ESPIRITUALIDADE É RELAÇÃO
Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo Metropolitano de Santa Maria
Espiritualidade é
fundamentalmente movimento e relação. Ela precisa integrar as alegrias, sonhos,
desejos e anseios, mas igualmente deve acolher e ressignificar dores, perdas e
frustrações de cada pessoa. Uma espiritualidade autêntica não fecha ninguém em
seu mundo. Ela está sempre aberta à relação, no encontro com Deus que não é
algo privado e secreto, mas sempre compartilhado e narrado aos irmãos. Não se
separa a relação com o divino e o humano.
A espiritualidade é o lugar do
reencontro do eu e da própria identidade, é o lugar onde Deus se deixa
conhecer, onde o eterno e o inefável se revela e se aproxima do ser humano. Ela
depende muito de uma experiência de Deus. Trata-se de passar do plano do
conhecimento de Deus para a experiência de encontro com o divino. Não se trata,
portanto, apenas de uma iniciativa humana que busca simplesmente uma sensação
agradável no âmbito psíquico ou físico. Nesse caso seria uma experiência
religiosa e não espiritual.
Na Bíblia, a categoria
“experiência de Deus” não existe. Na verdade, a Sagrada Escritura vai em outra
direção, até oposta: é Deus que faz a experiência do ser humano. Portanto, é
sempre Deus que escolhe caminhos que nem sempre agradam ao ser humano para revelar-se.
Recorde-se o exemplo de Abraão, Isaac, Jacó, Moisés, Isaias e Jeremias. Suas
histórias são marcadas por desventuras ou cicatrizes do encontro com Deus.
A categoria “experiência de
Deus”, que tem como sujeito o humano que busca o divino, é moderna. Quem a
criou foi o ser humano desejoso de ser peregrino do divino, mas sempre, porém
tentado pela presunção de conquistar e aprisionar o eterno nas circunstâncias
do tempo e nos limites do pensamento humano. Pretende tornar o sagrado tão
próximo para torná-lo familiar e seguro a ponto de exigir que o divino atenda
os pedidos do ser humano. Nessa concepção, Deus é acolhido como uma presença
ocasional e extraordinária, algo dramaticamente ambivalente, porque está
totalmente confiado aos critérios subjetivos de cada indivíduo.
A segunda categoria, entretanto,
“Deus que faz a experiência do humano” é autenticamente bíblica, porque é a
exata expressão da vontade salvífica de Deus narrada na Escritura. Deus aparece
em busca do humano. Como o procura, ou como e onde Deus faz a experiência do
humano? Primeiro, se tudo depende de Deus, a experiência não pode ser algo de
ocasional e extraordinário.
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