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sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Os Padres da Igreja (I)

Os Padres da Igreja (ChurchPOP)

Os Padres da Igreja (I)

Por Susana Costa Coutinho

O cristianismo nasceu no meio de um povo simples, que foi se abrindo à mensagem de vida e esperança trazida pelo jovem de Nazaré e espalhada por seus seguidores missionários. Quando a mensagem do evangelho chegou aos filósofos dos séculos I ao VIII, encontrou um terreno diferente: a reflexão elaborada pela metodologia filosófica que debruçou-se sobre a mensagem e a pessoa de Jesus e procurou dar, ao anúncio missionário, um corpo teórico. Nasceu a teologia cristã. Por causa desse “nascimento”, os filósofos que fizeram essa ligação são chamados “padres (pais) da Igreja” e seu período é conhecido como patrística. Alguns deles se tornaram pastores e bispos de comunidades cristãs e nos deixaram um rico testemunho da compreensão que fizeram da vida cristã dos sacramentos da iniciação cristã, da moral que deve guiar a conduta dos seguidores de Jesus e da beleza e profundidade da liturgia cristã, entre outros.

A PATRÍSTICA: O ENCONTRO DA FÉ COM A RAZÃO

A patrística é um período que vai do século I ao século VIII, podendo, para alguns estudiosos do tema, estender-se até o século XI, marcado por esse esforço de explicar a fé cristã por meio dos instrumentos da época, baseados nas filosofias romana e grega. Os padres da Igreja eram intelectuais, estudiosos, professores e escritores. Mas, também, seguidores de Jesus, proclamadores do evangelho, missionários, catequistas e pastores. São considerados os primeiros teólogos da Igreja cristã. Colocaram, a serviço do evangelho, seus dons e talentos.

Seus textos são parte fundamental do magistério da Igreja e procuram dar razão à fé cristã, ou seja, inculturar a mensagem evangélica na linguagem filosófica, científica. Explicaram, aprofundaram e defenderam a fé da Igreja, de forma que não houvesse deturpações, ou seja, heresias. Atuaram nos concílios, buscando explicar o sentido da fé, colaborando para a formulação do Credo. Como entender que Jesus é “verdadeiro Deus e verdadeiro homem”? Qual o papel de Maria na história da salvação? Atuaram para a organização e vivência do catecumenato, a iniciação à vida cristã dos adultos. Questões assim foram objetos de estudo e profundas reflexões dos santos padres, que chegaram até nós por meio da tradição viva da Igreja, ou seja, da transmissão do evangelho, de pessoa a pessoa, de geração a geração, uma herança espiritual, como afirmou são João Paulo II, na Constituição Apostólica Fidei Depositum, para a publicação do Catecismo da Igreja Católica.

Por conta de seus lugares de atuação teológico-pastoral, são organizados em seus grandes grupos os do Ocidente, como agostinho, santo Ambrósio, são Jerônimo e são Gregório Magno, e os do Oriente, como santo Atanásio, são Basílio, são Gregório Nazianzeno e são João Crisóstomo. Viveram em lugares e épocas diferentes, exerceram ministérios diferentes, mas procuraram servir a missão da Igreja com o mesmo recurso: a inteligência filosófica.

Os padres da Igreja, assim, trabalharam para a formulação dos dogmas da fé cristã, corrigindo as interpretações deturpadas, ou heresias, e contribuíram imensamente para a vida pastoral da Igreja, bem como orientaram para a vivência dos valores evangélicos. Poderíamos dizer que realizaram aquilo que é a proposta para a nossa catequese: levar as pessoas ao encontro com Jesus, conhecendo, vivendo e celebrando a fé, de forma madura, junto com a comunidade cristã.

DO QUE FALAVAM OS PADRES DA IGREJA?

            Como vimos, a exposição do tema é objetivo principal do trabalho da patrística. Mas como aqueles cristãos convertidos, vindos da tradição filosófica grega e romana, buscaram entender a fé anunciada pelos seguidores de Jesus de Nazaré? Eles voltaram-se à principal fonte: a Palavra de Deus, a Bíblia. É de autoria desses cristãos vários comentários aos textos bíblicos, verdadeiras homilias, no sentido mais profundo da palavra, uma “conversa”, nos quais buscavam escutar a voz de Deus e as situações da vida do povo (o da Bíblia e do pastoreio) e também fundamentar as posições teológicas assumidas pela Igreja contra as heresias. Santo Agostinho, por exemplo, escreveu comentários aos textos iniciais do livro do Gênesis. Para contrapor-se às ideias que se apresentavam de um “Deus” destruidor e vingativo, santo Agostinho apresenta um Deus bondoso e providente.

            Os padres da Igreja eram, também, como vimos, membros das comunidades cristãs, muitos foram bispos e presbíteros. Portanto, como tema importantes em suas reflexões era a fé vivida por essas comunidades. Seus textos eram diálogos com essas experiências e com pessoas com as quais conviviam, por meio de sermões, catequeses, cartas, orientações para uma vida simples, regrada e disciplinada pela oração (ascética) e conduzida pelos valores do evangelho (moral). Tinham uma preocupação pastoral, de forma a não separar a reflexão teológica da vida concreta das comunidades cristãs. Preocupavam-se com a comunhão eclesial, com a unidade da Igreja, num contexto em que muitos se opunham aos ensinamentos de Cristo, mesmo dentro das comunidades, levando os cristãos aos cismas (separações), E, diante das perseguições externas, animavam os que sofriam a continuarem firmes na fé. É o caso de são João Crisóstomo, escrevendo a diaconisa Olímpia e suas companheiras da comunidade de Constantinopla, para que suportassem as perseguições sofridas, venda-as como passageiras, pois eterno é o amor de Deus.

            A liturgia foi outro tema importante nos escritos dos padres da Igreja, tendo destaque o batismo, tanto as explicações teológicas como as catequéticas. Estas últimas, muitas vezes, eram as cartas enviadas aos catecúmenos adultos que se preparavam para receber o sacramento de iniciação à vida cristã. Um conjunto de belíssimas cartas de santo Ambrósio, intitulado Sobre os sacramentos, revela toda a riqueza do batismo para a vida da Igreja e do cristão, explicando, por meio dos sinais litúrgicos, a força da salvação (mistagogia). Sobre a eucaristia, destacam-se as homilias de são João Crisóstomo, unindo a recepção do sacramento com o compromisso social do cristão. Questiona o santo: “De que serviria, afinal, adornar a mesa de Cristo com vasos de ouro, se ele morre de fome na pessoa dos pobres?”

UMA HERANÇA A SER COMPARTILHADA

            Por certo que a patrística está muito presente no magistério, na teologia e na pastoral da Igreja ainda hoje. O pensamento, a reflexão e os estudos daqueles homens nos revelam a riqueza do evangelho e nos ajudam a viver nossa fé. Foi assim que entenderam os padres, bispos e teólogos que trabalharam intensamente pela renovação da liturgia, as catequese, dos estudos bíblicos, da missão da Igreja no início do século XX e que contribuíram com as reflexões feitas no Concílio Vaticano II. Assim, a patrística se tornou uma fonte importante para as mudanças ocorridas na Igreja Católica, por meio dos documentos conciliares.

Revista Ecoanda – Ano 18 – nº 69 – Março/Maio – 2020 – Págs. 18/19

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF