedoria, inclusive o
fato de Ele ter nascido numa fria gruta de Belém.
Redação (23/12/2023 19:09, Gaudium Press) Por
critérios deformados, é comum encontrarmos pessoas para as quais a ideia de
superioridade significa ostentar os sinais do poder e/ou da fama, não carecer
de bens materiais, enfim, receber diariamente o “sorriso da sorte”.
Entretanto,
exatamente para romper com esta mentalidade, o Salvador do mundo, “por quem e
para quem todas as coisas foram feitas” (Cf. Cl 1,16) desejou começar a sua
vida nesta Terra nascendo numa gruta, deitado numa manjedoura e envolto em
faixas.
O
próprio São João escreve no prólogo de seu Evangelho que o Verbo “veio para os
que eram seus e os seus não o receberam” (Jo 1,11), e, por esta falta de
acolhida, o Menino-Deus teve que nascer escondido e rejeitado na cidadezinha de
Belém. “Desastre!” – pensam os superficiais; “maravilha!” – bradam os homens de
fé.
Com
efeito, como reza o provérbio, “Deus escreve reto em linhas retas; somos nós
que as vemos tortas…”
Tudo
o que é feito por Deus tem uma razão de ser. Portanto, todos os fatos da vida
de Nosso Senhor deram-se em decorrência de uma imensa – ou, a bem dizer, divina
– Sabedoria. Exemplo frisante e sublime desta verdade é o próprio nascimento do
Menino Jesus, mais detalhadamente narrado por São Lucas (cf. 2,1-20), cujas
circunstâncias, à primeira vista incompatíveis ao nascimento de um Deus, foram
permitidas pela Providência Divina.
Ora,
como discernir tal perfeição no nascimento de Jesus Cristo? São Tomás de Aquino
explica: “Cristo quis nascer em Belém por dois motivos. Primeiro, porque ‘é da
descendência de Davi segundo a carne’ (Rm 1,3), como se diz na Carta aos
Romanos. Por isso quis nascer em Belém, onde nascera também Davi, para que,
pelo lugar mesmo do nascimento, aparecesse a realização da promessa que lhe
tinha sido feita. É o que mostra o evangelista ao dizer: ‘Porque era da casa e
da família de Davi’(Lc 2,4). E em segundo lugar, porque, como diz Gregório:
‘Belém quer dizer ‘casa do pão’. E o próprio Cristo afirma: ‘Eu sou o pão vivo,
que desceu do céu’”.[1]
Se
deitarmos o olhar por um instante no primeiro livro de Samuel, veremos o
ilustre fato da escolha e unção do rei Davi. Vendo o Senhor que Samuel se
afligia com Saul por causa dos pecados deste, dirigiu-lhe a palavra e
ordenou-lhe que fosse a Belém: “Enche teu corno de óleo e vai; envio-te a Jessé
de Belém, porque escolhi um rei entre os seus filhos, ungirás para mim aquele
que eu mandar” (Cf. 2Sm 16,1.3). A história já é por nós conhecida. Mas dentre
os detalhes da narração, algo muito simbólico é que, dentre todos os filhos de
Jessé, o escolhido foi o único que estava apascentando as ovelhas de seu pai:
“Davi vem do meio das ovelhas que apascenta e é constituído pastor de Israel
(Cf. 2Sm 5,2). Já o profeta Miqueias fixa o olhar num futuro distante e anuncia
que de Belém sairia Aquele que haveria de apascentar um dia o povo de Israel
(Cf. Mq 5,1-3): Jesus nasceu entre os pastores; Ele é o grande Pastor dos
homens (1Pd 2,25; Hb 13,20)”.[2]
Por que não
em Jerusalém?
Por
outro lado, nós não devemos nos esquecer de que a cidade por excelência para o
povo eleito era Jerusalém. Lá estava o Templo, a casa de Deus. Encontramos no
livro do profeta Isaías uma curiosa passagem que, aparentemente, poderia
parecer uma refutação ao argumento de São Tomás quanto à conveniência de Cristo
ter nascido em Belém. O próprio Doutor Angélico recorda tal trecho, à guisa de
objeção: “A lei virá de Sião e a palavra de Deus de Jerusalém”. Ora, Cristo é a
verdadeira Palavra de Deus. Logo, tinha de vir ao mundo em Jerusalém.[3]
Ao
que ele mesmo responde: “Deve-se dizer que Davi nasceu em Belém, mas escolheu
Jerusalém para ser a sede de seu reino e ali edificar o Templo de Deus. Assim,
Jerusalém viria a ser ao mesmo tempo a cidade real e sacerdotal. Mas o
sacerdócio de Cristo, e o seu reino, se realizaram principalmente em sua
paixão. Por isso era conveniente que,
para nascer, escolhesse Belém e para a paixão, Jerusalém.
“Além
disso, desmascarava assim a glória dos homens que se orgulham de ter nascido em
cidades famosas, nas quais querem principalmente ser honrados. Cristo, pelo contrário, quis nascer numa cidade sem
nome e padecer opróbrios numa cidade famosa”.[4]
Finalmente,
de tais ensinamentos decorrem uma eminente lição, transmitida por São Paulo: “O
que é estulto no mundo, Deus o escolheu para confundir os sábios; e o que é
fraco no mundo, Deus o escolheu para confundir os fortes; e o que é vil e
desprezível no mundo, Deus o escolheu, como também aquelas coisas que nada são,
para destruir as que são” (1Cor 27-28).
Por
João Pedro Serafim
[1] Cf. TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica.
São Paulo: Loyola, v. 8, 2002, III, q. 35, a. 7, co. (trad. Loyola).
[2] BENTO XVI. Jesus de Nazaré. Dois
Irmãos: Minha Biblioteca Católica, 2021, p. 61.
[3] S. Th., III, q. 35, a. 7,
ad 1.
[4] Ibid.
Fonte: https://gaudiumpress.org/
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