Por que tantos asiáticos estão abandonando suas religiões?
- Author,Lebo Diseko
- Role,Correspondente de religião global do BBC World Service
- Twitter,@lebo_diseko
- 2 julho 2024
Joon (nome fictício) foi criado em um lar cristão
na Coreia do Sul. Mas, como muitas pessoas em seu país natal, suas crenças religiosas
são agora muito diferentes de quando ele era criança.
Ele se identifica hoje como agnóstico.
"Não sei o que há por aí. Deus pode
existir, ou talvez não seja exatamente Deus — algo sobrenatural", diz ele, por
telefone, de Seul.
Os pais de Joon ainda são cristãos convictos, e ele
acredita que sentiriam uma "tristeza profunda" se soubessem que ele
não era mais cristão.
Ele não quer chatear os pais, então pediu para usar
um nome diferente.
A experiência de Joon reflete as conclusões de um
novo estudo do think tank americano Pew Research Center, que mostra que os
países do Leste Asiático apresentam uma das taxas mais elevadas tanto de
pessoas que abandonam quanto de pessoas que trocam de religião no mundo.
Mais de 10 mil pessoas foram entrevistadas sobre
suas crenças, e muitas disseram que agora possuem uma identidade religiosa
diferente daquela na qual foram criadas.
Hong Kong e a Coreia do Sul estão no topo da lista,
com 53% dos entrevistados em cada país afirmando que mudaram sua identidade
religiosa, incluindo abandonar completamente a religião.
Em Taiwan, 42% das pessoas mudaram de crença
religiosa; e no Japão, 32%.
Para efeito de comparação, um levantamento de 2017
na Europa não encontrou nenhum país onde a taxa de mudança excedesse 40%.
Nos EUA, dados coletados em 2023 revelaram que
apenas 28% dos adultos já não se identificam com a fé em que foram criados.
No Brasil, a taxa usada para comparação fica um pouco acima de 10%.
Para Joon, a mudança de perspectiva coincidiu com o momento em que saiu de casa e foi exposto a novas ideias.
Enquanto crescia, sua família "acordava todas
as manhãs por volta das 6h, e todos liam e compartilhavam versículos
bíblicos".
Todas as manhãs "era como um pequeno culto de
devoção", relembra.
Ele saiu de casa aos 19 anos e começou a frequentar
uma das maiores igrejas de Seul — uma megaigreja com milhares de membros.
Ela adotava uma interpretação muito literal
da Bíblia, rejeitando, por exemplo, a teoria da evolução. Isso era incompatível com a teoria científica que
Joon havia aprendido. Sua visão de mundo também mudou de outras maneiras.
"Acho que o Cristianismo tem uma noção muito clara de preto no branco,
certo ou errado. Mas depois de observar a sociedade e conhecer pessoas de
diferentes origens, comecei a pensar que o mundo consiste em mais zonas
cinzentas."
Joon diz que cerca de metade dos seus amigos já não
acredita na fé na qual foram criados, especialmente aqueles que foram criados
como cristãos.
E não é só o cristianismo que está perdendo adeptos
ao seu redor: 20% das pessoas que foram criadas como budistas já abandonaram a
religião. Em Hong Kong e no Japão, esse percentual é de 17%.
Há pessoas na região que optam por adotar uma nova
fé. Na Coreia do Sul, por exemplo, 12% dos cristãos eram recém-chegados à
religião, enquanto os novos devotos do budismo representavam 5%.
Em Hong Kong, os novos adeptos do cristianismo e do
budismo somavam 9% e 4%, respectivamente.
No entanto, o maior grupo entre aqueles que mudam
sua identidade religiosa é formado por aqueles que não se identificam com
nenhuma, e este número é mais alto nos países do Leste Asiático do que em
outras partes do mundo.
No total, 37% das pessoas em Hong Kong e 35% das
pessoas na Coreia do Sul disseram que esta era sua experiência, em comparação
com 30% na Noruega ou 20% nos EUA.
Mas apesar do que parece ser uma crescente
secularização, um grande número de pessoas em toda a região afirma que ainda
participa de rituais e práticas espirituais.
Em todos os países pesquisados, mais da metade das
pessoas sem religião disseram ter participado de rituais para homenagear seus
antepassados nos últimos 12 meses.
E a maioria das pessoas entrevistadas em toda a
região afirma acreditar em deuses ou seres invisíveis.
Nada disso surpreende Se-Woong Koo, especialista em
estudos religiosos em Seul.
Em conversa com a BBC, ele diz que a capacidade de
adotar partes de diferentes religiões está em sintonia com a história da
região.
"Historicamente falando, no Leste Asiático
havia menos foco no que se poderia chamar de identidade religiosa exclusiva. Se
você fosse taoísta, isso não significava que não pudesse ser budista ao mesmo
tempo ou confucionista. Estas fronteiras eram muito menos claramente demarcadas
do que no Ocidente."
Só no século 19, após o aumento do contato e das
interações com o Ocidente, que o conceito de religião que temos hoje foi levado
para o Leste Asiático.
E ser capaz de adotar múltiplas identidades e
tradições foi algo que nunca desapareceu na região, explica Koo.
Ele também viu isso de perto. O especialista afirma
que sua mãe mudou de religião em diversas ocasiões.
"No fim de semana passado, ela se registrou
como membro de uma Igreja Católica na nossa região. E eu tinha certeza de que
ela iria para lá no domingo."
Mas então ela disse a ele que, na verdade, estava
"indo para uma sessão de oração e cura" em uma igreja evangélica
local.
Koo perguntou: "O que aconteceu com a Igreja
Católica, mãe?"
E ela respondeu que, naquele momento, precisava
"mais de cura do que qualquer outra coisa".
Sua mãe "queria ir para a Igreja Católica
porque ela costumava ser católica. Mas de alguma forma, quando se trata de
receber um tipo específico de intervenção física que ela acredita precisar, ela
recorre a outra tradição".
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