As ferramentas de São
José
“Como posso fazer uma escultura? Basta retirar do bloco de mármore tudo
o que não for necessário”, dizia Michelangelo. O escultor italiano descobriu
uma obra de arte na pedra e trabalhou-a para que outras pessoas também a
pudessem ver. Quinze séculos antes, um jovem também trabalhava com suas mãos em
obras que transcenderiam a história. Fazia isso em uma pequena oficina em
Nazaré.
07/07/2021
Oferecemos uma reflexão para dar continuidade ao Ano de São José.
Outros recursos: Carta apostólica
“Patris Corde”, Meditação sobre São
José.
Trabalho. Oração. Golpe de martelo. Serragem que cai no chão e que será
recolhida com cuidado no final do dia. O carpinteiro trabalha com atenção. É
“um homem comum, em quem Deus confiou para realizar coisas grandes” (É
Cristo que passa, 40). Coisas grandes que acontecem ocultamente. Pequenas
coisas que se tornam grandes, ao ritmo do cinzel e da serra.
“Em Nazaré, José devia ser um dos poucos artesãos, se não o único.
Possivelmente, carpinteiro. Mas, como costuma acontecer nas pequenas povoações,
também devia ser capaz de fazer outras coisas: pôr em andamento um moinho que
não funcionava, ou consertar antes do inverno as fendas de um teto. José devia
tirar muita gente de dificuldades, com um trabalho bem acabado. Seu trabalho
profissional era uma ocupação orientada para o serviço, tinha em vista tornar
mais grata a vida das outras famílias da aldeia; e far-se-ia acompanhar de um
sorriso, de uma palavra amável, de um comentário dito como que de passagem, mas
que devolve a fé e a alegria a quem está prestes a perdê-las” (É Cristo que
passa, 51).
Podemos imaginar a oficina, pequena, bem iluminada e limpa. Na entrada,
está pendurado um avental de couro, que São José usa para trabalhar. Em uma
extremidade, ao lado de uma janela para aproveitar a luz do dia, há uma mesa de
trabalho. Do outro lado da oficina, estão as peças de madeira ainda inacabadas.
No fundo, as ferramentas – como instrumentos fiéis – aguardam as mãos que as
farão trabalhar.
Pendurado na parede está o martelo, uma ferramenta vital para os
carpinteiros. Necessita ser potente e leve ao mesmo tempo, para que possa ser
usado no trabalho sem que seu peso suponha um desgaste físico para aquele que o
utiliza. Golpe a golpe, trabalha-se, prega-se, modela-se. Perseverança que
ignora a monotonia, pois cada golpe tem um sentido.
Ao lado do martelo, está o cinzel. Serve para fazer cortes limpos na
madeira de trabalhos que requeiram maior finura. Um bom trabalho de carpintaria
requer atenção aos detalhes, cortes cuidadosos e sulcos lisos. O cinzel se
detém nas pequenas coisas.
Também há uma serra pendurada na parede, essencial para o trabalho da
oficina. Usar a serra requer paciência: às vezes, pode parecer que não há
progresso. Nessas horas, é preciso confiar e repetir o movimento. Aos poucos,
até as madeiras mais difíceis acabam cedendo.
Debaixo das ferramentas, está o burrinho, suporte formado por várias
tábuas cruzadas, que São José usa para apoiar a madeira enquanto trabalha.
Firme, talvez sem muito brilho, lembra o animal com o qual compartilha o nome.
Humildade, o fundamento sobre o qual todas as outras virtudes se apoiam.
Sobre o burrinho, há uma bolsa de couro, na qual o carpinteiro guarda os
pregos. Essas pequenas peças de metal que raramente são vistas depois que o
trabalho é feito, e, no entanto, são as que mantém os elementos unidos. Serviço
oculto, que recorda o carpinteiro que as usa.
Ao lado da bolsa de couro, pode-se ver uma pequena lima, necessária para
retirar restos de materiais das superfícies e assim deixar as faces lisas. Mas,
para remover asperezas, a lima deve estar “face a face” com a madeira. Talvez
dessa lima, o carpinteiro de Nazaré tenha aprendido a compreender os outros:
para ajudá-los, é preciso primeiro olhar para eles.
Já amanheceu. A porta da oficina se abre e São José entra cantarolando
uma música. Depois de colocar o avental, pega um cilindro de madeira e o coloca
na mesa de trabalho. Dá um sorriso. Talvez esteja pensando no camponês que
usará o moinho quando estiver pronto. Trabalho. Oração. Golpe de martelo.
Talvez
Michelangelo seja um dos maiores gênios da história. Mas o artista italiano
também disse uma vez que “a verdadeira obra de arte é somente uma sombra da
perfeição divina”. E nisso, um jovem carpinteiro de Nazaré adiantou-se a ele.
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