OS MÁRTIRES E O CAMINHO NEOCATECUMENAL: PALOMERAS FOI
“REGADA COM O SANGUE DOS SANTOS”
POST 9 DE MARÇO DE 2024 C. N. BRASIL
O caminho Neocatecumenal nasceu em Madri em 1964, no mesmo
ano em que a Diocese de Madri foi elevada a Arquidiocese por São Paulo VI, com
Monsenhor Casimiro Morcillo a frente, em plena realização do Concílio Vaticano
II, do qual Dom Casimiro foi participante.
Conforme se sabe, Kiko Argüello (1939-) e a Serva de Deus
Carmen Hernández (1930-2016) foram seus co-iniciadores. O próprio Kiko se
referiu as origens desta realidade eclesial na primeira entrevista concedida à
televisão, onde falou abertamente de coisas muito interessantes que seguem
vigentes.
Foram várias as ocasiões nas quais ReL falou da relação
desta realidade eclesial com os mártires, como por exemplo quando fez-se
referência no dia do XX aniversário dos Mártires de Ruanda.
Também se destacou, em 2020, o caso de Marta Obregón,
divulgando-se a informação em 2023, ano em que também se deu a notícia da
estreia da segunda sinfonia composta por Kiko, O Messias, precisamente dedicada
os mártires.
Mais que recomendado é escutar o discurso que deu o
compositor depois da interpretação – o próprio Kiko, acompanhado pelo Padre
Mario Pezzi e Ascensión Romero, todos membros da atual Equipe Internacional
Responsável pelo Caminho Neocatecumenal – em que explicou o sentido e a
validade que tem, hoje, o espírito de mártir.
De igual modo pode-se destacar como informação sobre a relação do Caminho com
os mártires tudo o que foi publicado em ReL sobre a primeira sinfonia composta
por Kiko e
intitulada ‘O Sofrimento dos Inocentes’, já que está dedicada à Virgem Maria, primeira mártir e inspiradora
do nascimento desta realidade eclesial, que disse a Kiko, há 65 anos, no dia da
Imaculada:
“Há que fazer comunidades cristãs como a Sagrada
Família de Nazaré, que vivam em humildade, simplicidade e louvor. O outro é
Cristo.”
De igual modo, qualquer um que conheça o significado do
termo “martírio espiritual” pode facilmente perceber, ao ler os Diários
1979-1981 – diretamente relacionados com o desenvolvimento do Caminho
Neocatecumenal – que a Serva de Deus Carmen Hernández sofreu com isso durante
longos períodos de sua vida.
Foi o próprio Kiko que relacionou os mártires com o
nascimento do Caminho Neocatecumenal expressando-o da seguinte maneira:
“Espanha deu Cursilhos de Cristianismo, o Opus Dei, o
Caminho Neocatecumenal e tudo que você quiser. Sabe por quê? Porque houve uma
Guerra Civil Espanhola onde mais de 6.000 padres foram mortos, torturados,
martirizados: não houve uma única apostasia. As raízes do Caminho
Neocatecumenal estão banhadas no sangue de muitos mártires da Espanha.”
Certamente não podemos deixar de lembrar que em 2022 a Associação Católica de
Propagandistas – com um número significativo de mártires nas suas fileiras –
lançou uma campanha publicitária para dar a conhecer à sociedade espanhola a
realidade dos mártires espanhóis relacionados à Guerra Civil.
Nesta campanha se destacava sem rodeios que a Espanha era o
país em que mais gente morreu perdoando seus algozes, assassinos na realidade,
posto que as execuções se realizavam sem nenhum julgamento. Esta campanha foi
contestada ideologicamente, mas não rebatida em relação ás cifras.
Disso e junto com os dados de que hoje dispomos –
fundamentalmente, graças aos precisos cômputos realizados pelo maior expert em
vítimas da Frente Popular em Madri, Jose Manuel Ezpeleta – podia-se deduzir
diretamente que Madri é a cidade no mundo em que mais pessoas morreram
perdoando seus assassinos, já que é a primeiro em número de martirizados.
Palomeras – Terra Dos Mártires
Precisamente, o lugar onde estão enterrados mais
assassinados em processo de beatificação é o Campo Santo dos Mártires de
Paracuellos del Jarama, município do província de Madrid, em cuja capital
nasceu o Caminho Neocatecumenal, mais especificamente nos barracos que foram
assentados em 1964, em
um lugar chamado Palomeras.
Palomeras, além dos pequenos pombais, é o nome (em espanhol) dado às redes para
caçar pombos que ainda hoje se utilizam em alguns lugares da Espanha. Pode ter
sido essa a origem do nome de Palomeras de Madri, já que o lugar se localiza na
linha migratória dos pombas-torcazes, onde podiam fazer uma pausa para se
recuperar do esforço da travessia da Serra de Guadarrama em direção ao sul, ou
um
recesso para ganhar força para seguir em direção ao norte.
A Real Academia Espanhola também admite que “Palomeras” é um
pântano (charneca) de curta extensão, algo que em princípio também concordaria
com a área original de Palomeras. Seja como for, Palomeras foi o nome que
recebeu um local situado a sudoeste da vila de Vallecas, hoje bairro de Madri.
No mapa de Rafael de Aro y Villar, de 1755, que apresentamos a seguir,
observa-se que dito lugar ocupava um terreno que, com o passar do tempo, as
subdivisões urbanas, etc., incluiriam hoje dia não só o terreno da colônia das
favelas de Palomeras onde viveram Kiko Argüello e a Serva de Deus Carmen
Hernández e surgiu a primeira comunidade neocatecumenal do mundo cujo
responsável foi José Agudo, falecido recentemente, mas também os atuais bairros
de Pozo del Tío Raimundo e Santa Cecília, entre outros.
Resulta que esta área de Palomeras, além de ver o nascimento do Caminho
Neocatecumenal, em 1964, foi, antes, testemunha do maior fuzilamento público
ocorrido durante a Guerra Civil Espanhola, na qual morreu pela fé um número
ainda indeterminado de irmãos, alguns dos quais já estão em caminho da
santidade.
Estou falando dos episódios conhecidos como os Trens da
Morte, em que havia dois comboios que chegavam a Madrid cheios de prisioneiros
do sul da Espanha, principalmente de Jaén, com o objetivo de descongestionar o
que então funcionava como Prisão Popular, a Catedral de Jaén, à qual o Exército
da Frente Popular mantinha detidos pessoas que considerava perigosas, todos
eles simples civis desarmados.
A ideia era levar uma parte destes presos para a prisão
menos congestionada de Alcalá de Henares. Existem muitos estudos excelentes
sobre o que ocorreu nesses episódios. Santiago Mata é provavelmente quem mais
aprofundou no tema, tanto em seu livro intitulado O Trem da morte, como em
menor medida em Holocausto católico.
Para destacar no mesmo sentido, o mais que interessante
relato de uma testemunha ocular dos fatos, Ignacio de Valenzuela y Urzáiz,
sobrevivente da tragédia por se passar por um francês, que deixou relatado tudo
o que viu em sua obra El tren de Jaén, cujo manuscrito foi encontrado
fortuitamente por uma neta depois do falecimento dele, e que foi publicado há
pouco tempo com o aval da presença no ato de quem, sem dúvida, melhor conhece o
vitimário de Madri na época e mencionado anteriormente, José Manuel Ezpeleta,
que o recomendou a mim especialmente como o relato mais calmo e detalhado
daquela barbárie.
Os relatos que esses autores fazem dos fatos ocorridos
aparecem resumidos com maestria e com comentários precisos em um artigo de
Luis E. Togores que recomendo ler aqui . O autor indica com rotundidade que
entre os transferidos nos trens não havia militares ou civis diretamente
ligados ao golpe de Estado, mas sim pessoas identificadas pelos municípios de
Jaén por serem de direita ou católicos
praticantes.
O primeiro dos trens partiu em 11 de agosto de 1936, com 322 presos. Ao longo
de todo o percurso ele sofreu várias tentativas de assalto para assassinar os
passageiros. Este objetivo só foi alcançado com 11 pessoas, duas das quais já
são beatificados.
Trata-se das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo:
Irmã Juana Pérez Abascal, 49 anos, e Irmã Ramona Cao Fernández, com 52. Segundo
o biografia publicada por María Ángeles Infante Barrera, eram enfermeiras que
exerciam suas atividades no Sanatório Antituberculose de El Neveral, do qual
foram expulsas com as demais irmãs e que posteriormente foram presas e acusados
de roubo, e como não foram encontradas provas do delito, escaparam da morte
certa.
Como não encontraram uma maneira de permanecer ali, tiveram
a ideia de se mudar para Madri, vestidas como enfermeiras da Cruz Vermelha, mas
com seu rosário das Filhas da Caridade debaixo do uniforme, embarcando no trem
no qual iam os presos, quando finalmente foi conhecida a sua condição de
religiosas.
Tendo o trem chegado à região próxima onde depois Kiko e Carmen viveriam, em
Palomeras, a um quilômetro aproximadamente em linha reta onde esteve o povoado
das favelas onde nasceu o Caminho Neocatecumenal, foi parado e onze pessoas
saíram dele e foram assassinadas, entre as quais estavam estas Filhas da
Caridade.
Bento XVI assinou, em 20 de dezembro de 2012,, o decreto de reconhecimento
de martírio da Serva de Deus Melchora Cortés Bueno e companheiras, Irmã Juana e
Irmã Ramona incluídas. Foram 27 as Filhas da Caridade assassinadas na Espanha
na época.
Todavia, no dia seguinte a matança foi muito superior, e os detalhes são
conhecidos com maior precisão. No dia 12 de agosto, ao chegar o segundo trem na
Estação de Santa Cecília – a mártir (coincidências da vida) da qual havia uma
pintura importante no templo vizinho dedicado a San Pedro Ad vincula,
ainda em pé, e provavelmente alguma devoção na área – então em operação, o trem
foi parado por soldados do Exército da Frente Popular, e imediatamente eles o
desengancharam da locomotiva.
Segundo assinala Togores, falaram por telefone com o Diretor Geral de
Segurança, Manuel Muñoz Martínez, informando-lhe que haviam parado o trem e que
três metralhadoras estavam apontadas para ele. Manuel Muñoz ordenou aos guardas
civis que custodiavam os presos que os abandonassem à própria sorte, alegando
que “a pouca autoridade que o governo ainda tinha entraria em colapso se as
escassas forças da ordem pública acabassem sendo esmagadas em um confronto com
o povo
armado”.
Os 245 prisioneiros escoltados por 50 guardas civis sob as ordens do Alferes
Manuel Hormigo Montero compunham a expedição em direção a Alcalá, mas neste
segundo trem, as tropas da Frente Popular foram avisadas e agiram com a
barbárie que sempre os caracterizou em Madri. Logo que os guardas civis se
afastaram, começou a matança, presenciada por milhares de pessoas das
redondezas que se aproximaram para ver o espetáculo.
O que aconteceu, segundo declarou o sobrevivente Andrés
Portillo Ruiz sob juramento na Causa Geral, foi o seguinte:
“Então como já estávamos sob o poder dos vermelhos, estes
puseram o trem em marcha em direção a Alcalá de Henares, passando nesta linha
pela Estação de Santa Catalina, onde há um lugar que se chama ‘POZO DEL TIO
RAIMUNDO’, onde o trem parou, fazendo descer os detidos pela frente do trem de
10 em 10, mas não antes de lhes tirar tudo o que o que consideravam de valor…”
A Causa Geral continua:
“Cerca de trezentos detentos vinham de Jaén, imprensados no
trem. Próximo de Madri, em Villaverde, os milicianos do vilarejo os capturaram,
apesar dos quarenta guardas civis encarregados de sua proteção, e iniciaram o
mais feroz e desumano pelotão de fuzilamento em grupos de vinte e cinco, sem
qualquer investigação sobre suas pessoas ou crimes. Há cenas tristes de pais
testemunhando a morte de seus filhos e vice-versa. O bispo de Jaén, Sua
Excelência Dom Manuel Basulto, cai de joelhos, exclamando:
– Perdoe, Senhor, meus pecados e perdoe também meus
assassinos.
– Isso é uma infâmia- exclama sua irmã Teresa – eu sou uma
pobre mulher.
– Não se preocupe – responderam à ela- uma mulher vai
matá-la.
Então, uma miliciana desgrenhada chamada Josefa Coso “La
Pecosa” se aproximou e a matou no local a sangue frio. Quando ainda faltavam
cerca de quarenta prisioneiros, Leocadio, um jovem de 19 anos, aproximou-se do
grupo e, confrontando o líder da milícia, disse-lhe que responderia com a
própria vida por todos os que estavam no grupo restante (…) O feroz comandante
suspendeu as execuções, ameaçando-o: “Ai de você, se me enganar! Leve-os para
Vallecas e deixe-os provar sua inocência”.
Mas a história completa de acordo com o a documentação
existente é a seguinte:
“O trem foi desviado de seu trajeto até Madri e levado por
uma via de circunvalação ou ramal até às proximidades do lugar já mencionado do
Pozo del Tío Raimundo. Rapidamente, os criminosos começaram a fazer descer do
trem grupos de prisioneiros, que foram colocados ao lado de um aterro e diante
de três metralhadoras, sendo assassinado o Excelentíssimo e Ilustrísimo Sr.
Bispo e o Vigário Geral
Dom Félix Pérez Portela. A irmã do Sr. Bispo, que era a única mulher na
expedição, chamada Dona Teresa Basulto Jiménez, foi assassinada individualmente
por uma miliciana que se ofereceu para fazê-lo,
chamada Josefa Coso ‘La Pecosa ‘, que disparou sua pistola contra a citada
senhora, causando a sua morte; continuando a matança indiscriminada do resto
dos detidos, sendo este espetáculo presenciado por cerca de duas mil pessoas,
enquanto um grande número de pessoas observava o espetáculo com alegria
ruidosa. Esses assassinatos, que começaram nas primeiras horas de manhã do dia
12 de agosto de 1936, foram seguidos do despojo dos cadáveres das vítimas,
realizado pela multidão e pelas milícias, que se apoderaram de quaisquer
objetos que tivessem algum valor, cometendo atos de profanação e escárnio e
levando parte do resultado do saque às instalações do Comitê de Sangue de Vallecas,
cujos dirigentes foram, com outros, os maiores responsáveis pelo crime
relatado. (Cópia literal do Livro: La Causa General. Páginas 177-178)”.
E foi assim que, em 12 de agosto, 193 dos prisioneiros que o
trem transportava foram assassinados, incluindo o bispo de Jaén, Manuel Basulto
Jiménez – o único bispo assassinado em Madri – com sua irmã, o marido dela e o
vigário geral da diocese de Jaén, Félix Pérez Portela.
O bispo de Jaén, Manuel Basulto Jiménez, de 67 anos, e seu
vigário Félix Pérez Portela, de 41. Basulto, que era bispo de Lugo desde 1910 e
bispo de Jaén desde 1920, demonstrou sua disposição para o martírio assim que
deixou a Catedral de Jaén. Pouco antes de sua morte, ele cruzou os braços sobre
o peito e se ajoelhou.
O último sobrevivente do massacre ainda vivo, Leocadio
Moreno, o Leocadio mencionado anteriormente no relato da Causa Geral, sempre se
lembrou vividamente do “gesto de pastor” do vigário geral, quando lhe pediu
absolvição antes de seu previsível fuzilamento – que não ocorreu – e Portela
lha deu, antes de escapar dos milicianos que o puxavam para fora do vagão do
trem. Santiago Mata conseguiu localizar o local exato dos assassinatos.
O segundo trem partiu de Jaén em 12 de agosto. Dessa vez, o
trem evitou passar por Atocha para evitar que os prisioneiros caíssem nas mãos
de Villalba Corrales e seus milicianos. Todas as vítimas foram enterradas em
duas trincheiras abertas ao lado dos muros do cemitério de Vallecas. Togores
indica que, na década de 1940, seus restos mortais foram transferidos para a
cripta da Igreja do Sagrario na Catedral de Jaén.
Na catedral de Jaén há várias lápides de mármore com quase
todos os nomes dos assassinados. Seus assassinos não foram processados nem
condenados por esses crimes pelas autoridades da Frente Popular em nenhum
momento. Quando o governador civil de Jaén descobriu o que havia acontecido,
devastado pelos assassinatos, ele renunciou.
Os 40 sobreviventes do massacre de Palomeras foram parar no
Cárcel Modelo, em Madri. Muitos deles seriam mortos algumas semanas depois em
Paracuellos del Jarama.
A Igreja Católica testemunha a autenticidade da afirmação
de Tertuliano Sanguis martyrum semen christianorum. Esse tem sido o
caso ao longo de sua história, e continua sendo nos últimos tempos. O caso das
origens do Caminho Neocatecumenal em Madri e de outras realidades eclesiais,
tanto em Madri como em outras cidades do mundo, como Roma, é mais um deles.
Nesse sentido, é surpreendente que em pelo menos dois outros
campos de mártires da capital espanhola, nos cemitérios de Hortaleza e Canillas
e no cemitério de Almudena, tenham surgido, com o tempo, comunidades
neocatecumenais nas paróquias de Nuestra Señora del Tránsito e Santas Perpetua
y Felicidad e San Emilio, respectivamente. Anos mais tarde, o Caminho
Neocatecumenal começaria a se desenvolver em Roma, uma cidade regada pelo
sangue dos Santos Pedro e Paulo e de tantos outros.
Espero que essa curiosa coincidência, até então não
descrita, sirva como um presente para todos aqueles que estão celebrando o 60º
aniversário do Caminho Neocatecumenal.
*Matéria publicada no site do Religión en Libertad, em
22 de fevereiro de 2024. Autor: Alfonso V. Carrascosa. Para ler a matéria
original, em espanhol, clique
aqui.
Fonte: https://cn.org.br/
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