Levi, filho de Alfeu (Mc 2,14), era galileu, segundo
a Tradição, e provavelmente solteiro, uma vez que nenhum dos Evangelhos (isto
é, os sinóticos, que mencionam a sua conversão) fazem alusão a que tenha
deixado família para seguir a Cristo. Morava em Cafarnaum, uma das
cidades mais florescentes da Palestina, à beira do Lago Genesaré, onde
Jesus pregou muitas vezes e onde fez muitos milagres.
Levi era rico por causa da profissão que exercia, como
cobrador (ou coletor) de impostos para os romanos, intermediados pelo
tetrarca (governante) judeu Herodes Antipas. Sua função era ter “comércio
público e banco aberto para passar letras de câmbio, expedir mercadorias,
arrecadar tributos e passá-los a Roma”. Ou seja, os impostos que os
judeus pagavam eram entregues aos conquistadores estrangeiros, implicando em
financiar quem os subjugava à força. Por isso tais cobradores,
denominados depreciativamente de publicanos (“pecadores públicos”), eram
socialmente desprezados como colaboracionistas detestáveis.
Os judeus mais observantes (fariseus) consideravam um
absurdo que homens do povo eleito cobrassem tributos para um poder
conquistador, e além disso pagão; “o pagamento do tributo ao
estrangeiro era um ato ilícito, uma coisa proibida pela Lei, um verdadeiro
sacrilégio; e, portanto, o que colaborava com esse sacrilégio fazia uma traição
à pátria, associava-se aos ímpios, vendia-se aos gentios, e era mais execrável
do que eles. Sua condição só podia comparar-se à dos criminosos e das
prostitutas”.
Levi era um notório pecador no entendimento judaico (diferente
da concepção católica), isto é, “significava antes uma impureza legal
ou por descuido das prescrições farisaicas rituais ou por desempenhar um ofício
proibido”. De resto, muitos publicanos eram desonestos e exploravam o
povo de forma ilegal, de modo que não havia simpatia por eles. Por
outro lado, se os fariseus, especificamente, consideravam os cobradores de
impostos como pecadores, a profissão em si era lícita, e os havia judeus
praticantes e de boa-fé, como fica claro na resposta de São João Batista aos
que lhe perguntaram como fazer para se salvar: ele responde apenas que sendo
honestos no trabalho, e não mudando de atividade (cf. Lc 3,12-13).
Não se sabe se Levi era um cobrador honesto ou
desonesto antes de seguir a Jesus. Estava sentado no seu posto de
cobranças em Cafarnaum, à beira do lago (Mc 2,13-14), onde eram recebidas
mercadorias e feitos os pagamentos, e Jesus, vindo de fazer um
estrondoso milagre na cura de um paralítico cujos amigos haviam descido do teto
para a sala onde Ele estava (Lc 5,17-26), lhe disse: “‘Segue-me!’ E,
deixando tudo, ele se levantou e começou a segui-Lo” (Lc cf. 5,27-28).
Vivendo em Cafarnaum, era muito provável que Levi já
conhecesse Jesus, ainda antes de converter-se, ao menos por ter Dele ouvido
falar, mas se não, a sua conversão instantânea não seria surpreendente,
dado o poder de atração que o Senhor tinha sobre os corações, como comenta São
Jerônimo sobre esta passagem; e, honesto ou desonesto, é maravilhosa e exemplar
a prontidão da sua obediência. Por Cristo, imediatamente deixou,
inacabadas, suas tarefas para este mundo, sem recear punições, isto é, por amor
a Deus, o único motivo certo, foi capaz de instantaneamente abandonar as
atividades mundanas e os respeitos humanos. E a partir daí, nunca
voltou atrás, mas permaneceu grato ao Mestre, e perseverou no Seu seguimento.
A medida da gratidão de Levi ao Senhor é indicada
imediatamente depois nos Evangelhos, pois O convida para um grande
banquete em sua casa, que foi aberta também aos discípulos de Jesus e a outros
publicanos e pecadores – o que indica não apenas a consideração e amor
ao Mestre mas igualmente a vontade de levar a Ele mais pessoas, numa forma já
de confraternização e apostolado… ocasião na qual Jesus certamente os acolheu,
e ainda ensinou tanto a fariseus quanto aos discípulos de João Batista (cf.
Mt 9,10-17).
A mudança de vida era frequentemente acompanhada, na época e
na cultura local, da mudança de nome, e Jesus mesmo renomeou Simão como Pedro
(cf. Mt 16,17-18). Uma feliz passagem da “Legenda Áurea” de Jacopo
Varazze (biografias de santos, escritas no século XIII) comenta que “‘Levi’
quer dizer ‘retirado’, ‘colocado’, ‘acrescentado’, ‘incorporado’. Ele
foi a) retirado de seu posto de cobrança de impostos, b) colocado
entre os Apóstolos, c) acrescentado à comunidade dos
evangelistas e d) incorporados ao catálogo dos mártires.”; e a “transladação”
deste nome foi para “Mateus”, que significa “presente”, “dádiva” ou “dom de
Deus”, o que de fato este evangelista passou a ser.
São Mateus acompanhou Jesus por quase todo o período de
três anos da Sua vida pública, e certamente empregou os seus antigos bens em
boas obras, no auxílio aos pobres e aos discípulos. Foi assim
testemunha direta do que depois relatou no seu próprio Evangelho. Aliás,
nem Mateus nem Lucas, quando o mencionam nas listas dos Apóstolos, o chamam de
“publicano”, mas somente ele mesmo, indicando com humildade como se sabia
pecador. Seu nome é apenas citado ainda nos Atos dos Apóstolos, não havendo
sobre ele outras notícias nas Escrituras.
Além da sua missão como um dos 12 Apóstolos, sua
grandiosa tarefa foi justamente escrever o primeiro dos quatro Evangelhos,
de acordo como que havia dito Jesus: “o Espírito Santo, que o Pai enviará em
Meu nome, Esse vos ensinará tudo, e vos trará à memória tudo quanto Eu vos
disse” (Jo 14,26). Este registro, desejado por Deus para chegar às futuras
gerações, era transmitido oralmente nos primeiros anos da Igreja, mas surgiu a
necessidade natural – sem se ignorar, desprezar ou esquecer a Tradição – de
notas escritas. Mateus escreveu para os cristãos de origem judaica, e
por isso o fez em Aramaico, não em Grego, ressaltando para este público
específico que Cristo é o verdadeiro Messias, realizando plenamente as
promessas e profecias do Antigo Testamento, e oferecendo provas da divindade de
Jesus.
O Evangelho de Mateus desde o início foi o mais utilizado,
o mais citado e o mais comentado pela Igreja, sendo conhecido por todos os
autores cristãos do século I e citado expressamente como de sua autoria pelos
principais historiadores dos séculos II e III. É chamado de “Evangelho
Católico”, porque traz os textos mais importantes sobre o primado de Pedro (Mt
16,17-19), a jurisdição na Igreja (Mt 18,18) e a missão universal de
evangelização de todos os povos (Mt 28, 19-20). Junto aos Salmos de
Davi e as Epístolas de São Paulo, são os textos mais lidos na Igreja.
Com a perseguição aos Apóstolos (cf. Jo 16,2), depois da
Ascensão de Jesus, estes se dispersaram por várias partes, levando a Palavra de
Deus. Parece certo que Mateus foi para a Palestina, mas informações
posteriores não são tão claras. São citadas Pérsia, Síria, Macedônia,
e a Igreja Copta da Etiópia proclama desde sempre ter sida fundada por São
Mateus, mas disso não há comprovação cabal. Uma tradição diz que morreu
mártir, porém também não existem confirmações fidedignas. Há relíquias suas na
Catedral de Salerno, Itália.
São Mateus é o padroeiro dos banqueiros, alfandegários,
contabilistas, cobradores, consultores tributários e da Guardia di Finanza
italiana, de modo a favorecer a união do fiel exercício do dever para com o
Estado com o fiel seguimento de Cristo, nesta instituição.
Colaboração: : José Duarte de Barros Filho
Reflexão:
Pode-se resumir na atitude de São Mateus a essência de toda
a vida católica, e de todo o ensino da Igreja: abandonar o mundo e seguir a
Cristo. Normalmente, porém, a simplicidade desta formulação é inversamente
proporcional à sua execução, apegados, como tendemos a ser, aos atrativos deste
mundo… o que apenas exalta a grandiosidade do coração deste Apóstolo, que não
hesitou na sua decisão e ação. Qualquer que seja, apesar de tudo, o tempo e o
esforço necessário, o fundamental é não ficar sentado às margens deste mundo,
mas levantar-se espiritualmente, elevar a alma para seguir Jesus, porque, Ele,
vai para o Alto. Por outro lado, atitudes simples como ser honesto na
profissão, algo acessível a qualquer um, já caracterizam passos firmes neste
colocar-se em pé sobrenatural. A grandeza, e também delicadeza, do coração de
São Mateus é entrevista igualmente no convite que faz a Jesus para um banquete
na sua casa, convidando aqueles que certamente precisavam se aproximar do
Senhor: que bela é a sua consideração e reconhecimento a Deus pelo dom inefável
de ter sido chamado por Ele, e que prova de amor ao próximo em querer
imediatamente compartilhar com os irmãos a sua própria comunhão com Deus! E é
exatamente no Banquete Eucarístico que melhor o fazemos.
Oração:
Senhor Deus e Redentor nosso, que continuamente nos chamais
para Vós, concedei-nos pela intercessão de São Mateus conhecer e viver o
Evangelho, sem jamais repudiá-lo, mas permanecendo infinitamente agradecidos à
Vossa bondade, perseverarmos na obediência a Vós, levando pela conversão,
palavras e ações a Boa Nova aos irmãos. Por Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa
Senhora. Amém.
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