Para discernir a vontade de Deus, o discípulo de Jesus
acolhe, no silencio e na suavidade do Espírito de Deus, a brisa do seu Amor que
nos conduz ao fim para o qual somos todos criados: “louvar, reverenciar e
servir a Deus”.
Bruno Franguelli, SJ
Hoje, celebramos a memória de Santo Inácio de Loyola, o
mestre do discernimento espiritual. Nos últimos anos, principalmente durante o
Pontificado do Papa Francisco, jesuíta e, por isso mesmo, filho da
espiritualidade de Santo Inácio de Loyola, o termo discernimento têm se tornado
chave nos discursos e documentos do Papa. Sonha Francisco, com uma Igreja que
se abre com liberdade ao discernimento dos espíritos para identificar os sinais
de Deus nos dias difíceis que estamos enfrentando.
Mas, afinal de contas, o que é discernimento espiritual,
como nos ensina Santo Inácio de Loyola, e como se faz? Para responder a esta
pergunta, não nos bastaria um pequeno texto, mas podemos sugerir uma resposta
através de três aspectos:
Crer que Deus trabalha na nossa história pessoal
Santo Inácio era um cavalheiro vaidoso e pautava sua vida no
intenso desejo de conquistar o mundo para si. Com seus sonhos destruídos,
através da derrota em uma batalha que o deixou acamado, começou a repensar sua
vida. Ao ler livros da vida de Cristo e dos santos, compreendeu o quão
superficial era a sua vida e através de pensamentos bons, percebeu que Deus
agia na sua história convocando-o a servir a um outro Rei, aquele Eterno.
Deus trabalhou na história de Inácio e trabalha também na
nossa. O primeiro passo para discernir a Sua voz e a Sua vontade em nossa vida
é crer que Ele está presente, não somente nas periferias da nossa história
pessoal, mas em todos os momentos. Crer que Ele suscita em nós pensamentos,
sentimentos e movimentos que nos direcionam para o bem, para o Seu serviço,
para a Sua Santíssima Vontade.
Conhecer as armadilhas do inimigo da natureza humana
A leitura da vida de Cristo e dos santos produzia em Inácio
movimentos de amor e transformação de vida. Porém, ele percebia que, por algum
momento, vinha-lhe a nostalgia dos deleites mundanos e perversos. Eram
movimentos contrários àqueles belos e santos. Por um momento, vinham-lhe
pensamentos que lhe induziam a buscar a riqueza, a fama e o poder. Mas,
percebia que estes, de algum modo, depois que passavam, deixava seu coração
vazio, insatisfeito e desanimado. Com isso, tinha certeza de que esses pensamentos
não vinham de Deus.
Santo Inácio chama o demônio de inimigo da natureza humana.
E, de fato, Inácio percebeu que era a vontade do demônio desumanizá-lo,
induzi-lo ao fracasso, ao desânimo, à uma vida sem sentido. Neste sentido, o
mestre do discernimento nos convida a reconhecer as armadilhas que o inimigo da
nossa natureza usa para nos atrair, seduzir e enganar. Reconhecer a “cauda da
serpente”, muitas vezes disfarçada de “angelo lucis” (anjo de luz), isto
é, com falsas santas e boas intenções, é indispensável para discernir os
movimentos do Espírito de Deus. Inácio nos ensina que o Espírito de Deus age
com suavidade, “como água que se derrama na esponja”, já o mau espírito é
grosseiro e barulhento como “água que se derrama na pedra”.
Dar-se conta dos afetos desordenados
Santo Inácio deu-se conta de que seu coração era cheio de
afetos. Sentia-se, ao mesmo tempo, atraído pelas honras, por Deus, por uma
duquesa, pelo dinheiro, pela fama, etc. Percebia que seu coração era como um
armário bagunçado. Sentiu necessidade de colocar ordem e chamar cada atração
que sentia pelo seu próprio nome. Sabia que era movido por afetos bons e ruins.
O que fazer com eles, então? Compreendeu que devia dar-se conta, tomar
consciência deles e jamais ignorá-los.
No discernimento inaciano, é essencial não se distrair dos
afetos. Prestar bem a atenção neles: De onde vêm? Para onde me levam? O
discípulo de Jesus, segundo Inácio de Loyola, jamais se deixa levar,
inconscientemente, pelos seus afetos. Pelo contrário, é sempre atento, para
“não se deixar determinar por nenhuma afeição desordenada”. O cristão que
assume com maturidade a sua vida de fé, como nos ensina Santo Inácio, não toma
decisões em tempos tempestuosos ou no auge de suas paixões. Para discernir a vontade
de Deus, o discípulo de Jesus acolhe, no silencio e na suavidade do Espírito de
Deus, a brisa do seu Amor que nos conduz ao fim para o qual somos todos
criados: “louvar, reverenciar e servir a Deus”.
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt
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