Translate

domingo, 14 de janeiro de 2024

Por uma vida a ser gasta com o que não passa

O tempo (Pinterest)

Por uma vida a ser gasta com o que não passa

Semeando a fraternidade e vivendo o evangelho, uma experiência de amor e doação.

por Larissa Matos Gonçalves  publicado em 108/12/2023

Eu conheci o Movimento dos Focolares por meio de uma atividade dos Jovens pelo Mundo Unido[1] (JPMU), em São Paulo. Desde então, uma revolução silenciosa começou, e nunca mais parou, dentro de mim: depois que eu conheci esse Deus, que é Amor, e me vi amada por Ele, a minha vida se transformou, porque mudou de sentido.

Este grupo foi como uma porta para uma realidade que eu não conhecia. Ele me possibilitou estabelecer um relacionamento completamente novo com Deus e vínculos profundos com as pessoas, por meio das quais via que era possível viver de modo autêntico o cristianismo, que continuava atual. Além disso, experienciei atividades sociais que mudariam, inclusive, meu rumo profissional. Em uma delas, visitamos o serviço de apoio a refugiados, da Cáritas de São Paulo. Acabei me tornando voluntária da organização e, depois de um ano, comecei em um novo trabalho, com projetos sociais. Também conheci, por meio de uma ação de Natal com os JPMU, um Serviço de Acolhimento Institucional de Crianças e Adolescentes, no qual atuamos como voluntários por alguns anos e construímos relações de afeto com os atendidos. Com a grande providência de Deus, conseguimos levar alguns deles no Genfest local da Mariapolis Ginetta, em 2018.

Com o passar dos anos, começou a crescer em mim o desejo de fazer uma missão. A vida cristã é inerentemente missionária, onde quer que estejamos, mas eu tinha esse anseio de imersão. Inicialmente, pensei na Jordânia, mas no pós-pandemia o voluntariado na organização que queria não havia se restabelecido, e, aos poucos, pensei fazer esta experiência na Terra Santa. A mim me tocava a passagem do Evangelho em que Jesus chora por Jerusalém; eu imaginava o grande amor que Ele sentia por esse lugar, e eu também queria amar. Busquei organizações humanitárias, e, em contato com o centro dos Focolares de lá, me falaram sobre um hospital, que realizava um programa de voluntariado, no qual duas focolarinas também participavam. Pesquisei e vi que davam condições de acomodação, alimentação e ajuda de custo; participei de entrevista e, em novembro de 2022, cheguei em Jerusalém.

O hospital oferecia assistência a idosos, a pacientes crônicos acamados (muitos há anos hospitalizados), e a pessoas em cuidados paliativos. Eu nunca imaginei voluntariar em um hospital - nem sabia que eu precisava tanto disso. Foi transformador o contato com os pacientes. Para mim, era um privilégio poder acompanhar alguém em um momento de tamanha vulnerabilidade, solidão e grandeza - a morte é algo grande, a ser coberta de amor, assim como é a chegada da vida. O hospital era um ambiente multicultural, com pacientes de diversas nacionalidades e religiões. Judeus, mulçumanos e cristãos partícipes nos sofrimentos físicos e emocionais próprios de todo ser humano, ainda que impactados pela doença de modo diferente, em decorrência de desigualdades políticas e socioeconômicas, ou da falta de rede de apoio e afeto. O programa consistia em atuar como cuidadora dos pacientes, mudando-os de posição, trocando fraldas, alimentando-os e dando banho. No meu primeiro plantão, eu me lembro de pensar o que estava fazendo ali. Enfrentei muitas dificuldades e limites, especialmente pela minha falta de força física.

Nas folgas, costuma visitar a cidade de Jerusalém e outras cidades e lugares que fizeram parte da vida de Jesus. Às vezes eu aproveitava para ler determinada passagem do Evangelho que havia se dado naquele lugar e refletir, sem pressa. Como a calma e o silêncio fazem falta na nossa vida de oração. Um amigo diz que a gente deve “saborear” o Evangelho. Esse tempo na Terra Santa foi um banquete espiritual, e acredito que boa parte dos frutos se deu pelos momentos de oração e busca de intimidade com Deus.

Outra grande alegria para mim foi a proximidade com a comunidade local do Movimento dos Focolares e com as focolarinas. Um encontro, em especial, me marcou como grande testemunho de unidade. Na Páscoa, no centro dos Focolares em Jerusalém, uma freira ucraniana se sentou em frente a uma leiga russa e dialogaram sobre o sofrimento enorme e a loucura da guerra. Cerca de três meses depois que eu voltei para o Brasil, após a experiência na Terra Santa, ocorreu o atentado terrorista do Hamas em 7/10 e teve início a guerra de Israel contra o Hamas, provocando destruição terrível em Gaza, morte de milhares de pessoas e acirramento da violência contra palestinos na Cisjordânia, além do crescimento da islamofobia e antissemitismo internacionalmente.

O mundo precisa, hoje mais do que nunca, de pessoas que não temam gastar sua vida com o que não passa, que a queiram fecunda em frutos de amor. O papa Francisco disse aos jovens: “Arriscar! Amigos, por favor, nunca vos esqueçais duma coisa: sois todos – sem exceção – um tesouro, um tesouro único e precioso. Por isso, não mantenhais a vida num cofre, pensando que é melhor poupar-se e que o momento de a gastar ainda não chegou! (...) Ao contrário, como é bom deixar agora um bom rastro no caminho, cuidando da comunidade, dos companheiros de escola, dos colegas de trabalho, da criação... A propósito, far-nos-á bem questionar-nos: Que rastro estou a deixar agora, aqui onde vivo, no lugar onde a Providência me colocou? Este é o primeiro convite: a cultura do cuidado. Se a abraçarmos, contribuímos para fazer crescer a semente da fraternidade (...) [2]”.

____________

[1]Os Jovens para um Mundo Unido são a expressão juvenil do Movimento dos Focolares. O grupo é formado por membros de diferentes países, culturas e convicções religiosas, unidos no compromisso de viver pela fraternidade universal.

[2]Viagem Apostólica do Papa Francisco ao Reino do Bahrein por ocasião do "Bahrain Forum For Dialogue: East and West for Human Coexistence", Encontro com os Jovens, 05 nov. 2022.  Disponível em: <https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2022/november/documents/20221105-giovani-bahrain.html>.


Fonte: https://www.cidadenova.org.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF