Liturgia e Apocalipse
O livro do Apocalipse é um dos mais lidos e
comentados do Novo Testamento, isto porque que este livro causa um certo
impacto e uma certa expectativa no leitor. Estas expectativas acontecem devido:
o seu estilo, as imagens presentes no texto, aspectos catastróficos etc.
Por isso, tem-se num conceito popular uma visão meio que deturpada deste
livro onde a concepção que se sobressai é de um livro que conta as possíveis
catástrofes vindouras na história e também do fim dos tempos. Com isso, sua
leitura gera uma insegurança e um medo no leitor. Mas afinal, o que significa
apocalipse? Qual a relação entre o Apocalipse e a liturgia?
Apocalipse (em grego, apokálypsis=revelação) é
um gênero literário que se tornou usual entre os judeus após o exílio da
Babilônia (587-583 a.C) trata-se sobre o fim dos tempos: descreve o juízo de
Deus sobre os povos, de modo a punir os maus e premiar os bons. Essa
intervenção de Deus é acompanhada de sinais que abalam a natureza (todo o
apocalipse descreve sempre cenários cósmicos); é freqüente o recurso a símbolos
e números simbólicos nesse gênero literário. Sobre este pano de fundo o autor
do Apocalipse quis proceder de modo que: descreveu cenas de horríveis
calamidades (simbolizando os males que os cristãos sofrem no cotidiano da sua
existência terrestre), entrecortadas por visões da corte celeste, onde os anjos
e os santos cantam “Aleluia! A vitória compete ao Cordeiro que foi imolado e
está de pé”. Assim, estes acontecimentos descritos no Apocalipse só podem ser
entendidos a luz do “Evento Cristo”.
Jesus Cristo é a chave de leitura para a
compreensão do Apocalipse, ou seja, este trata da celebração dos mistérios de
Cristo. E sendo celebração podemos afirmar tendo base em algumas perícopes que
esta é uma grande liturgia. Esta liturgia da celebração dos mistérios de Cristo
fora dada a Igreja que tem a autoridade de salvaguardá-la e de utiliza-la como
caminho de salvação e de contemplação do “Eterno no tempo”, conduzindo assim
por meio destes os seus fiéis até que se chegue o “Dia do Senhor”. A liturgia é
ação do “Cristo total”, os que agora a celebram, além dos sinais, participam já
da liturgia do céu, onde a celebração é inteiramente Comunhão e Festa.
No livro do Apocalipse nos deparamos com
alguns símbolos de nossa liturgia: incenso, altar, oficiantes por vezes
designados como sacerdotes, participantes que se prosternam, adoram, cantam a
glória de Deus e de sua obra em Jesus Cristo por meio de hinos de caráter muito
tradicional. O Aspecto litúrgico de numerosa passagens do Apocalipse salta aos
olhos do leitor menos mentalizado. Por vezes tem-se o sentimento de assistir a
um diálogo litúrgico entre um oficiante e uma comunidade que lhe responde. Várias
destas proclamações, especialmente o Santus, figuram hoje entre as partes
essenciais das grandes liturgias cristãs, ou seja, a “Santa Missa”.
O capítulo quatro nos apresenta a “Liturgia
Celeste”, nela podemos perceber a presença de “um trono que está colocado no
céu e nele sentado alguém cujo aspecto era de jaspe e cornalina” (Ap4,2,3). Ao
redor deste trono “havia vinte e quatro anciãos, com veste brancas e coroas de
ouro na cabeça” (Ap4,4). Deste trono “saíam relâmpagos e ouviam-se trovões.
Sete tochas de “fogo ardiam diante do trono, os sete espíritos de Deus”. No
centro rodeando o trono estavam quatro seres com aspecto de: leão, touro, homem
e águia. Estes seres de dia e de noite davam graças àquele que estava sentado
no trono e diziam: “Santo, santo, santo, Senhor Deus Todo-poderoso, aquele que
era e é e será” (Ap4,8).
O quinto capítulo traz presente um problema
que é encontrar o significado do misterioso livro que ocupa neste capítulo tão
grande lugar. Aparece também a figura de um Cordeiro Imolado que tem a missão
de abrir o rolo e soltar seus selos. Diante disso todas as criaturas cá no céu
ou na terra diziam: Àquele que está sentado no trono e ao Cordeiro, o louvor, a
honra, a glória e o poder pelos séculos dos séculos. Outro capítulo importante
para esta realidade é o sétimo que traz presente a realidade daqueles que se
salvam: “ouvi o número dos marcados com o selo” (Ap 7,4). Depois foi avistada
uma multidão enorme que ninguém podia contar e estes gritavam: “A vitória ao
nosso Cordeiro” (Ap 7,10). Estes estavam de vestes brancas e saíram da
tribulação e alvejaram suas vestes no sangue do Cordeiro. O capítulo oitavo
fala dos sete anjos que estavam diante de Deus e que a eles foram entregues
sete trombetas. Veio assim um outro anjo que se colocou diante do altar com um
turíbulo fumegante e da sua mão subia a fumaça de incenso com as “orações de
todos os santos até à presença de Deus” (Ap 8,4). O anjo tomou o turíbulo e
arremessou à terra.
Os capítulos 21-22 do livro do Apocalipse nos
trazem uma visão de uma Igreja que fora descida do céu a “nova Jerusalém”, a
cidade santa que “descendo do céu, de junto de Deus, preparada como noiva que
se apronta para o noivo” (Ap21,2).
O Apocalipse de São João, lido na liturgia da
Igreja, revela-nos primeiro que “um trono estava erguido no céu e Um sentado no
trono” (Ap4,2): Este podemos dizer que é o Senhor Deus. Depois logo revela o
Cordeiro, “imolado e de pé” (Ap 5,6), Este é o Cristo crucificado e
ressuscitado, o único Sumo Sacerdote do santuário verdadeiro, o mesmo “que
oferece e que é oferecido, que dá e que é dado”, isto podemos ouvir nas
palavras da Consagração “que será dado por vós e por muitos para a remissão dos
pecados”. E por último, revela “o rio da Vida que brota do trono de Deus e do
Cordeiro” (Ap 22,1), um dos mais belos símbolos do Espírito Santo.
Recapitulados em Cristo, participam do serviço
do louvor de Deus e na realização de seu intuito: as Potências Celestiais, toda
a criação (os quatro viventes), os servidores da Antiga e da Nova Aliança (os
vinte e quatro anciãos), o novo Povo de Deus (os cento e quarenta e quatro
mil), em particular os mártires “degolados por causa da Palavra de Deus” (Ap
6,9-11), e a Santíssima Mãe de Deus ( Ap 12) e finalmente “uma multidão imensa,
que ninguém poderia contar, de toda nação, raças, povos e línguas” (Ap 7,9).
Ora, onde na terra encontramos uma Igreja universal que adora de uma forma fiel
à visão de João? Onde encontramos sacerdotes paramentados de pé à visão diante
de um altar? Onde encontramos homens consagrados ao Celibato? Onde ouvimos
anjos serem invocados? Onde a arte exalta a mulher coroada de estrelas, com a
lua debaixo dos pés, que esmaga a cabeça da serpente? Onde os fiéis suplicam a
proteção do arcanjo São Miguel?
Onde mais, a não ser na Igreja Católica e,
mais especificamente na Missa? O nosso Saudoso Papa João Paulo II em sua
venerável memória, dizia: ‘’ que a Missa é o céu na terra” e ele explicou que
“a liturgia que celebramos na terra é misteriosa participação a liturgia
celeste”. Assim, a nossa liturgia participa da liturgia celeste! Na missa, já
estamos no céu. Dessa maneira, precisamos aprender a ver o Apocalipse como a
Igreja o vê, ou seja, se queremos entender o sentido do Apocalipse, temos que
aprender a lê-lo com uma imaginação sacramental. Podemos então perceber que os
símbolos trazidos pelo Apocalipse estão em nossa liturgia:
Missa dominical – 1,10
Sumo sacerdote- 1,13
Altar- 8,3-4; 11,1;14,18
Sacerdotes 4,4; 11,15; 14,3; 19,4
Paramentos 1,13; 4,4;6,11; 7,9;15,6;19,13-14
Celibato consagrado 14,4
Candelabros 1,12;2,5
Penitência caps.2 e 3
Incenso 5,8; 8,3-5
O livro 5,1
A hóstia eucarística 2,17
Taças (cálices) 15,7; 16;21,9
O sinal-da-cruz 7,3; 14,1; 22,4
O glória 15,3-4
O Aleluia 19,1.3.4.6
Corações ao alto 11,12
O “Santo, Santo, Santo” 4,8
O Amém 19,4 ; 22,20
O “Cordeiro de Deus” 5,6
Virgem Maria 12,1-6.13-17
Intercessão dos anjos e santos 5,8; 6,9-10;
8,3-4
Devoção a são Miguel 12,7
Antífona 4,8-11;5,9-14; 7,1-12; 18,1-8
Leituras das Escrituras 2-3;5;8,2-11
O Sacerdócio dos fiéis 1,6; 20,6
Catolicidade ou universalidade 7,9
Contemplação silenciosa 8,1
O banquete das núpcias do Cordeiro 19,9.17
(HANN, 2002,p.107-108).
Portanto, o Apocalipse trata de uma reflexão
sobre o culto, e este culto é a antecipação do Fim, do Julgamento, do Reino que
acontece na Santa Missa. Contudo, tanto o Apocalipse quanto a liturgia nos
falam sobre o Fim, pois, o fim tem o seu nome: Jesus Cristo. E é a este que a
Igreja clama incessantemente numa única voz; “Maranatá”, ou seja, “ Vem, Senhor
Jesus!”. Nesta grande prece a Igreja clama o nome de Jesus e se prepara para a
parusia.
Pe. Jair Cardoso Alves Neto.
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