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quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Transmitir a fé (II) (1)

Foto: Vironevaeh | Opus Dei

Transmitir a fé (II)

Dar exemplo, dedicar tempo, rezar… a transmissão da fé aos filhos é uma tarefa que exige empenho. Segunda parte do editorial sobre a fé e a família.

02/08/2012

Quando se busca educar na fé, não se deve separar a semente da doutrina da semente da piedade[1]: é preciso unir o conhecimento com a virtude, a inteligência com os afetos. Neste campo, mais que em muitos outros, os pais e educadores devem cuidar do crescimento harmonioso dos filhos. Não bastam algumas práticas de piedade com um verniz de doutrina, nem uma doutrina que fortaleça a convicção de dar o culto devido a Deus, de relacionar-nos com Ele, de viver as exigências da mensagem cristã, de fazer apostolado. É preciso que a doutrina se faça vida, que resulte em determinações, que não seja algo desligado do dia a dia, que se converta em compromisso, que leve amar a Cristo e aos demais.

Elemento insubstituível da educação é o exemplo concreto, o testemunho vivo dos pais: rezar com os filhos (ao levantar-se, ao deitar-se, ao abençoar os alimentos); dar a devida importância ao papel da fé no lar (prevendo a participação na Santa Missa durante as férias ou procurando lugares sadios – que não sejam dispersivos – para distrair-se) ; ensinar de forma natural a defender e transmitir sua fé, a difundir o amor a Jesus. “Assim, os pais infundem profundamente no coração de seus filhos, deixando marcas que os acontecimentos posteriores da vida não conseguirão apagar"[2].

É necessário dedicar tempo aos filhos: o tempo é vida[3], e a vida – a de Cristo que vive no cristão – é o melhor que se lhes pode dar. Passear, organizar excursões, falar de suas preocupações, de seus conflitos: na transmissão da fé, é preciso, sobretudo, “estar e rezar"; e se nos equivocamos, pedir perdão. Por outro lado os filhos também devem experimentar o perdão, que faz com que sintam que o amor que se lhes tem é incondicional.

POR PROFISSÃO, PAIS

Explica Bento XVI que os mais jovens, “desde que são pequenos, têm necessidade de Deus e têm a capacidade de perceber sua grandeza; sabem apreciar o valor da oração e dos ritos, assim como intuir a diferença entre o bem e o mal. Acompanhando-os, portanto, na fé, desde a idade mais tenra"[4]. Conseguir nos filhos a unidade no que se crê e o que se vive é um desafio que deve enfrentar evitando a improvisação, e com certa mentalidade profissional. A educação na fé deve ser equilibrada e sistemática. Trata-se de transmitir uma mensagem de salvação, que afeta toda a pessoa, e deve enraizar na cabeça e no coração de quem a recebe; e isto, entre aqueles que mais queremos. Está em jogo a amizade que os filhos tenham com Jesus Cristo, tarefa que merece os melhores esforços. Deus conta com nosso interesse por fazer-lhes acessível a doutrina, para dar-lhes sua graça e fixar-se em suas almas; por isso, o modo de comunicar não é algo acrescentado ou secundário à transmissão da fé, mas que pertence à sua própria dinâmica.

Foto: Bob Jagendorf | Opus Dei

Para ser um bom médico não é suficiente atender a uns pacientes: é preciso estudar, ler, refletir, perguntar, investigar, assistir a congressos. Para sermos pais, é preciso dedicar tempo a examinar-se sobre como melhorar no próprio trabalho educativo. Em nossa vida familiar saber é importante, o saber fazer é imprescindível e o querer fazer é determinante. Pode não ser fácil, porém não basta enganar-se escondendo-se nas outras tarefas que temos: convém sempre tirar alguns minutos do dia, ou umas horas nos períodos de férias, para dedicá-los a própria formação pedagógica.

Não faltam recursos que possam ajudar a este aperfeiçoamento: são muitos os livros, vídeos e portais da internet bem orientados nos quais os pais encontram ideias para educar melhor. Além disso, são especialmente eficazes os cursos de Orientação Familiar, que não só transmitem um conhecimento, ou umas técnicas, mas que ajudam a percorrer o caminho da educação dos filhos e o da melhoria pessoal, matrimonial e familiar. Conhecer com mais clareza as características próprias da idade dos filhos, assim como o ambiente no qual se movem seus iguais, forma parte do interesse normal por saber o que pensam, o que os move, o que os põe em dúvida. Em última análise, permite conhecê-los, e isso facilita educá-los de um modo mais consciente e responsável.

MOSTRAR A BELEZA DA FÉ

Conseguir que os filhos interiorizem a fé requer aproveitar as diferentes situações de modo que aconselhem a consonância entre as razões humanas e as sobrenaturais. Os pais e educadores devem sim, propor-se metas, porém mostrando a beleza da virtude e de uma existência cristã plena. Convém, pois, abrir horizontes, sem limitar-se a mostrar o que é proibido ou é obrigatório. Se não fosse assim, poderíamos induzir a pensar que a fé é uma dura e fria normativa que limita, ou um código de pecados e imposições; nossos filhos acabariam fixando-se somente na parte áspera da senda, sem ter em conta a promessa de Jesus: “meu jugo é suave"[5]. Pelo contrário, na educação deve estar muito presente que os mandamentos do Senhor valorizam a pessoa, a elevam a um desenvolvimento mais pleno: não são insensíveis negações, mas propostas de ação para proteger e fomentar a vida, a confiança, a paz nas relações familiares e sociais. É tentar imitar a Jesus no caminho das bem-aventuranças.

Seria, por isso, um erro associar “motivos sobrenaturais" ao cumprimento de encargos, ou tarefas. Ou de “obrigações" que lhes sejam difíceis. Não é bom, por exemplo, abusar do recurso de pedir à criança que tome a sopa como um sacrifício ao Senhor: dependendo de sua vida de piedade e de sua idade, pode se tornar conveniente, porém há que se procurar outros motivos que os estimulem. Deus não pode ser o “antagonista" dos caprichos, deve-se procurar antes que não tenham caprichos, e cheguem a estar em condições de alcançar uma vida feliz, desprendida, guiada pelo amor a Deus e aos demais.

Foto (Crédito: Opus Dei)

A família cristã transmite a beleza da fé e do amor a Cristo, quando se vive em harmonia familiar por caridade, sabendo sorrir e esquecer-se das próprias preocupações para atender aos demais, a não dar importância a pequenos atritos que o egoísmo poderia converter em montanhas; a depositar um amor grande nos pequenos serviços de que se compõe a convivência diária[6].

Uma vida dirigida para o esquecimento próprio é, um ideal atrativo para uma pessoa jovem. Somos os educadores os, que por vezes, não cremos totalmente, talvez porque ainda nos falte muito que caminhar. O segredo está em relacionar os objetivos da educação com motivos que nossos interlocutores entendam e valorizem: ajudar os amigos, ser úteis ou valentes... Cada criança terá suas próprias inquietações, que lhes faremos aparecer quando se questionem: por que viver a castidade, a temperança, a laboriosidade, o desprendimento; porque ser prudentes com a internet, ou por que não passar horas e horas com videogames. Assim, a mensagem cristã será compreendida na sua racionalidade e sua beleza. Os filhos descobrirão a Deus não como um “instrumento" com o qual os pais conseguem pequenas metas domésticas, mas como quem é: o Pai que nos ama acima de todas as coisas, e que temos de querer e adorar; o Criador do universo, a quem devemos nossa existência; o bom Mestre, o Amigo que nunca engana, e que não queremos nem podemos decepcionar.

________

A. Aguiló

[1] Forja, n. 918.

[2] João Paulo II, Exhort. Apost. Familiaris consortio, 22-11-1981, n. 60.

[3]Sulco, n. 963.

[4] Benedito XVI, discusrso ao congresso

Eclesial das dioceses de Roma, 13-06-2011.

[5] Sulco, n. 198.

[6] É Cristo que passa, n. 23.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/transmitir-a-fe-ii/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF