Algo
grande e que seja amor (11): Frutos da fidelidade
A certeza de
saber-nos sempre com Deus é uma fonte viva de esperança, da qual brotam
mananciais de alegria e paz, que fecundam as nossas vidas e as vidas das
pessoas que convivem conosco.
20/08/2019
Uma eficácia que não podemos imaginar
Hoje tornou-se indispensável cultivar e divulgar a própria
imagem e o perfil pessoal perante os outros, para estar presentes e ter impacto nas
várias áreas das redes sociais e profissionais. No entanto, se perdermos de
vista o fato de que vivemos em Deus, que Ele “está junto de nós continuamente”[11],
esse interesse pode levar a uma obsessão mais ou menos sutil de nos sentirmos
aceitos, reconhecidos, seguidos e até mesmo admirados. Há então uma necessidade
constante de verificar o valor e a transcendência de tudo o que fazemos ou
dizemos.
Esse desejo de ser reconhecidos e comprovar o nosso valor,
no fundo responde, mesmo que de um modo tosco, a uma verdade profunda. É que de
fato, valemos muito. Tanto, que Deus quis dar a sua vida por cada um. No
entanto, com muita facilidade, começamos a exigir, mesmo de maneira
muito sutil, o amor e o reconhecimento que só podemos acolher.
Talvez seja por isso que o Senhor quis salientar no Sermão da Montanha:
“Guardai-vos de fazer vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos
por eles. Do contrário, não tereis recompensa junto de vosso Pai que está no
céu” (Mt 6,1). E, ainda de forma mais radical: “que tua mão
esquerda não saiba o que fez a direita” (Mt 6,3).
Este risco de exigir Amor em vez de acolhê-lo perderá força
em nós se agirmos com a convicção de que Deus contempla a nossa vida com um
carinho minucioso – porque o amor está nos detalhes. “Se queres ter
espectadores das coisas que fazes, aí os tens: os anjos, os arcanjos e até o
próprio Deus do Universo”[12].
Experimenta-se então na alma a autoestima de quem se sabe sempre bem
acompanhado e não precisa de estímulos externos especiais para confiar na
eficácia da sua oração e da sua vida. E isso, tanto se ela é conhecida por
muitos, como se passasse ignorada pela grande maioria. Será suficiente para nós
termos em mente o olhar de Deus e sentir as palavras de Jesus dirigidas a cada
um de nós: “e teu Pai, que vê o escondido, recompensar-te-á” (Mt 6,4).
Podemos aprender muito, neste sentido, dos anos ocultos de
Jesus em Nazaré. Lá, Ele passou a maior parte da sua vida na terra. Sob o olhar
atento do seu Pai do Céu, da Virgem Maria e de São José, o Filho de Deus já
estava realizando, em silêncio e com infinita eficácia, a Redenção da
humanidade. Poucos o viam, mas lá, em uma modesta oficina de artesão, em uma
pequena aldeia na Galiléia, Deus mudava para sempre a história dos homens. Nós
também podemos ter essa fecundidade da vida de Jesus, se O deixarmos transparecer
em nós, se O deixarmos amar em nossa vida, com essa simplicidade.
Deus continua a mudar o mundo, ficando oculto em cada
Sacrário, nas profundezas do nosso coração. É por isso que a nossa vida de
entrega, em união com Deus e com os outros, adquire, pela Comunhão dos Santos,
uma eficácia que não podemos imaginar nem medir. “Não sabes se progrediste, nem
quanto... – De que te serviria esse cálculo?... – O importante é que
perseveres, que o teu coração arda em fogo, que vejas mais luz e mais
horizonte...: que te afadigues pelas nossas intenções, que as pressintas –
mesmo que não as conheças -, e que por todas rezes”[13].
Deus é o de sempre
São Paulo incentivava os cristãos a serem fiéis, a não se
preocuparem em ir contra a maioria e trabalhar com os olhos no Senhor: “Por
consequência, meus amados irmãos, sede firmes e inabaláveis, aplicando-vos cada
vez mais à obra do Senhor. Sabeis que o vosso trabalho no Senhor não é em vão”
(1 Cor 15,58). São Josemaria repetia de diferentes maneiras a
mesma exortação do apóstolo: “Se fordes fiéis, podereis chamar-vos vencedores.
Na vossa vida, não conhecereis derrotas. Não existem fracassos, quando se trabalha
com retidão de intenção e querendo cumprir a vontade de Deus. Com êxito ou sem
ele, teremos triunfado, porque teremos feito o trabalho por Amor”[14].
Saber-se acompanhando sempre por Deus aumenta nossa
simplicidade e confiança em que Ele tudo pode
Em qualquer caminho vocacional, após um tempo de entrega,
podemos vir a sentir a tentação do desânimo. Talvez pensemos que não fomos
muito generosos até este momento, ou que a nossa fidelidade dá poucos frutos e
que temos pouco sucesso apostólico. Nesses casos é bom lembrar o que Deus nos
assegurou: “Não trabalharão mais em vão” (Is 65,23). São Josemaria
o expressava assim: “Ser santo implica ser eficaz, mesmo que o santo não toque
nem veja a eficácia”[15].
Deus às vezes permite que os seus fiéis sofram provações e dificuldades em seu
trabalho, para fazer a sua alma mais bela, o seu coração mais terno. Quando,
apesar da nossa vontade de agradar a Deus, ficamos desanimados ou cansados, não
deixemos de trabalhar com sentido de mistério: tendo presente que a
nossa eficácia, muitas vezes, “é invisível, incontrolável, não pode ser
contabilizada. A pessoa sabe com certeza que a sua vida dará frutos, mas sem
pretender conhecer como, onde ou quando. (…) Continuemos para diante,
empenhemo-nos totalmente, mas deixemos que seja Ele a tornar fecundos, como
melhor Lhe parecer, os nossos esforços”[16].
O Senhor pede que trabalhemos com abandono e com confiança
nas suas forças e não nas nossas, na sua visão das coisas e não na nossa
limitada percepção. “Quando te abandonares de verdade no Senhor, aprenderás a
contentar-te com o que vier, e a não perder a serenidade, se as tarefas –
apesar de teres posto todo o teu empenho e utilizado os meios oportunos – não
correm a teu gosto... Porque terão ‘corrido’ como convém a Deus que corram”[17].
A consciência de que Deus pode tudo e de que Ele vê todo o bem que fazemos e o
guarda com carinho, por menor e escondido que possa parecer, nos ajudará “a
estar seguros e otimistas nos momentos duros que podem surgir na história do
mundo ou na nossa existência pessoal. Deus é o mesmo de sempre: onipotente,
sapientíssimo, misericordioso, e, em todo o momento, sabe tirar, do mal, o bem;
das derrotas, grandes vitórias para os que confiam n’Ele”[18].
Unidos a Deus, nós vivemos no meio do mundo como seus
filhos, e vamos nos convertendo em semeadores de paz e alegria para todos os
que vivem ao nosso redor. Essa é a obra paciente e artesanal que Deus realiza
em nossos corações. Deixemos que ilumine todos os nossos pensamentos e que
inspire todas as nossas ações. É o que fez nossa Mãe, a Virgem Maria, feliz ao
ver as grandes coisas que o Senhor fez em sua vida. Possamos nós também saber
dizer todos os dias, como Ela: Fiat! Faça-se em mim segundo a Tua
palavra (Lc 1,38).
Pablo Edo
Tradução: Mônica Diez
[11] São
Josemaria, Caminho, n. 267.
[12] São
João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 19.2 (PG 57, 275).
[13] São
Josemaria, Forja, n. 605.
[14] São
Josemaria, A sós com Deus, n. 314 (AGP, Biblioteca, P10).
[15] Forja,
n. 920.
[16] Francisco,
Ex. Ap. Evangelii gaudium (24/11/2013), n. 279.
[17] São
Josemaría, Sulco, n. 860.
[18] D.
Javier, Carta pastoral, 4/11/2015.
Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/algo-grande-e-que-seja-amor-frutos-da-fidelidade/
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