Bom filho, bom Padre
"Quando uma pessoa conhecida, boa e querida falece, passam pela
cabeça mil lembranças diferentes". Neste texto Dom Guillaume Derville
conta suas recordações de Dom Javier Echevarría, e reflete sobre a marca que
ele deixou em sua vida.
12/12/2018
Quando uma pessoa conhecida, boa e querida falece, passam pela cabeça
mil lembranças diferentes, como fagulhas que despertam na alma sentimentos
contrastantes. Mais ainda quando se trata de um Padre que mostrou amplamente
como vivia somente para nós, para levar-nos ao coração de Cristo. Em nossa
alma, há uma mistura de ação de graças e de desejos de reparação pela própria
falta de correspondência. A realidade da morte, do tempo que passa, se faz mais
presente. E à dor de uma ausência, se une a gloriosa esperança do Céu. À oração
pela alma de um cristão, soma-se o recurso a uma intercessão que se percebe
mais poderosa. Assim vem sendo, em um rápido esboço, a ressonância do
falecimento de Dom Javier em muitas pessoas da Obra, e em tantas outras que nos
querem bem.
PERCEBE-SE, QUASE MELHOR AGORA, A
SINGULARIDADE DE UMA VIDA QUE SE GASTOU DESDE A JUVENTUDE: PRIMEIRO PERTO DE
SÃO JOSEMARIA, E DEPOIS DO BEM-AVENTURADO ÁLVARO.
A morte de um Padre como Dom Javier traz muitas lembranças: algumas
vividas por cada um e cada uma. Outras, tantas vezes escutadas, como esses
relatos de família que se contam de geração em geração. Percebe-se, quase
melhor agora, a singularidade de uma vida que se gastou desde a juventude:
primeiro perto de São Josemaria, e depois do Bem-aventurado Álvaro, e,
finalmente, como sucessor de ambos com a memória do coração e da inteligência
sempre viva, para transmitir com fidelidade o espírito recebido de Deus por
meio de suas mãos. O carinho que São Josemaria mostrou desde muito cedo a Dom
Javier, correspondido por uma admiração e uma obediência filiais cheias de fé
na ação de Deus nos santos, fizeram de Dom Javier um filho leal e valente. Seu
sentido da filiação divina passou pelo caminho da filiação ao Padre na Obra,
primeiro em sua missão de atender às necessidades materiais de São Josemaria, e
depois, em sua estreita colaboração com Dom Álvaro.
A entrega decidida e constante de Dom Javier como custos[1] (palavra
latina para custódio), e o cumprimento fiel ad mentem Patris (com
a mente do Padre) das tarefas que lhe eram confiadas, foram uma preparação
intensa para seu longo ministério pastoral como Padre e Prelado do
Opus Dei. Sua relação com Deus, o exemplo e a proximidade de São Josemaria
e do Bem-aventurado Álvaro, abriram o coração desse filho fiel para que a graça
de Deus o enchesse de caridade. Foi um bom filho e foi um bom Padre.
Desvivendo-se sempre por suas filhas e filhos no Opus Dei e atento a
estreitar os vínculos de nossa fraternidade sobrenatural, foi filho não só
quando nosso Padre e Dom Álvaro estavam nesta terra, mas também depois. A
partir da integridade de seu caráter, que saltava à vista, sentia saudades
desses dois gigantes da fé e do amor, ao mesmo tempo em que se sabia sempre em
sua presença. Como homem que sabia amar, e ainda hoje tão querido, palpitava no
seu coração a saudade do tempo em que São Josemaria vivia entre nós.
Como Padre e Prelado queria seguir as pegadas dos seus santos
predecessores, não se afastar de um caminho bem traçado, cuidar amorosamente de
um espírito esculpido. Como filho, foi co-herdeiro valente de Cristo (cf. Rom 8-17):
levou a Cruz, peso bendito das almas, jugo suave e carga leve (cf. Mt
11,30). Com frequência, Dom Javier dizia que era necessário apostarmos
tudo na carta do Amor. Esse foi o seu grande anseio, o seu esforço constante.
REPETIRIA AQUILO QUE, ESPECIALMENTE NOS
ÚLTIMOS ANOS, TINHA CHEGADO A SER UM REFRÃO NOS SEUS LÁBIOS: QUE VOS
QUEIRAIS BEM, QUE VOS AMEIS CADA VEZ MAIS!
«Se aquele que chamamos Padre durante vinte e dois anos –dizia Mons.
Fernando Ocáriz, atual prelado do Opus Dei, na homilia da missa por Dom
Javier na basílica de Santo Eugênio–, estivesse aqui entre nós, com certeza nos
pediria que aproveitássemos estes momentos para intensificar o nosso amor à
Igreja e ao Papa, que permanecêssemos muito unidos entre nós e com todos os
nossos irmãos em Cristo. E repetiria aquilo que, especialmente nos últimos
anos, tinha chegado a ser um refrão nos seus lábios: que vos queirais
bem, que vos ameis cada vez mais! E não só nos seus lábios:
impressionava ver como sabia querer bem aos outros. Lembro, por exemplo, que um
dia antes de falecer, expressou o seu desconforto por estar incomodando a
tantas pessoas que cuidavam dele. E espontaneamente respondi: “Não, Padre. É o
senhor que sustenta a todos nós”»[2].
Agora este filho bom e fiel continua nos sustentando a todos lá do Céu.
Muitos notaram, desde o dia do seu falecimento, como Dom Javier os ajudava em
tantos aspectos da sua vida diária, como se o Padre, que sempre teve um
temperamento ativo e generoso e que tanto nos convidava a acudir à intercessão
dos que nos precederam, quisesse empenhar-se para ajudar-nos a cada uma, a cada
um. Talvez para agradecer aquela carta que lhe escrevemos, para responder a
essa pergunta que não lhe pudemos fazer, enfim, para continuar nos mostrando a
paternidade de Deus.
Por: Guillaume Derville
Tradução: Mônica Diez
[1]N.T.
Um dos dois sacerdotes que sempre acompanham o Padre e o auxiliam em assuntos
materiais e espirituais. Numa entrevista, Dom Javier explicava assim os
custódios: Os custódios existem para que o Prelado, o Padre, não viva sozinho,
não seja um homem isolado lá em cima. E, além disso, para que possam ajudá-lo a
ser melhor. (https://opusdei.org/es/article/tras-la-huella-de-un-padre
18/06/2012).
Nenhum comentário:
Postar um comentário