Essas máquinas maravilhosas
A tecnologia não tem de ser temida. A "peça" capaz de gerar destruição, reforçar preconceitos e manipular a humanidade não está dentro de nenhum computador, mas na frente dele.
Por Paloma Oliveto*
postado em 07/10/2024
A ideia de máquinas dotadas de inteligência precede em
milênios o mais arcaico dos computadores. Hefesto, o deus metalúrgico, forjou
em bronze Talos, um robozão gigante que massacrava qualquer um que se
aventurasse nas cercanias de Creta. Na mitologia hindu, o tenebroso rei Ravana
tinha um drone, a carruagem voadora autônoma Pushpaka, operada remotamente pelo
monarca de dez cabeças.
O medo de que essas criaturas inanimadas se voltassem contra
a humanidade também não é novo. Autora de Gods and Robots (Deuses e Robôs), a
historiadora e folclorista clássica Adrienne Mayor lembra, por exemplo, de
Pandora. A mulher artificial foi programada por Zeus com uma missão: espalhar o
mal pelo mundo, para punir os homens, que roubaram o fogo do Olimpo.
No século 21, continuamos a temer as máquinas que nós mesmos
construímos. Desde que o ChatGPT começou a se popularizar, a inteligência
artificial se transformou no bicho-papão do momento. E se os computadores se
tornarem mais espertos, e se eles tomarem o controle do mundo, e se os robôs se
revoltarem e escravizarem a humanidade?
Por enquanto, o que temos visto, nas pesquisas, são os
algoritmos ajudarem na precisão de diagnósticos médicos, os softwares
identificarem tesouros arqueológicos (como as 303 linhas nazcas recém
encontradas no Peru); as máquinas processarem volumes inimagináveis de dados de
satélites, que poderão ajudar a combater as mudanças climáticas.
É fato que a IA poderá acabar com algumas profissões, como a
automação tem feito sistematicamente. Também há discussões sérias sobre os
vieses de gênero e raça nos algoritmos. Evidentemente, a manipulação de vozes,
imagens e dados é um risco enorme à democracia, e o temor de novas armas já se
concretizou nos recentes ataques de Israel ao Líbano, com pagers programados
para virarem bombas.
Em nenhum desses casos, porém, a inteligência artificial, é,
per se, a vilã. As máquinas não se autoprogramam para enganarem ninguém. Não é
como se os computadores do mundo todo estivessem, na calada da noite, trocando
bytes entre eles para combinar alguma maldade contra o homem.
A tecnologia não tem de ser temida. A "peça" capaz
de gerar destruição, reforçar preconceitos e manipular a humanidade não está
dentro de nenhum computador, mas na frente dele.
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*Paloma Oliveto
Repórter sênior
Formada na Universidade de Brasília, é especializada na cobertura de ciência e saúde há mais de uma década. Entre as premiações recebidas, estão primeiro lugar no Grande Prêmio Ayrton Senna e menção honrosa no Prêmio Esso.
Fonte: https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2024/10/6958835-essas-maquinas-maravilhosas.html
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