SUPERAR O ANTROPOCENTRISMO NA ECOLOGIA
Dom Leomar Antônio Brustolin
Bispo de Santa Maria (RS)
O antropocentrismo gerou uma civilização
sedenta de poder e ambiciosa em dominar tudo, especialmente a natureza. A
crise não surgiu apenas por meio das tecnologias que possibilitaram a
exploração da natureza . Ela se baseia muito mais na ambição que pessoas têm
por poder e prepotência. A atitude possessiva e destruidora do ambiente
não pode ser compreendida sem a centralidade do ser humano como dominador e
articulador da crise.
Se tudo está interligado numa grande rede de
relações, a crise ética deve ser considerada uma das consequências mais
nefastas da prepotência antropocêntrica das últimas décadas.
Jamais a humanidade pode isentar-se de
relações com o ambiente natural, até porque é também participante da natureza.
O ser humano não se coloca apenas diante da natureza como um sujeito de
conhecimento e de atividade, mas se coloca como sujeito de uma história junto à
natureza. O ser humano tem natureza e é natureza. Ele toma consciência não
apenas do poder que ele dispõe sobre a natureza, mas também da solidariedade em
relação à natureza à qual está coligado.
A ação humana, suas decisões e seu estilo de
vida afetam profundamente a vida no planeta. A ética nasce da responsabilidade
diante do outro. Acolhendo ou rejeitando o semelhante, definem-se as relações
de cooperação ou de dominação. Decorre, então, a necessidade estabelecer
critérios que permitam cuidar da vida.
O equilíbrio entre biocentrismo e
antropocentrismo implica em alinhar justiça social com justiça ecológica. O
equilíbrio nessa relação é de fundamental importância. Não basta querer
defender uma justiça ambiental se em contrapartida se relega às pessoas apenas
uma nefasta injustiça. A destruição do cosmos provoca também feridas sociais
insanáveis. Ou melhor, a degradação ambiental é parte de uma tragédia complexa,
de uma crise cultural.
Percebe-se como a história apresenta uma bela
fachada de progresso, de um futuro promissor através da evolução da Ciência e
da técnica, mas esconde o lado apocalíptico, escuro e mortal das massas
“sobrantes” do planeta e da crise ecológica que ameaça a vida humana na
Terra.
Há uma ambiguidade fundamental na atual fase
do mundo. Enquanto uma minoria do planeta já vive no futuro da informática, do
mundo virtual, do conforto e da facilidade que a tecnologia pode oferecer, a
grande maioria da população global, vive no passado, sem direito à saúde,
educação, alimentação e moradia. Se esse sistema e esse
estilo de vida perdurarem, não será possível pensar o futuro da
espécie humana . Onde há cobiça, há também instrumentalização. A Terra
instrumentalizada possibilita a manipulação dos seres humanos e a
negação da justiça através de um jogo de poder e dominação.
Nem toda forma de ação humana é
verdadeiramente uma humanização da história. Existe também uma história de
trevas, onde o domínio técnico-científico, marcado pelo materialismo e guiado
pelo jogo do poder e do mercado, deturpa e afeta a imagem de ser humano,
alienada nas estruturas do mal.
A fé cristã professa que o universo está
destino a participar da própria história íntima de Deus. Aqui, então, vale o
princípio: nada se perde, tudo se transforma e mais, tudo será transfigurado em
Deus.
Fonte: https://www.cnbb.org.br/
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