Heresias
antigas nas seitas de hoje
- Autor: Jesús
Urones
- Fonte: Religion
en Libertad
- Tradução: Carlos
Martins Nabeto
Quando São
Paulo escreve aos coríntios, ensina que é necessário que haja heresias:
- “E até importa que haja
entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós”
(1Coríntios 11,19).
É pelo erro
que se manifestam aqueles que são aprovados na fé, ou seja, aqueles que vivem
uma doutrina ortodoxa e não se deixaram confundir pelo erro doutrinário.
Ao longo da
História da Igreja, existiram muitas heresias, as quais foram inicialmente
combatidas pelos Santos Padres. Algumas duraram vários séculos (como o
Arianismo); outras, ao contrário, duraram menos tempo. Não houve época em que
não tenha havido heresias, pois até mesmo na Era dos Apóstolos já se dizia:
- “Saíram de nós, mas não
eram de nós; porque, se fossem de nós, ficariam conosco; mas isto é para
que se manifestasse que não são todos de nós” (1João 2,19).
As antigas
heresias voltaram e se manifestam hoje em diversas seitas. Neste artigo,
analisarei suas semelhanças.
ARIANISMO E
MACEDONIANISMO NAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ
Ário foi um
sacerdote da Alexandria, que viveu entre os anos de 256 e 336, e ensinou que
Jesus, o Filho de Deus, não era verdadeiro Deus e estava subordinado ao Pai,
que o tinha criado. Para Ário, Cristo não era eterno, tinha um início e,
portanto, era criatura do Pai. Para apoiar esta ideia, usava o texto de João 14,28, que fala que “o Pai é
maior do que eu”. As ideias de Ário foram declaradas heréticas tanto pelo
Concílio de Niceia [ano 325] quanto pelo 1º Concílio de Constantinopla (ano
381). O Padre da Igreja que combateu mais incisivamente o Arianismo foi,
principalmente, Santo Atanásio de Alexandria.
Algum tempo
depois, no século IV, surge Macedônio, patriarca de Constantinopla, afirmando
que o Espírito Santo não era uma pessoa divina. Considerava o Espírito Santo
uma criatura subordinada ao Pai e ao Filho. Sendo criatura e não compartilhando
da mesma substância ou natureza do Pai ou do Filho, era portanto inferior aos
dois. Contra os erros desses grupos, Santo Atanásio, os três Padres Capadócios
(São Basílio, São Gregório de Nazianzo e São Gregório de Nissa) e Dídimo de
Alexandria defenderam a divindade do Espírito Santo e sua consubstancialidade
com o Pai. Esta heresia foi condenada por um Sínodo em Alexandria (362), sob a
presidência de Santo Atanásio; pelo 2º Concílio de Constantinopla (381); e por
um Sínodo Romano (382), presidido pelo Papa São Dâmaso. O Concílio de
Constantinopla acrescentou também um importante artigo ao Símbolo de Niceia,
afirmando a divindade do Espírito Santo (cf. Denzinger 86).
Apesar
disso, hoje em dia as Testemunhas de Jeová, baseando-se agora no texto de
Colossenses 1,15-18, negam a divindade de Cristo, afirmando que Ele é “o
primeiro ser criado”, da mesma forma que Ário. Negam também a divindade do
Espírito Santo, considerando-O como uma força (não seria sequer uma pessoa),
como afirmava Macedônio.
- “Portanto, se o
Espírito do Pai fala através dos Apóstolos, ensinando-os o que deverão
responder, e o que é ensinado pelo Espírito é sabedoria – que não podemos
imaginar que seja diferente da do Filho -, resta claro que o Espírito é da
mesma natureza que o Filho e o Pai (…). Porém, o Pai e o Filho são uma só
coisa; logo, a Trindade está unida pela unidade de substância” (Dídimo de
Alexandria, Tratado sobre o Espírito Santo 86).
SABELIANISMO
E ADOCIONISMO NA SEITA LUZ DO MUNDO E NOS UNITARISTAS
Sabélio foi
um sacerdote do século III que viveu em Roma. Este herege ensinava que o único
Deus existente tinha se manifestado de três modos diferentes: como Pai, no
Antigo Testamento; como Filho, no Novo Testamento; e como Espírito Santo, após
Pentecostes. Com ele havia outros defensores desta doutrina (que posteriormente
passou a ser chamada de “Modalismo”, pela afirmação de que Deus se manifestara
de três modos distintos), como Noeto de Esmirna e Praxeas da Ásia Menor.
Os
principais Padres da Igreja que combateram esta heresia foram Hipólito,
Tertuliano e, ainda, o Papa São Calisto, que excomungou Sabélio. Também o Papa
São Dionísio condenou esta heresia.
Dentro da
heresia “Monarquianista” (que ensina que em Deus não há mais do que uma
pessoa), há duas tendências: a Sabeliana/Modalista (tratada acima) e a
Adocionista; esta última foi professada por Teodoro o Curtidor em torno do ano
190; ele foi excomungado pelo Papa Victor I e pelo Bispo de Alexandria Paulo de
Samósata, contra quem se levantou Malquião de Antioquia, que foi por sua vez
destituído do cargo de Bispo por um Sínodo em 268. O Adocionismo ensinava
basicamente que Cristo nasceu como um simples homem, mas foi “adotado como
Filho” por Deus durante seu batismo, sendo a partir daí dotado de poderes
divinos. Dessa forma, nega a eternidade do Verbo (v. João 1,1; Hebreus 1,1-3), sua divindade e
consubstancialidade com o Pai.
A seita
“Luz do Mundo” professa em suas crenças estas duas heresias, afirmando que
Cristo não nasceu como Deus, mas foi adotado pelo Pai após o batismo (nascera
então como criatura humana). Já os pentecostais “unitaristas” seguem praticando
a doutrina modalista/sabelianista, que foi condenada por pelo menos dois Papas.
Talvez a referência bíblica mais clara que refuta essas posições seja a
seguinte:
- “E agora glorifica-me
tu, ó Pai, junto de ti mesmo, com aquela glória que tinha contigo antes
que o mundo existisse” (João 17,5).
Se Jesus
afirma que teve glória ao lado do Pai antes da criação do mundo, isto significa
claramente que já existia e era diferente do Pai; por isso diz “junto
de ti mesmo”: já existia – não pode ser “um modo de Deus” ou “uma
nova manifestação de Deus”; é simplesmente uma pessoa divina que desde a
eternidade habitava com o Pai e que, em um dado momento, se manifestou na
carne, como homem.
- “Porém, não merece
menor repreensão aqueles que opinam que o Filho é uma criatura e que creem
que o Senhor foi criado, como qualquer outra coisa que realmente foi
criada. (…) Dizer que o Senhor de algum modo foi criado é blasfêmia – e
não qualquer blasfêmia, mas a maior blasfêmia, porque se o Filho foi
criado, houve um tempo em que não existia. Pois bem: Ele sempre foi, se de
fato está no Pai, como Ele o afirma [cf. João 14,10s]. E se Cristo é o Verbo, a
Sabedoria e o Poder (com efeito, todas estas coisas, como sabemos, as
divinas Escrituras afirmam que Cristo é [cf. João 1,14, 1Coríntios 1,24]), tudo isso
são atributos de Deus. Logo, se Cristo foi criado, houve um tempo em que
Ele não era nada disso; portanto, teria havido um momento em que Deus
estava sem estes atributos, o que é um imenso absurdo” (Papa São Dionísio,
Da Trindade: carta contra os triteístas e sabelianos; ano 260).
TRITEÍSMO
NO MORMONISMO
A obra
“Ensinamentos do Profeta Joseph Smith” afirma:
- “Sempre declarei que
Deus é uma personagem diferente; que Jesus Cristo é uma outra personagem e
distinta de Deus Pai; e que o Espírito Santo é uma outra personagem, e é
espírito. Estes três constituem três personagens diferentes e três deuses”
(Capítulo 2, p.44).
Com esta
declaração, o Mormonismo afirma que não crê no conceito cristão de “Trindade”,
mas que há três deuses diferentes. Para o mórmon, o Pai é um Deus diferente de
Deus Filho e diferente do Deus Espírito Santo. Esta doutrina, no entanto, não é
nova para nós, católicos; já era uma heresia, conhecida na Antiguidade como
“triteísmo”. Tal heresia era conhecida por dividir a substância da Santíssima
Trindade em três substâncias diferentes. Seu fundador foi João Ascunage,
diretor da escola sofista de Antioquia; ele tinha sido discípulo do Monofisismo
e acabou caindo neste erro teológico. Contudo, foi João Filoponos (+565) quem
mais difundiu este erro.
Apesar
disso, devemos dizer que esta heresia remonta aos tempos de Marcião, que foi
seu real iniciador, tendo desaparecido até os tempos de João Filoponos, que a
ressuscitará em suas obras. Este autor é conhecido por ser o primeiro
comentarista cristão de Aristóteles. João identificou a “natureza” e a “pessoa”
(“ousia” e “hipóstasis”) e acabou caindo, em matéria de Cristologia, no
monofisismo, e na doutrina trinitária, no triteísmo. Segundo ele, as três
pessoas divinas são três indivíduos divinos, assim como três homens são três
indivíduos humanos. Portanto, no lugar da unidade numérica de essência colocou
uma unidade específica.
A Igreja
Católica condenou esta heresia várias vezes; o primeiro a fazê-lo, foi o Papa
São Dionísio, numa carta escrita entre os anos 259/260, em que condenava o
Sabelianismo e o Triteísmo de Marcião:
- “Este é o momento
oportuno para falar contra os que dividem, separam e destroem a mais
veneranda pregação da Igreja: a unidade de princípio em Deus. Repartem em
três potências e hipóstases separadas, em três divindades. Eu soube que há
entre vós alguns mestres que pregam e ensinam a Palavra divina, e possuem
essa opinião e que se opõem diametralmente – digamos assim – à sentença de
Sabélio, porque este último blasfema dizendo que o próprio Filho é o Pai e
vice-versa, enquanto que aqueles, pelo contrário, pregam de certo modo
três deuses, uma vez que dividem a santa unidade em três hipóstases
absolutamente separadas entre si. Porque é necessário que o Verbo divino
esteja unido com o Deus do universo, e que o Espírito Santo habite e
permaneça em Deus, e consequentemente é de toda necessidade que a divina
Trindade se recapitule e reúna, como que em um vértice, em um só, ou seja,
no Deus todo-poderoso do universo; porque a doutrina de Marcião, homem de
mente vazia, que corta e divide em três a unidade de princípio, é um
ensinamento diabólico; não é dos verdadeiros discípulos de Cristo e
daqueles que se comprazem nos ensinamentos do Salvador. Estes, com efeito,
sabem muito bem que a Trindade é pregada pela divina Escritura e que nem o
Antigo, nem o Novo Testamento pregam três deuses. Logo, não se deve
dividir em três divindades a admirável e divina unidade, nem reduzir à
ideia de criação a dignidade e suprema grandeza do Senhor; mas deve-se
crer em Deus Pai todo-poderoso; e em Jesus Cristo, seu Filho; e no Espírito
Santo; e que no Deus do universo encontra-se unido o Verbo, porque Ele
afirma: ‘Eu e o Pai somos um’ [João 10,30], e: ‘Eu estou no Pai e o Pai
está em Mim’ [João 14,10]. Deste
modo é possível manter íntegra tanto a divina Trindade como a santa
pregação da unidade de princípio” (Papa São Dionísio, Da Trindade: carta
contra os triteístas e sabelianos; ano 260).
Roscelino
de Compiégne (+~1120) partia de um ponto de vista nominalístico, segundo o qual
apenas o indivíduo possui realidade e, assim, ensinava que as três pessoas
divinas eram três realidades separadas entre si (“tres res ab invicem
separatae”), as quais só moralmente se encontravam unidas entre si, por sua
harmonia em vontade e poder, como poderiam estar três anjos ou três almas
humanas. Sua doutrina foi combatida por Santo Anselmo da Cantuária e condenada
por um Sínodo reunido em Soissons (1092).
Na Idade
Média, no que diz respeito à formulação eclesiástica do dogma trinitário, foi
de importância o IV Concílio de Latrão (1215), o qual condenou o erro triteísta
de Joaquim de Fiori (DZ 428ss).
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