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domingo, 23 de junho de 2024

IGREJA: Até os políticos vão para o céu...(1)

Cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos | 30Giorni

Arquivo 30Dias – 09/2004

Até os políticos vão para o céu...

Palavra do Cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Não é por acaso que Paulo VI definiu a política como “a forma mais elevada de caridade”.

por Gianni Cardinale

Os cinquenta anos da morte de Alcide De Gasperi, cujo processo de beatificação está em curso – ainda a nível diocesano; acesso à honra dos altares de Alberto Marvelli, membro da Ação Católica e vereador DC de Rimini no imediato pós-guerra; a beatificação de Carlos de Habsburgo, último imperador da Áustria: todos estes acontecimentos oferecem a oportunidade de discutir as relações entre santidade e política. 30Giorni conversou sobre isso com o cardeal José Saraiva Martins, que dirige a Congregação para as Causas dos Santos desde 1998. O cardeal português parece particularmente interessado e preparado sobre o tema também porque está a preparar um relatório aprofundado sobre o tema que será apresentado no próximo mês de Outubro na associação internacional “Political Charity” fundada pelo professor Alfredo Luciani.

Antes de responder às perguntas, o Cardeal Saraiva Martins considera oportuno fazer um esclarecimento. «Gostaria de esclarecer» diz-nos «que as minhas reflexões sobre a santidade no exercício da atividade política referem-se exclusivamente aos cristãos leigos. Na verdade, só eles têm como vocação própria na Igreja “procurar o reino de Deus na gestão das coisas temporais”. Pelo contrário, a condição dos sacerdotes, religiosos e religiosas exige uma dedicação exclusiva à própria missão, o que implica o dever de abster-se – em condições normais – de atividades políticas, econômicas ou sindicais”. 

Eminência, a política é também a arte do compromisso. A santidade e o compromisso são compatíveis? 

JOSÉ SARAIVA MARTINS: O uso da palavra “compromisso” pode ser fonte de confusão. Na verdade, poderia ser entendida como uma negociação mesmo em detrimento da verdade e da justiça. E se assim fosse, toda a classe política seria automaticamente desqualificada. Contudo, é verdade que, na atividade política, quase nunca é possível conseguir tudo o que se deseja. Em primeiro lugar, Deus estabeleceu uma ordem do universo na lei eterna ou na lei natural, mas, neste quadro, quis a colaboração livre e responsável dos homens, de acordo com os ditames da sua própria consciência bem formada, na realização do tarefa ao longo do tempo. A observância da lei natural e a liberdade responsável dos indivíduos são, portanto, elementos inseparáveis ​​e constituem conjuntamente o estatuto desejado por Deus para a ação do cristão nos tempos temporais. Se as soluções para todos os casos possíveis fossem pré-estabelecidas, perder-se-ia a liberdade e, portanto, a dignidade do homem, e não poderíamos mais falar de História, mas apenas de determinismo rígido. Agora, quando há mais de uma opção legítima, ninguém pode tentar impor as suas opiniões aos outros, e será necessário chegar a uma decisão que seja o resultado de uma comparação honesta e aprofundada das diferentes opiniões.

Então, é possível que um político católico aprove leis que não aderem perfeitamente à doutrina católica?

SARAIVA MARTINS: Nos parágrafos 73 e 74 da encíclica Evangelium vitae , João Paulo II levanta a hipótese do caso de um parlamentar que, diante de uma lei prejudicial ao direito à vida que não pode ser totalmente revogada - e o mesmo vale para leis contrárias ao dignidade e estabilidade da família ou de muitas outras semelhantes -, pode e por vezes deve "oferecer o seu apoio às propostas que visam limitar os danos de tal lei e reduzir os seus efeitos negativos ao nível da cultura e da moral públicas", sempre que o seu a oposição pessoal a esta lei é clara e conhecida por todos. Limito-me a mencionar a questão, que requer maiores esclarecimentos. Mas mesmo neste caso não creio que possamos falar de um compromisso.

Robert Schuman com Alcide De Gasperi | 30Giorni

É possível que os políticos também sejam santos?

SARAIVA MARTINS: Claro. A chamada universal à santidade diz obviamente também respeito aos políticos, como diz o Concílio Vaticano II na constituição apostólica Lumen gentium: «É portanto evidente que todos os fiéis cristãos, de qualquer estado e ordem, são chamados à plenitude da vida cristã e à a perfeição da caridade”. Que a chamada se torne realidade é o próximo passo. A atividade dos políticos deve estar ao serviço do bem comum. É evidente, portanto, que quem a pratica pode ser santificado e também que a própria atividade política pode e deve ser santificada. Portanto, é de alegrar-nos que muitos leigos participem ativamente, segundo as suas próprias condições e possibilidades. Não é por acaso que Paulo VI definiu a política como “a forma mais elevada de caridade”.

As causas da canonização dos políticos são mais complicadas que outras?

SARAIVA MARTINS: Não são inerentemente mais complicados. A Igreja não canoniza um sistema político, mas sim quem praticou heroicamente as virtudes e que, portanto, no campo específico da política, agiu em conformidade com a fé, com verdadeira competência e na busca contínua do bem da sociedade, não de interesses próprios. A maior complexidade pode decorrer, como noutros casos, do facto de se tratarem de políticos cuja actividade teve ressonância a nível nacional ou internacional, caso em que será necessário situar a pessoa no seu contexto histórico e social, enquanto em noutros casos – pensemos, por exemplo, numa mãe de família que vivia a vida quotidiana num espaço geográfico limitado – bastará uma descrição mais geral do ambiente em que o candidato à canonização passou a sua vida.

O padroeiro dos políticos é São Tomás More. Poder-se-ia pensar, portanto, que o martírio é a única forma de um político se tornar santo... 

SARAIVA MARTINS: Os políticos, mesmo aqueles que aspiram à santidade, podem ficar tranquilos. Não é necessário que aspirem necessariamente ao martírio... Qualquer cristão fiel que se tenha dedicado à política pode ser declarado santo. Pessoalmente, acredito que Thomas More poderia ter sido canonizado mesmo que não tivesse sido mártir.

Fonte: https://www.30giorni.it/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF